A Conquista da Mente de Cristo

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A.B. Simpson (1843-1919)

“Disse Calebe: A quem derrotar Quiriate-Sefer e a tomar, darei minha filha Acsa por mulher. Tomou-a, pois, Otniel, filho de Quenaz, irmão de Calebe; este lhe deu a filha Acsa por mulher. Esta, quando se foi a Otniel, insistiu com ele para que pedisse um campo ao pai dela; e ela apeou do jumento; então, Calebe lhe perguntou: Que desejas? Respondeu ela: Dá-me um presente; deste-me terra seca, dá-me também fontes de água. Então, lhe deu as fontes superiores e as fontes inferiores” (Josué 15:16-19).

Logo após a conquista de Hebron por Calebe, Quiriate-Sefer, conhecida como Debir, também deveria ser conquistada. Como prêmio para quem o fizesse, Calebe ofereceu a mão de sua filha Acsa. Otniel, sobrinho de Calebe, aceitou o desafio e o venceu, conquistando assim tanto a cidade como a donzela. Acsa trouxe consigo um dote valioso dado por seu pai conforme combinado, consistindo, não apenas na esplêndida herança das terras voltadas para o sul, mas também nas fontes superiores e inferiores.

Todo esse completo e santo ensino está em conexão com nossa mais elevada herança em Cristo.

Quiriate-Sefer

Quiriate-Sefer e Debir sugerem a vitória da fé sobre a mente natural e a sabedoria do mundo. Quiriate-Sefer significa “a cidade do oráculo” ou “o livro”, e Debir significa “o orador”.

Esse é um símbolo muito conveniente para a mente natural e para um de seus mais poderosos instrumentos de expressão, a língua. Juntos, representam a mais difícil vitória da vida espiritual: a conquista dos nossos pensamentos e palavras.

A natureza humana é tripartida, consistindo em espírito, alma e corpo. Não temos apenas uma natureza espiritual, mas somos também um ser intelectual – o assento da razão, da mente e da inteligência.

Isso foi obscurecido pela queda, requerendo uma renovação pelo sangue e Espírito de Cristo, assim como qualquer outra parte do nosso ser.

A nossa mente influencia todo o nosso caráter e vida – “Porque, como imagina em sua alma, assim ele é” (Pv 23:7) – e a inteligência, sem o caráter, é um dos poderes criados mais perigosos. O próprio Satanás é uma grande inteligência impura. Em uma das versões da Bíblia, seu nome é traduzido como “aquele que sabe”.

Ele é um ser de transcendente luz, entretanto completamente sem qualquer princípio correto. Todo o seu ser moral e espiritual foi pervertido e corrompido. Como a serpente – sua imagem descrita na Palavra de Deus – tem sua vida centrada na cabeça. Não se pode matar uma serpente se não bater em sua cabeça. Mesmo que ataque todo o seu corpo, se sua cabeça for deixada intacta, ela ainda sobreviverá. Assim, a primeira promessa da redenção foi: “este lhe ferirá a cabeça”.

Satanás veio atingir a inteligência dos nossos primeiros pais. Havia uma árvore no jardim que era proibida para eles. Tudo mais poderia constituir sua felicidade, com todos os deleites possíveis, sem privações. Entretanto, havia um pouco de conhecimento que eles não deveriam demandar – uma única árvore, cujo fruto eles não deveriam provar. Um segredo que deveria permanecer desconhecido. Mas foi exatamente com isso que eles foram tentados, e foi isso que os destruiu.

Satanás os iludiu para entrar nos precintos proibidos. Ele os atraiu com a deslumbrante promessa de sabedoria Divina. Ele cobriu o prêmio proibido com o glamour de sua falsa luz, até que tudo pareceu eclipsado pela sua luz ilusória, e eles chegaram ao precipício para alcançar o fruto proibido. Isso custou a eterna ruína para toda a sua raça.

As tentações ainda nos assaltam, primeiramente por meio dos nossos pensamentos. Em se falando das profundezas da corrupção nos tempos de Noé, Deus disse: “que a maldade do homem se multiplicara sobre a terra e que toda imaginação dos pensamentos de seu coração era só má” (Gn 6:5 – ARC). É através da imaginação que o pecado se aproxima. Flutuando como uma visão bela através da mente, o pensamento maligno inicialmente parece inofensivo, mas se for alimentado e permitido permanecer, se torna uma semente que dá frutos de uma planta de desejos impuros, que brevemente trará botões de fragrâncias nocivas que, em se permitindo serem fertilizados pelo fruto da vontade maligna, serão rapidamente seguidos pela transgressão.

