Watchman Nee (1903-1972)
“Pois assim está escrito: O primeiro homem, Adão, foi feito alma vivente. O último Adão, porém, é espírito vivificante. Mas não é primeiro o espiritual, e sim o natural; depois, o espiritual. O primeiro homem, formado da terra, é terreno; o segundo homem é do céu” (1 Coríntios 15:45-47).
“Disse Abraão a Deus: Tomara que viva Ismael diante de ti. Deus lhe respondeu: De fato, Sara, tua mulher, te dará um filho, e lhe chamarás Isaque; estabelecerei com ele a minha aliança, aliança perpétua para a sua descendência” (Gênesis 17:18,19).
“Respondeu-lhe o SENHOR: Duas nações há no teu ventre, dois povos, nascidos de ti, se dividirão: um povo será mais forte que o outro, e o mais velho servirá ao mais moço” (Gênesis 25:23).
“Já fora dito a ela: O mais velho será servo do mais moço. Como está escrito: Amei Jacó, porém me aborreci de Esaú” (Romanos 9:12,13).
“E disse José a seu pai: Não assim, meu pai, pois o primogênito é este; põe a mão direita sobre a cabeça dele. Mas seu pai o recusou e disse: Eu sei, meu filho, eu o sei; ele também será um povo, também ele será grande; contudo, o seu irmão menor será maior do que ele, e a sua descendência será uma multidão de nações” (Gênesis 48:18,19).
“E lhe disseram: Vê, já estás velho, e teus filhos não andam pelos teus caminhos; constitui-nos, pois, agora, um rei sobre nós, para que nos governe, como o têm todas as nações” (1 Samuel 8:5).
“Disse o SENHOR a Samuel: Até quando terás pena de Saul, havendo-o eu rejeitado, para que não reine sobre Israel? Enche um chifre de azeite e vem; enviar-te-ei a Jessé, o belemita; porque, dentre os seus filhos, me provi de um rei” (1 Samuel 16:1).
“Mas, posto que com isto deste motivo a que blasfemassem os inimigos do SENHOR, também o filho que te nasceu morrerá… Então, Davi veio a Bate-Seba, consolou-a e se deitou com ela; teve ela um filho a quem Davi deu o nome de Salomão; e o SENHOR o amou. Davi o entregou nas mãos do profeta Natã, e este lhe chamou Jedidias, por amor do SENHOR” (2 Samuel 12:14,24,25).
Tais passagens na Bíblia nos revelam um princípio de Deus. Podemos chama-lo de “princípio do segundo” ou “a lei do segundo”.
Deus Sempre Escolhe o Segundo
A partir dessas passagens, podemos aprender que Deus sempre escolhe o segundo, não o primeiro. Em 1 Coríntios 15 vemos que o primeiro é terreno, mas o segundo é celestial. O primeiro é natural, enquanto o segundo é espiritual. Muitas vezes me perguntei por que nas Escrituras Deus sempre parece escolher a segunda pessoa. Ismael é o filho mais velho, ainda assim, Deus escolhe Isaque, o filho mais novo. Esaú é o filho mais velho, mas Deus escolhe Jacó, seu irmão mais novo. Mais à frente, aprendemos que, apesar de Efraim ser o segundo filho e Manassés ser o primogênito, mesmo assim, Deus escolhe Efraim. Bate-seba deu à luz a duas crianças, mas Deus feriu a primeira, enquanto amou a segunda, Salomão. Ele amou Salomão de tal maneira que enviou o profeta Natã para dar-lhe outro nome, Jedidias – que significa “amado do Senhor” (e note que, de acordo com a carne, nosso Senhor veio dessa raiz). Ainda lembrando desse princípio, o primeiro rei, Saul, foi rejeitado por Deus; mas Davi, o segundo rei, foi escolhido por Deus, e ainda declarou que Davi era um homem de acordo com Seu próprio coração (Atos 13:22).
Por que Deus Rejeita o Primeiro e Aceita o Segundo?
Por que Deus rejeita o primeiro e aceita o mais novo? Por que Ele odeia o primeiro e ama o segundo? Desejamos compreender a resposta.
