O Deus que é Poderoso para Fazer

Harry Foster

“Ora, àquele que é poderoso para fazer infinitamente mais do que tudo quanto pedimos ou pensamos, conforme o seu poder que opera em nós, a ele seja a glória, na igreja e em Cristo Jesus, por todas as gerações, para todo o sempre. Amém!” (Efésios 3:20,21).

“Ora, Àquele que é poderoso para fazer…”

Esse trecho marca uma longa passagem, que é composta pelos três primeiros capítulos da carta aos Efésios. Ali está demonstrado um dos mais maravilhosos, gloriosos e abençoados prospectos do propósito Divino de graça, em Cristo Jesus. Até aqui nada havia sido dito sobre fazer, pelo menos naquilo que tange aos filhos de Deus. Tudo nesse texto se relaciona ao pensamento de Deus – o que Ele planejou, o que Ele tornou possível e realizou.

Esse é um prospecto maravilhoso, um demonstrar maravilhoso da verdade Divina! Entretanto, temos um lembrete no final do capítulo 3, nos versos 20 e 21 [citado acima] de que existe algo mais a ser realizado a respeito. Essas palavras não intencionam apenas provocar nosso interesse, trazer deleite a nossa mente ou aquecer nosso coração. Essa passagem deveria produzir uma ação muito prática, por meio de ações e obras. Talvez todos precisaremos ser lembrados, de tempos em tempos, de que o propósito Divino está sendo realizado, e não somente na medida em que o compreendemos, pensamos nele ou até mesmo estejamos pedindo que seja realizado. Não é errado pedir: vemos o “tudo quanto pedimos” é mencionado ali, e não é errado pensar; precisamos pensar nesses fatos Divinos, e quanto mais melhor. Mas pedir e pensar não é suficiente. Deve haver o realizar e, nessa medida da realização da vontade revelada de Deus é que estaremos de fato entrando nela, satisfazendo Seu coração.

Mas isso certamente abrange um número muito grande de pontos práticos e pessoais e, nos capítulos seguintes, o apóstolo descortinará esses detalhes, de forma que seja claro para nós a maneira que esse chamamento celestial trabalhará em nossa vida cotidiana. Não é minha intenção permanecer nesse assunto, mas penso que deveríamos encarar essa ampla consideração da verdade Divina, de que tudo que Deus demonstra em Sua Palavra, como Suas ideias, ou se você desejar, em Seu ideal para Sua Igreja, não é algo meramente para nossa meditação, mas é algo a ser realizado. Não é apenas algo para a perspectiva, mas é também para o desempenho.

Existem muitos amados e piedosos homens de Deus que encontram grande deleite nessa carta aos Efésios, e que têm grande habilidade ao fazer uma exposição sobre ela, mas quando chegam ao verso 20, virtualmente dizem: ‘Agora àquele que demonstrou um belo ideal, mas que nunca poderá ser realizado na terra! Como reconciliar o ideal com prática? Como essa Igreja pode encontrar expressão em nossas igrejas? Bem, nós desistimos, não pode ser realizado!‘.

Penso que Efésios 3:20 não foi escrito para trazer um pouco de conforto para nossa fé ao longo da caminhada, nos lembrando de que Deus é capaz de fazer. Esse verso é uma solene declaração do fato de que aquilo que foi expresso e demonstrado nos primeiros três capítulos dessa carta deve ser realizado. Aquelas verdades não são objetos para o pensamento, mas devem ser realizadas, expressas. Mas, as pessoas costumam perguntar: ‘Será que isso funciona?’ Sim, louvemos a Deus, porque funciona, e é o que o apóstolo está nos dizendo. Vamos guardar essa exortação em nossos próprios corações, se necessário, para ter cuidado de não nos tornarmos meros espectadores das coisas Divinas, em vez de experimentá-las.