Portanto, precisamos encarar a tentação em nossos pensamentos. Somos constituídos de forma que, se permanecermos em um pensamento maligno, ele criará seu próprio caráter dentro do nosso espírito. Entretanto, não devemos apenas corrigir nossos pensamentos, mas precisamos ir mais longe, crucificando a velha mente natural e recebendo uma mente inteiramente nova em Cristo. A santificação do espírito não é a melhoria do antigo espírito natural, mas a renúncia dele e o receber do Espírito Santo de Deus em seu lugar. Então, a santificação da nossa mente deve ser tão radical quanto isso. Devemos reconhecer que a nossa mente natural é errada, e ela deve ser totalmente entregue a Deus, para recebermos a mente de Cristo em seu lugar, a fim de que pensemos os pensamentos de Deus, de acordo com Deus em nós. Então, nossa primeira experiência não é corrigir nossos pensamentos, mas entregar nosso ser mental completamente para o Senhor Jesus Cristo, para ser crucificado com Ele.

O Apóstolo disse que a sabedoria desse mundo é inteiramente errada em seus princípios e natureza. Sua linguagem é bem forte. Ele disse: “o mundo não O conheceu [Deus] por sua própria sabedoria” (1 Co 1:21). A sua própria sabedoria o impediu de conhecer a Deus. Se algum homem deseja ser sábio, se torne tolo, de forma a se tornar sábio, porque a sabedoria do mundo é tolice para Deus.

Entretanto, Quiriate-Sefer não apenas representa a fonte mental do pensamento maligno, mas a expressão exterior dele, por meio da língua. O controle da língua, diz Tiago, é a forma mais rara de justiça, e ele acrescenta que aquele que vence essa vitória terá poucos problemas em viver uma vida triunfante em todas as direções.

Isso é o que representa Quiriate-Sefer e Debir, cidades que o Senhor Jesus Cristo está nos convidando a destruir e conquistar. Quando conquistarmos essas cidadelas de Canaã, receberemos Cristo como a herança Divina. Ao invés da nossa própria mente, teremos a mente de Cristo. Não teremos mais nossos próprios vãos e incansáveis pensamentos, mas os pensamentos de Deus. Deixaremos de lado as imaginações vãs, para receber a visão da Sua luz e glória. Em troca do nosso conhecimento limitado, os olhos do nosso entendimento serão iluminados, e seremos capazes de conhecer “a esperança do nosso chamamento e a excelente grandeza do Seu poder para com os que cremos”.

Ao invés dos profundos pensamentos do homem, seremos conduzidos para as “profundezas de Deus” (1 Co 2:10). “Nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração humano o que Deus tem preparado para aqueles que o amam” (1 Co 2:9). Deus abrirá Sua gloriosa Palavra para nós, e nos dará revelação e iluminação pelo Espírito Santo, e “Os teus olhos verão o rei na sua formosura, verão a terra que se estende até longe” (Is 33:17).

A língua que aprendeu a ficar calada para o ego e para Satanás se tornará um instrumento para as mensagens de Deus e um canal do Seu glorioso poder. O próprio símbolo do Espírito Santo no Pentecostes era de línguas de fogo. O membro do nosso corpo que Ele mais deseja usar é a nossa voz e o nosso poder de expressão, mas Ele não o usará até que Ele tenha absoluto controle e possa selar, com Sua própria assinatura, a Sua propriedade exclusiva e Sua voz viva.

Essa não é uma possibilidade gloriosa? Será que não devemos ir até Quiriate-Sefer e conquistá-la, para que ela seja tomada e ocupada pelo Espírito Santo, para a glória de Deus?

Devemos notar que Quiriate-Sefer vem depois de Hebrom, que é o primeiro amor e então luz. Somente depois que aprendermos a vida de amor do Senhor e saírmos do nosso ego e sensibilidades, é que poderemos falar, pensar e conhecer corretamente.

Não desejamos centrar a nossa vida em nosso cérebro, mas em nosso coração e espírito; no amor e não no conhecimento. Então, entenderemos o sentido de “Mas, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo” (Ef 4:15).

Otniel

Otniel é o tipo do segredo da vitória sobre a mente natural. A palavra Otniel significa “Leão de Deus” ou “Força de Deus”, como o Dr. Young traduz. Ele representa o poder do Senhor Jesus Cristo e do Espírito Santo em um espírito corajoso.

Nada menos que o poder Onipotente pode vencer o orgulho e força da mente carnal. Somente a “Força de Deus”.

A mente carnal é um rebelde selvagem e desesperado, e sua própria força de vontade não vai conseguir controlá-la. Mas, se formos corajosos o suficiente para escolher morrer para ela, Cristo é capaz de subjugá-la.