Vamos notar que Deus lida com pecadores da mesma maneira que lida com Israel e com crentes. Por que no Êxodo, Deus ordenou que os filhos de Israel colocassem o sangue nas obreiras da porta pelos primogênitos? [Ex 12:7]. Por que os primogênitos estavam expostos a perigos, e não os demais? Por que na Bíblia todo o primogênito do gado e do rebanho deve ser redimido, caso contrário terão seus pescoços quebrados (quando o pescoço é quebrado, o sistema nervoso central é extraviado e isso indica morte)? [Ex 13:13]. Por que o primogênito, não a segunda cria das vacas e das ovelhas, deveria ser redimido? E ainda, não apenas o primogênito do gado e do cordeiro deveria ser redimido, mas também o primogênito dos filhos de Israel (o segundo filho não precisava ser redimido). Se o primogênito não fosse redimido, ele seria cortado e não seria contado entre o povo de Deus. Por que Deus está especialmente insatisfeito com os primogênitos? Ou por que Ele particularmente ama o segundo filho e mostra especial favor a ele? Por que Ele toma a tribo inteira de Levi no lugar dos primogênitos entre todos os filhos de Israel, e por que Ele requer o número estranho a ser redimido em silos (veja Números 3:44-51)?
Sabemos que o registro da Bíblia nunca é feito casualmente, o que indica um princípio extremamente vital. Apesar de tal princípio não ser universalmente reconhecido, estamos certos de que Deus nunca faz nada arbitrariamente. Quando faz algo de uma forma particular, uma, duas e repetidas vezes, Ele está nos indicando Seus caminhos. Seus “atos” são governados por Seus “caminhos”. Iremos fazer um grande progresso em conhecer a Deus e as coisas espirituais se aprendermos esse princípio e caminho de Deus.
O que realmente está implicado em Deus rejeitar o primeiro e aceitar o segundo? Vamos ler novamente 1 Coríntios 15:46: “Mas não é primeiro o espiritual, e sim o natural; depois, o espiritual”. Sabemos que esse capítulo trata da ressurreição do corpo. Nosso propósito em ler essa passagem, entretanto, não está ligado a investigar a ressurreição do corpo, mas em compreender um princípio espiritual. De acordo com essa passagem, o corpo natural vem primeiro, e então vem o corpo espiritual. Assim, podemos dizer que o princípio espiritual aqui é que o espiritual sempre vem depois, enquanto o natural sempre vem primeiro. Isso, então, explica por que Deus escolhe o segundo e rejeita o primeiro.
O que é o primeiro? “A isto, respondeu Jesus: Em verdade, em verdade te digo que, se alguém não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus… O que é nascido da carne é carne; e o que é nascido do Espírito é espírito” (João 3:3,6). Nosso Senhor está falando sobre nascer de novo. Ele indica que nascer uma vez não é bom o suficiente, mas que precisamos nascer de novo. Aquele que nasceu apenas uma vez não pode ver o reino de Deus e é considerado inútil. Apenas aquele que nasceu de novo tem a vida eterna e pode ver o reino de Deus. Então Ele explica o que significa o primeiro nascimento. É aquilo que é nascido da carne. Mas o que é representado pelo segundo nascimento? O que é nascido do Espírito. Consequentemente, aquele que é nascido da carne – o que quer que seja dotado naturalmente – pertence ao primeiro; no entanto, aquilo que não vem por meio da carne, mas pelo nascer do Espírito Santo, pertence ao segundo.
Há muita coisa incluída na expressão “aquele que é nascido da carne”. Tudo o que herdo dos meus pais que me geraram – coisas tais como afeição, talento, inteligência, gentileza, humildade, amor, paz, determinação e paciência – todas essas e outras qualidades vêm do meu nascimento natural. Qualquer coisa que eu tenha antes do meu novo nascimento, não importa quão amável ela seja aos olhos humanos, está incluída nas palavras do Senhor Jesus como pertencendo à esfera de “aquilo que é nascido da carne é carne”. Por essa razão, precisamos nos perguntar se tudo o que temos depois do novo nascimento é nascido de Deus. Ou será que aquilo que eu tenho ainda inclui o que é nascido da carne? Não vamos arrazoar que apenas os pecados e coisas impuras da carne devam ser eliminados, enquanto que a gentileza natural, a paciência, a amabilidade, a inteligência e o talento podem ser retidos e sustentados sem nunca ter nascido de Deus. Quem dentre nós verdadeiramente reconhece que tudo o que herdamos do primeiro – que equivale a dizer, aquilo que é da carne – precisa ser negado e entregue? Vamos humildemente reconhecer que apenas o que vem a partir da fé no Senhor Jesus, da confiança em Deus e da apropriação por meio do Espírito Santo é aceitável e agradável a Deus.