O que quero dizer é o seguinte: existem algumas pessoas para quem a Palavra do Senhor pode ser de grande ajuda, e elas podem estar imensamente gratas por isso. No entanto, é uma posição contraditória desfrutar de um ministério somente por meio da contemplação da verdade, convivência com um grupo de pessoas, uma comunhão, igreja ou ministério, pelo prazer de segui-los e ouvi-los! Com isso você está dizendo: “estou tão feliz que a verdade da Igreja seja pregada em plenitude de acordo com Efésios”. Mas, de fato, você deveria dizer: “estou tão grato que Deus está me conduzindo para o realizar da verdade da Igreja em meio ao Seu povo de acordo com Efésios!”.

Àquele que é poderoso para fazer… É o fazer que se torna no clímax e no cumprimento de toda essa revelação, e ainda assim, não é o nosso fazer. “Àquele que é poderoso para fazer…”.

“Pedimos ou pensamos” – isso é tudo o que podemos fazer. Ele é poderoso para fazer, louvado seja Seu Nome! Um de nossos intelectuais modernos disse, em uma frase cheia de mordacidade espirituosa, que “o problema da Cristandade não é que ela tenha sido testada e achada em falta, mas que ela achou extremamente difícil e jamais tentou”. Isso parece muito inteligente, muito agradável, mas não é verdade! Alguns de nós tentamos, e o fizemos arduamente, com todo o nosso coração. O que esse intelectual estava certo é que é difícil, muito difícil para nós.

É isso que o apóstolo nos diz quando somos derrotados – não por termos pensado que era difícil e não tentar – mas porque vimos que era a vontade de Deus e tentamos, e ao percorrermos os primeiros três capítulos de Efésios, dissemos: “Pela graça de Deus, com Sua ajuda, Iremos realizar isso”; mas onde chegamos?

O Senhor certamente está satisfeito com o desejo de nosso coração, nossa intenção. Mas, se essa apresentação da verdade Divina tem a intenção de instigar nossa vontade e evocar nossa determinação, também deve nos conduzir a uma nova atitude de fé para com o Senhor. Nós não podemos fazê-lo. Quanto mais tentarmos, menos sucesso teremos. Não conseguiremos.

Ele é capaz de realizar. Essa é a mensagem do Senhor relacionada a cada fração da revelação Divina que nos foi entregue. Não importa quão impossível possa nos parecer, e nem faz diferença o quanto já tenhamos tentado e falhado. A Palavra do Senhor surge de forma nova para nós, para não mais continuarmos tentando, mas para darmos uma nova olhada para Ele. Ele é capaz de realizar. Como já disse, tudo que podemos fazer é pedir e pensar. Esse é o nosso limite, mas Ele é capaz de fazer o que pedimos ou pensamos, e apenas Ele é capaz de fazê-lo. Ele é capaz!

Acredito que é isso que o apóstolo quis dizer. Depois de ter descrito em três capítulos a respeito de todas as maravilhas e glórias celestiais, ele afirma: “Existe apenas uma Pessoa que pode realizar isso, e esse é o Próprio Senhor; apenas Ele é capaz”.

Fiquei novamente impressionado com essa frase usada pelo apóstolo em 1 Coríntios 1, quando diz que existe uma pregação que torna a Cruz de Cristo sem efeito. “Não com sabedoria de palavra, para que se não anule a cruz de Cristo”. A Cruz, o maior instrumento de poder de Deus, pode ser tornado inútil. Como? Bem, o apóstolo diz que isso acontece por meio da sabedoria de palavras.

Mas, tomando o princípio maior que está por trás, o que ele está tentando nos dizer é que quando o esforço e a contribuição do homem são introduzidos, até mesmo a própria Cruz de Cristo perde seu poder. Quão verdadeiro isso é! A Cruz de Cristo, em toda a sua verdade, retidão, ortodoxia, doutrinas fundamentais! Podemos crer na Cruz de Cristo, até mesmo pregar a seu respeito, e isso pode ser vazio, sem poder. Quando? O apóstolo diz: “Quando trago a mim mesmo para dentro da equação!” É isso que Paulo está dizendo, que esse é todo o problema, o que rouba o poder. Ao tentar cumprir Efésios 1, 2 ou 3, ou qualquer parte dessa carta, me torno impotente, um fiasco, infeliz. Existe apenas Uma Pessoa que pode fazê-lo.