Porque as armas da nossa milícia não são carnais, e sim poderosas em Deus, para destruir fortalezas, anulando nós sofismas e toda altivez que se levante contra o conhecimento de Deus, e levando cativo todo pensamento à obediência de Cristo” (2 Co 10:4-5).

Estamos tão felizes que Deus colocou a palavra “poderosas” ali. Cada um que tentou acalmar um cérebro hiperativo, vencer a inundação de pensamentos, apagar as imagens da imaginação, pensar calmamente, ou até mesmo, parar de pensar, sabe como é inútil tentar fazer isso na força da vontade humana natural.

Mas existe uma voz que pode dizer para a mais voraz tempestade do coração e do cérebro: “Paz, aquieta-te”, e então vemos uma grande calmaria. Existe um poder que pode manter todo o pensamento como servos, esperando do lado de fora do aposento a serem convidados a entrar, esperando pelo chamado da vontade e da consciência, e completamente controlados pela voz do Espírito Santo. Ali encontramos paz! Felizes são aqueles que o conhecem! Deus espera por aqueles que estão desejosos de se entregarem em absoluta rendição para a mente de Cristo e os pensamentos de Deus.

Acsa

Abundante vitória para as almas vitoriosas. A vitória de Otniel foi aceita com o prêmio da filha de Calebe, a bela Acsa, cujo nome significa “Graça”, e que pode ser considerada como um tipo especial da graça que Cristo dá àquelas almas vitoriosas, e especialmente àqueles que vencem a mente carnal.

Existe uma graça que salva a alma pecadora, mas também existe uma graça mais rica e mais profunda que santifica e preenche essa alma completamente com a plenitude de Deus.

Obtivemos igualmente acesso, pela fé, a esta graça na qual estamos firmes” (Rm 5:2).

Deus pode fazer-vos abundar em toda graça, a fim de que, tendo sempre, em tudo, ampla suficiência, superabundeis em toda boa obra” (2 Co 9:8).

Se, pela ofensa de um e por meio de um só, reinou a morte, muito mais os que recebem a abundância da graça e o dom da justiça reinarão em vida por meio de um só, a saber, Jesus Cristo” (Rm 5:17).

“Porque todos nós temos recebido da sua plenitude e graça sobre graça” (Jo 1:16).

A graça encara cada necessidade de cada momento, e supre cada uma delas em cada emergência.

Essa é a graça que Jesus tem a dar para as almas que se tornaram vitoriosas sobre sua própria vontade e sua auto suficiência, e que estão contentes em tomar o Senhor como sua força e sabedoria.

Acsa moveu seu marido a pedir grandes coisas a seu pai. É assim que a graça de Deus nos move aos pontos mais altos, às mais elevadas orações, e nos leva a conquistar as riquezas da graça e bençãos Divinas.

Pode até parecer que Acsa levou Otniel a pedir mais do que ele mesmo teria pedido. Nós a encontramos se dirigindo ao seu pai pedindo por ela e por seu marido. Da mesma forma, a graça pede por nós ainda mais do que nós mesmos pedimos.

Acsa trouxe a seu marido uma rica herança, a terra do sul, diante do morno nascer do sol. Então ela pediu, para ela e para ele, uma bênção dupla.

É muito bonito vê-la descendo do seu jumento, antes de se aproximar de seu pai com um pedido maior. A graça se inclina para pedir, e quanto mais baixo ela desce, mais ela pode pedir e receber. Abraão abaixou sua cabeça quando pediu a aliança eterna de Jeová. A mulher Siro-fenícia, da mais profunda humilhação, se elevou ao ponto mais alto da fé encontrado no Novo Testamento, aceitando a mais terrível palavra que o Mestre disse sobre o seu pecado ao ser contada como um “cachorro”. Ainda assim, clamou e recebeu a plenitude de Sua infinita graça.

Desta forma, a graça pode se inclinar até as maiores profundezas da humilhação, e ainda assim subir às maiores alturas da glória para clamar por toda a plenitude de Deus.

Acsa pediu ao seu pai as fontes. A graça sempre está presente para os corações sedentos. A vida de obras é uma vida de constante labor e dor, mas a vida de graça é uma fonte perpétua de espontânea plenitude e liberdade.

É muito deleitoso viver e trabalhar para Deus a partir desse impulso que nos conduz muito além de nós mesmos. Oh, é tão abençoado ser conduzido pelo Seu amor e plenitude, podendo dizer continuamente, com um coração transbordante: “Todas as minhas fontes são em ti” (Sl 87:7).