Assim, a primeira questão de importância para uma pessoa é nascer de novo. Bem-aventurado é aquele que tem duas vidas e duas naturezas. Alguém pode confessar o Senhor Jesus com sua boca e até ir ao culto da igreja, mas tudo o que tem veio naturalmente dos seus pais, estando ainda, consequentemente, perecendo como um pecador. O que alguém possui e aprende naturalmente é inútil e sem esperança diante de Deus. Mas, se crê em Deus, a pessoa possuirá aquilo que vem do segundo – até mesmo a vida eterna.
Os cristãos devem hoje aprender a distinguir entre o primeiro e o segundo, entre o que nos é dado por nossos pais e o que nos é dado por Deus, pelo Seu Santo Espírito. Infelizmente, muitos crentes não têm esse claro entendimento. Eles são incapazes de diferenciar o primeiro do segundo, incapazes de discernir o que vem do primeiro e o que vem do segundo. Eles assumem que, desde que sejam zelosos, pacientes, seu discurso seja adequado e sua oração agradável, suas vidas e obras serão aceitáveis.
Permita-me dizer que sei bem do que estou falando. Deus nunca olha para as boas obras per si. Ele apenas olha para a fonte dessas boas obras. Qual é a fonte das suas boas obras? Não é que Deus não requeira gentileza, mas Ele pergunta de onde essa gentileza vem. Será que ela vem de você ou do Espírito Santo? De onde esse zelo é originado? Do seu ego ou do Espírito Santo? Qual é o princípio oculto nessas perguntas que você faz? Tudo está relacionado, bem claramente, a essa questão do primeiro ou do segundo: Deus sempre rejeita o primeiro, mas aprova o segundo.
Para ilustrar, tomemos como exemplo meu temperamento impaciente. Admiro e valorizo muito a paciência que vejo em outras pessoas. Mas Deus prova mais profundamente com a pergunta: de onde vem essa paciência? Tão logo vemos algum bem no “primeiro”, imediatamente pronunciamos como bom. Ainda assim, Deus não vai declarar que algo é bom, até que Ele veja que esse algo veio Dele. Desta forma, podemos ter certeza de que o que Ele diz que é bom é verdadeiramente bom. Quando observamos um pregador que fala com ousadia e trabalha ativamente, podemos concluir que ele é espiritual. Mas Deus deseja saber se essas qualidades vem “do primeiro” ou “do segundo”. Um caro irmão relatou quão sem discernimento certos Cristãos eram ao declararem que um pregador é poderoso, somente pelo fato dele bater no púlpito com seus pulsos. Deveríamos perguntar, entretanto, de onde o poder manifestado estava vindo. Não podemos confiar no talento, poder ou natureza que vem do primeiro. Apenas o que emerge depois do novo nascimento vem do segundo, e é assim aceitável a Deus.
O Princípio do Segundo se Aplica a Todos os Crentes
Esse princípio se aplica a todo crente e não apenas aos pregadores. Cada bondade natural – por exemplo, a paciência – é como um elástico que apenas pode ser esticado até certo ponto; e logo alcançará o seu ponto de quebra, e nunca será capaz de seguir até o fim com Deus. Bem diferentemente, entretanto, se a bondade natural (nesse caso a paciência) vem de Deus, a qual pode ser esticada, esticada, tanto quanto for necessário. Que seja claramente compreendido que os recursos naturais não podem suprir as necessidades espirituais. O que é do primeiro, Adão, nunca pode ajudar o que é do segundo, Cristo. Oh, quantos são aqueles que pensam que desde que amem as pessoas, eles estão bem. Mas será que está tudo bem? Será que esse amor vem de Deus?
Um irmão disse que apenas o que vem do céu pode voltar para o céu. Consideramos a nossa casa como sendo o céu, porque nós e tudo o que temos vem do céu. Então, costuma-se dizer que retornar para casa é como retornar ao céu. Ainda assim, se o que temos não é celestial, mas terreno, então o céu será o hotel ao invés de ser a nossa casa. É certo que Deus não vai receber de volta para Si mesmo aquilo que não veio Dele.
Vamos nos perguntar o seguinte: ocorreram mudanças em nossas vidas desde que nós cremos no Senhor Jesus? Ser cristão não representa apenas ficar livre dos pecados, fracassos, fraquezas e impurezas do passado? É certo que tais coisas foram eliminadas; Deus, entretanto, deixa claro em Sua palavra que isso não é suficiente. Ele não apenas chama as coisas obviamente más como ruins, mas também intitula as tão chamadas coisas boas da carne como ruins também. Ele declara que Ele não tem necessidade do primeiro – em sua inteireza. Ele rejeita a inteligência da carne tanto quanto seus pecados grosseiros. Ele denuncia a bondade da carne tanto quando sua impureza. Ele está insatisfeito com tudo o que vem da vida natural. Nada da vida antiga pode ser misturado com a nova.