Fé em Um Deus que é Capaz de Realizar

Mas vamos passar para o lado positivo, nossa atitude de fé. Ele pode realizar! Àquele que é poderoso para fazer tudo o que pedimos ou pensamos… Não! O texto não diz isso. Esse é realmente o ponto crucial da Palavra do Senhor. Ela não diz, ‘Àquele que é capaz de fazer tudo o que pedimos ou pensamos’, mas diz, ‘capaz de fazer muito além, infinitamente mais’.

Então, frequentemente pensamos que o Senhor pode fazer aquilo que pedimos e um pouco mais. Não acredito que é isso que o texto quer dizer.

“Àquele que é poderoso para fazer infinitamente mais [huper] do que tudo quanto pedimos ou pensamos, conforme o seu poder que opera em nós” (Ef 3:20).

Acredito que a grande ênfase desse verso, talvez fique mais clara no idioma no original que no inglês (ou português), e ela reside na palavra mais [huper]. É ali que reside toda a ênfase – no mais, algo maior, e louvado seja Deus, algo melhor do que nós pedimos ou pensamos.

“Porque os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos, os meus caminhos, diz o Senhor…” (Is 55:8).

Apesar de constatarmos essa verdade pela experiência, devemos observar que o Senhor não deixou esse texto acabar assim. Ele acrescenta:

“…assim como os céus são mais altos do que a terra, assim são os meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os meus pensamentos, mais altos do que os vossos pensamentos”  (Is 55:9).

É como se o Senhor nos dissesse: ‘Não é apenas o fato de sermos diferentes, não é isso! Nem é por algum capricho Meu, que não realizo o que você pede, é que estou fazendo algo ainda melhor. Tenho um caminho mais elevado do que o seu, da mesma forma que os céus são mais altos que a terra!’

Será que isso explica para alguns de nós como o Senhor está respondendo as nossas orações, quando pensamos que Ele não está respondendo aos profundos desejos de nossos corações, ou até mesmo parece ignorá-los? Sua ação, Seu trabalhar, Seus tratos são diferentes de nossa concepção inicial de como Ele deveria cumprir Suas promessas. Nós pensamos: bem, o apóstolo diz que o Senhor, louvado seja o Seu nome, é capaz de realizar, e não somente aquilo que estamos pensando, mas algo infinitamente superior! Então pedimos, e se tomarmos nossa visão ou perspectiva da nossa petição, constataríamos: ‘O Senhor não realizou!’

Ah, mas existe outro lado dessa história! Talvez você não possa ver agora; talvez verá se olhar dessa maneira… o Senhor está fazendo algo muito maior do que você pediu, muito mais elevado do que o que você imaginou. Algo mais elevado, sim, a palavra usada aqui é ‘elevado’ [huper], e enquanto que no original necessariamente significa apenas isso, certamente estamos certos em afirmar que a ênfase não é apenas algo além, maior, mais elevado, superior, uma coisa maior neste sentido, mas me refiro a algo celestial.

Quão cheia está a Bíblia de homens desapontados, cujos caminhos não se desenrolaram como esperavam, cujas respostas ao chamado Divino não produziram o tipo da vida que imaginavam? Será que existe um – dificilmente um – que seja uma exceção a essa regra?

É quase que uma regra que cada servo de Deus que pensa ter vislumbrado o caminho Divino diante de si, e que se comprometeu em fé com o Senhor por toda a Sua vontade, tenha descoberto que não era aquele caminho, no final das contas, mas esse caminho. O desfecho não ocorreu da maneira que eles imaginavam, mas de uma maneira totalmente diferente.