Acsa pediu por fontes, e seu pai deu a ela mais do que havia pedido. Ele a deu “as fontes superiores e as fontes inferiores”.

A bela figura nos fala da gloriosa plenitude da graça de Deus, que sonda todo o nosso ser e nos dá a promessa “da vida que agora é e da que há de ser” (1 Tm 4:8).

Temos as fontes superiores – as fontes da fé, que nos sustentam confiando diante de cada desencorajamento; fontes de oração, que vem dos incentivos do Espírito Santo e que leva nossas petições diretamente ao trono, com a consciência de sua aceitação; fontes de amor que salta em direção à Deus e nos capacita a dizer: “O Amor de Deus nos constrange”; fontes de alegria que irrompe dos montes eternos, uma alegria tão indizível que é cheia de glória; fontes de esperança que alcançam o invisível e não visto, antecipando o que ainda será revelado em nossa futura herança; fontes de poder, para tornar nosso serviço um deleite, nosso testemunho um grande derramar do coração que não pode se calar, porque está tão transbordante. Essas são algumas das fontes superiores.

Mas existem fontes inferiores, que valorizamos ainda mais. Essas são as fontes que brotam em lugares baixos da vida, em lugares difíceis, nos lugares desertos, solitários e comuns, que parecem muito distantes do que é sagrado e Divino. Quão abençoado é beber das fontes da saúde e encontrar nossa força renovada dia a dia, e a vida de Deus ainda fluindo nos nossos órgãos físicos! Quão deleitoso é ter Sua alegria nos lugares baixos da tristeza, nos dando condições de “nos gloriarmos também na tribulação”. Quão preciosas são as fontes que fluem em lugares de tentação, quando não tem nada tão tentador como o toque da mão de Satanás e o sopro do destruidor.

Oh, quão doce é até mesmo descobrir que a luz é tão profunda quando a sombra, e o céu fica mais próximo quando estamos quase tão perto dos portões do inferno, de forma que podemos considerar “tende por motivo de toda alegria o passardes por várias provações”, e então dizer: “Bem-aventurado o homem que suporta, com perseverança, a provação; porque, depois de ter sido aprovado, receberá a coroa da vida, a qual o Senhor prometeu aos que o amam” (Tiago 1:2;12).

Essas são as fontes que fluem nos locais de trabalho secular, nas coisas comuns do dia a dia, que podem ser preenchidos com a consciência da presença de Deus. Deus ama animar aqueles que labutam em lugares baixos, e que podem ouvir os doces sinos das vestes do sumo sacerdote dentro do véu e dos ecos das harpas de Deus entre o estardalhaço das ruas agitadas e o rugido de dez mil martelos e rodas das fábricas.

O coração que tem essa fonte pode estar feliz em qualquer lugar. A alma que está conectada com a música celestial nunca está fora de tom. A luz que é acesa pelo alto pode brilhar na escuridão, apesar das “trevas não a compreenderem”.

Amado, Deus tem para nós essas fontes, e nós precisamos delas dia a dia. Vamos beber das águas vivas. Vamos receber delas nos nossos próprios corações, e vamos levar essas fontes onde quer que formos, para que possa ser verdade o que foi dito de nós pelo Senhor:

Aquele, porém, que beber da água que eu lhe der nunca mais terá sede; pelo contrário, a água que eu lhe der será nele uma fonte a jorrar para a vida eterna” (João 4:14).

Extraído do livro “Christ in the Bible – Joshua“, de A. B. Simpson, capítulo 8 – “Kirjath-sepher, or the Mind of Christ“.

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4 Comentários. Deixe novo

  • Quantas verdades, belezas e riquezas!
    Obrigado, mais uma vez, por compartilharem desse rico alimento espiritual. O Senhor certamente tem abençoado essa iniciativa de vocês, seu Nome tem sido conhecido, amado e glorificado.

    Somente o Senhor poderá revelar, futuramente, as bênçãos e edificação promovida no compartilhar de seus santos testados, provados e amadurecidos. Que mais Filhos de Deus encontrem aqui desse alimento saudável, numa era tão contaminada e com tantas informações que mais confundem e prejudicam ao invés de ensinar em verdade.

    A graça e a paz de nosso Senhor Jesus e o amor do Pai sejam com todos.

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  • Estou maravilhada com os artigos. Que Deus possa conceder ainda mais graça e conhecimento, em nome de Jesus Cristo.

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    • Obrigada Crisley. Ficamos felizes em saber que esse conteúdo está abençoando você! Só postamos aqui aquilo que fez diferença para nós.

      Responder

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