Nos Evangelhos lemos um trecho onde o Senhor Jesus diz: “Quem ama seu pai ou sua mãe mais do que a mim não é digno de mim; quem ama seu filho ou sua filha mais do que a mim não é digno de mim” (Mateus 10:37). Nós lemos Ele dizendo mais à frente: “Se alguém vem a mim e não aborrece a seu pai, e mãe, e mulher, e filhos, e irmãos, e irmãs e ainda a sua própria vida, não pode ser meu discípulo” (Lucas 14:26). Por meio das epístolas de Paulo, o nosso Senhor não apenas exorta as crianças a obedecerem seus pais, mas também exorta os pais a não provocar os seus filhos à ira (veja Efésios 6:14). O Senhor também nos mostra o relacionamento adequado entre marido e mulher: como maridos devem amar suas esposas, e as esposas amar seus maridos (veja Efésios 5:22,25). Neste sentido, os Evangelhos focam no ódio, enquanto as Epístolas focam no amor. Se você não for capaz de distinguir entre o “primeiro” e o “segundo”- entre o que é da carne e o que é do Espírito – você não compreenderá por quê. Quando ouvimos o Senhor dizer “aquele que ama seu pai ou mãe mais do que a mim não é digno de mim”, podemos inferir que devemos tratar nossa família descuidada e insensivelmente; ou quando ouve Paulo dizer que os membros da família devem amar uns aos outros, podemos concluir que precisamos amar os membros da nossa família acima de tudo mais. Entretanto, não percebemos que o que o Senhor nos adverte é contra o amor natural, e o que Paulo nos exorta é cultivar o amor espiritual. Se o seu amor é natural, o seu amor por sua família te afastará do Senhor, até que a sua comunhão com Ele e o seu amor por Ele serão grandemente reduzidos ou até eliminados por completo. Mas se você está desejoso a entregar seu pai, mãe, esposa e filhos a Deus, estando até mesmo disposto a odiá-los se Ele desejar, então você imediatamente perceberá o segundo mandamento de Deus – que é, amar o seu pai, mãe, esposa e filhos, porque você terá sido liberto “do primeiro” e pode então entrar na experiência “do segundo”. Que erro as pessoas cometem quando aceitam apenas a metade do Evangelho ou a metade das Epístolas no Novo Testamento.
Precisamos ser Continuamente Libertos do Primeiro
Nossas vidas e obras devem ser continuamente libertas do primeiro. Talvez eu possa ilustrar isso da seguinte maneira: é relativamente fácil compreender os dois termos, carnal e espiritual, no abstrato; mas é bem difícil fazer essa distinção em termos da vida prática. Como podemos saber quando o bem vem do primeiro ou do segundo? Existe alguma marca pela qual podemos reconhecer sua origem? Vou estabelecer a regra cardinal: qualquer coisa que seja espiritual passou pela morte (acredito que todos que são experimentados nesse assunto vão dizer amém). Em outras palavras, o que é espiritual é o que ressuscitou. O que se originou com seu nascimento natural, sem experimentar a intervenção do poder sobrenatural de Deus, pertence ao primeiro – toda a sabedoria, gentileza, bondade, talento que alguém possui do nascimento até o momento de crer no Senhor é considerado por Deus como carnal. Nada durante esse período agrada a Deus. Mas depois que uma pessoa crê no Senhor Jesus, então o que quer que seja adicionado àquela pessoa por Deus, por meio do Espírito Santo, pertence ao segundo; Essa pessoa negou com mentalidade única toda a sua bondade natural e talento – tendo considerado tudo isso como não digno de confiança – e agora confia no Espírito Santo para direção, força e vitória, de forma que possa viver por meio de Cristo. Para que seja do segundo, de Deus, é preciso que o crente entregue sua própria sabedoria, força e talento natural. Aquilo que obtemos depois dessa entrega é o segundo ressurreto e espiritual.