Como o apóstolo Paulo desejava trabalhar entre os Judeus! Como ele pediu ao Senhor para que pudesse ser uma testemunha de Cristo para Israel, e como foi igualmente forte e superior a recusa do Senhor! Bem, se o apóstolo tinha isso em mente quando escreveu aquele verso, então sua atitude foi de que o Senhor realmente fez algo melhor, maior, ainda mais glorioso – e Ele verdadeiramente o fez, porque o apóstolo foi enviado não apenas à uma nação, mas a todas as nações, e recebeu uma mensagem não apenas para aquele tempo, mas dirigida para a eternidade. Algo maior, melhor. Isso não tornou aquele momento mais fácil para o apóstolo nem o deixou menos desapontado, e aquilo que é verdade no registro da história na Palavra de Deus é também muito verdadeiro na experiência humana. Entre muitos dos filhos de Deus hoje, a partir de certo ponto de vista, o caminho pode ter sido de desapontamento.

‘Você diz que o Senhor é capaz de fazer o que pensei, mas Ele não o fez! Você diz que o Senhor é capaz de fazer o que pedi – Ele não fez!’ Mas é provável que Ele tenha se comprometido em fazer algo melhor, superior, e tudo isso sempre é expresso em termos superlativos – infinitamente elevado, muito acima, muito superior a tudo o que nós pensamos ou pedimos. Ele não é maravilhoso?

Bem, essa é a maneira que nossos corações devem retornar a Ele – com um novo sentido de Sua maravilhosa capacidade. Ele é capaz de fazer muito além, abundantemente mais, muito acima de tudo o que podemos pedir ou pensar.

“Capaz de fazer muito excessiva e abundantemente mais, muito acima de tudo o que podemos pedir ou pensar, de acordo com o poder que opera em nós”. A maneira de Deus operar poderosamente é gerando um poder interior estimulando o coração do Seu povo.

O que precisamos aprender com essa palavra? Não seria que precisamos de mais fé? Algumas pessoas dizem que precisamos de mais oração. Prefiro dizer que precisamos de mais fé. Isso pode representar mais oração, mas para alguns de nós isso vai representar menos oração e mais fé no vivo, onipotente, glorioso, soberano e sábio Senhor. Capaz de realizar!

Nossos comportamentos e semblantes certamente devem ser marcados pela glória do fato de que nosso Deus é capaz, em nossa situação – considerando todas as suas fases e aspectos – de fazer além e abundantemente acima do que pedimos ou pensamos. Perceba que é dito “tudo”. Não existem exceções a essa regra para o filho de Deus que está seguindo em frente com o Senhor. Que Senhor maravilhoso nós temos! Isso traz glória para a nossa existência, e é assim que deve ser. O fim é sempre glória com o Senhor.

Outro dia recebi uma bênção, ao contemplar um detalhe na pontuação do texto de Efésios 1. Existe uma frase tremenda, que começa no terceiro verso: “Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo…” O apóstolo começa a falar dos tratos de Deus conosco e segue adiante. A partir do ponto de vista gramatical, já passava da hora de encerrar a frase, pois ele já tinha usado muitas vírgulas, ponto e vírgulas, então já era tempo de usar um ponto final. Mas ele segue adiante até o verso 14! Que frase! Mas qual é o fim desse verso? Glória!

Uma vez que nossa caminhada tem início, e a partir do momento em que nos lançamos no propósito Divino de graça e redenção, não haverá fim até que se obtenha a glória! Paulo disse ‘Sim, pode ter uma vírgula, ponto e vírgula, até mesmo uma pausa mais longa, mas não chegamos ao fim! Graças a Deus, não chegamos ao fim até que cheguemos à glória! E assim nos gloriamos em um Senhor que é capaz, louvamos Seu Nome, Ele é capaz não apenas de pensar esses pensamentos maravilhosos, mas também é capaz de realizá-los’. “Capaz de fazer muito além e abundantemente mais, muito acima de tudo o que podemos pedir ou pensar, de acordo com o poder” que, graças a Deus, independente de sentirmos ou não, está operando em nós. Vamos dizer, “A ele seja a glória, na igreja e em Cristo Jesus, por todas as gerações, para todo o sempre. Amém!”.

Tradução do texto “The God Who is Able to Do” de Harry Foster, publicado na revista “Uma Testemunha e Um Testemunho” (A Witness and a Testimony), volume 24, de Set-Out de 1946.