Como possuímos pouco do segundo dado por Deus! Quão raramente vivemos pela vida do segundo! A prática comum conosco é que eliminamos o mau do primeiro, mas usamos o seu bom. Entretanto, Deus deixa claro que nossa sabedoria, talento e gentileza naturais devem passar pela morte, assim como nossa corrupção, impureza e pecado precisam ser eliminados. Talvez, entretanto, possamos especular assim: não seríamos tolos se não usarmos nossa sabedoria natural? Não seríamos duros de coração se não usarmos nossa gentileza natural? A isso, a Bíblia responde que Deus deseja que tudo passe pela morte. Suponha, por exemplo, que eu seja inteligente. Com minha inteligência posso descobrir muitas novas ideias da Bíblia. Mas se eu desejo viver de acordo com o princípio do segundo, não vou depender de minha inteligência; vou, ao contrário, confiar completamente em Deus. Não importa se estou lendo as escrituras ou orando, irei confiar em Deus, assim como a palavra de Deus diz: “sem Mim nada podeis fazer” (João 15:5). É desta forma que você descobrirá se passou pela morte. Você entregou seu próprio ser nessa área. Assim, você perceberá como Deus começa a usar sua inteligência renovada. O que quer que tenha passado pela morte, que representa dizer, passou pela cruz, é desejado por Deus e será usado por Ele.
A Vida do Segundo – Dolorosa para a Carne
Esteja atento, é evidente que a carne vai seguramente gritar: “Que vida dolorosa é essa! Não terei nenhuma liberdade de agir tão rapidamente como desejo; mas ao contrário, tenho que esperar em Deus! Terei que reconhecer minha corrupção e inutilidade e gastar tempo em oração!”. Ainda assim, precisamos ser relembrados que esse tipo de vida dá frutos – “Se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, produz muito fruto” (João 12:24). Entretanto, não importa o que diz a palavra do Senhor, muitos crentes se recusam a assumir essa atitude. Como resultado, em toda a sua vida, eles vivem pelo primeiro. Eles nunca conheceram ou conheceram muito pouco da vida do segundo. Sua vida natural se recusa a passar pela morte. Eles podem parecer bons por fora, mas eles não podem dar verdadeiros frutos espirituais.
Deixe-me usar o próprio Senhor Jesus como ilustração. Nosso Senhor, quando na terra, nunca conheceu o pecado. Se Ele tivesse falado ou feito de Si mesmo, tudo naquela base teria, ainda assim, sido bom, simplesmente porque Ele era sem pecado, puro e sem mancha; Sua vida e natureza eram perfeitas. Entretanto, à medida que Ele andou na terra, o Senhor Jesus repetidamente declarou: “O Filho nada pode fazer de si mesmo, senão somente aquilo que vir fazer o Pai; porque tudo o que este fizer, o Filho também semelhantemente o faz” (João 5:19). Por que Ele não fez nada a partir de Si mesmo? Simplesmente porque Ele viu que aquilo teria sido feito na esfera natural e não teria sido algo feito pelo Pai. Se alguém tão naturalmente perfeito, puro e belo como o Senhor Jesus não podia fazer nada por Si mesmo, quão mais necessário é que nós não tentemos fazer nada a partir de nós mesmos. Se Ele, que veio do céu, não confiava na Sua carne perfeita, mas, ao contrário, confiou no Espírito Santo, quão mais devemos nós depender do Espírito Santo.
Qualquer coisa que o Senhor Jesus tenha feito, Ele o fez de acordo com a vontade de Deus, confiando o processo no poder do Espírito Santo. Assim, Ele nos mostra que mesmo que alguém fosse sem pecado, não seria suficiente diante de Deus. Nossas vidas devem vencer a bondade natural, assim como vencemos o pecado e impureza. Como a vida de Deus em nós é oprimida pela nossa vida natural! Nossas vidas e obras são governadas demais pelos nossos próprios pensamentos. Nós confiamos demais em nossa própria sabedoria e força no serviço a Deus. O chamado de Deus hoje é para que venhamos diante Dele com a singeleza de mente, considerando fútil tudo o que é natural. Em resposta, nos humilharemos e nos esvaziaremos diante Dele, confiando Nele, para que possamos obedecê-Lo completamente.
Reconhecemos que tal caminho é doloroso para a carne. É uma vida dependente e humilde. Ainda assim, se desejamos viver pela vida do segundo, precisamos viver diariamente em humildade como cativos de Deus. Não obstante, tal vida agrada a Deus grandemente, e tal obra é muito efetiva espiritualmente.
Concluindo, deixe-me dizer que qualquer coisa que pode ser feita sem a necessidade de oração ou dependência do poder do Espírito Santo não agradará a Deus, mas está condenada por Ele, porque deve ser da carne. Que tudo o que somos e temos venha de humildemente confiarmos em Deus. Possamos nós colocar diariamente nossa vida natural na morte pela vida de Deus, até o dia da volta do Senhor. Possa a nova criação de Deus engolir a velha criação.
Tradução do Capítulo 2 do Livro “From Faith To Faith” (De Fé em Fé) – Watchman Nee