Cristo é o Único Poder para o Livramento

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O artigo “Cristo é o único poder para o livramento” é composto por extratos selecionados do capítulo 14 do livro “O Segredo Espiritual de Hudson Taylor”, de Howard Taylor (esgotado). 

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Hudson Taylor (1832-1905)

“Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer” (João 15:5).

Carta escrita por Hudson Taylor a uma irmã, a Sra. Broomhall [sua irmã], cujas responsabilidades para com a família de dez filhos eram grandes e prementes.

“Agradeço muito sua apreciada e longa carta… Acho que você não nos tinha escrito uma carta destas desde nossa volta à China. Sei que com você acontece o mesmo que comigo – não é que você não queira, é que não pode. A mente e o corpo só aguentam até um limite certo de esforço ou trabalho.

Quanto ao trabalho – o meu nunca foi tanto, de tamanha responsabilidade ou dificuldade, mas o peso e a tensão desapareceram. Este último mês (ou mais de um mês) tem sido, talvez, o mais feliz de minha vida, e quero muito contar-lhe um pouco o que o Senhor fez por minha alma. Não sei até onde poderei tornar-me claro no assunto, pois nada há de novo, ou estranho, ou maravilhoso – e ao mesmo tempo está tudo diferente e novo!

Quem sabe posso explicar se voltar atrás um pouco. Bem, mana, minha mente labutava muito nestes últimos seis a oito meses, sentindo a necessidade de maior santidade, vida e poder de alma, para mim e para a Missão. Mas em primeiro lugar estava minha necessidade pessoal. Senti a ingratidão, o perigo e o pecado de não viver ainda mais perto de Deus. Orei, agonizei, jejuei, me esforcei, tomei decisões, li a Palavra com maior diligência, procurei passar mais tempo meditando – mas tudo em vão. Todos os dias, quase hora por hora, a consciência do pecado me oprimia.

Eu sabia que tudo estaria bem se conseguisse permanecer em Cristo, mas não o conseguia. Começava o dia com oração, resolvido a não tirar dEle os olhos nem por um momento, mas a pressão das obrigações, às vezes muito difíceis, e as constantes interrupções que tendem a impacientar-nos, faziam com que me esquecesse dEle. Também, aqui, o clima age de tal modo sobre os nervos, que as tentações à irritabilidade, pensamentos duros, e às vezes palavras ásperas são mais difíceis de controlar. Cada dia trazia seu registro de pecado, fracasso e falta de poder. ‘O querer o bem’ estava ‘em mim’ mas como efetuá-lo, não conseguia descobrir.

Então veio a pergunta: Não haveria salvação? Teria que ser assim até o fim – constante conflito, e, muitas vezes, a derrota? Como eu poderia pregar sinceramente àqueles que receberam a Jesus, o fato der que Ele ‘deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus’ (i.e., semelhantes a Deus) quando não era assim em minha própria experiência? Em vez de tornar-me mais forte, parecia enfraquecer-me cada vez mais, e ter menos poder contra o pecado. Naturalmente, a fé e até mesmo a esperança fraquejavam. Tinha horror a mim mesmo, ao meu pecado, e todavia não ganhava terreno contra isto. Sentia que era filho de Deus. Seu Espírito clamava em meu coração, apesar de tudo: ‘Aba, Pai’. Mas não tinha força de espécie alguma para erguer-me à altura de exercer meus privilégios de filho.

Achei que a santidade, a santidade prática, seria gradativamente alcançada por meio de um emprego diligente dos meios de graça. Nada havia que desejasse tanto quanto a santidade, nada de que eu tanto necessitasse. Mas longe de alcança-la mesmo em parte. Quanto mais a buscava, mais ela fugia do meu alcance, ao ponto de sentir ameaçada de morte a esperança existente em mim. Comecei então a imaginar se – talvez para tornar mais doce o céu – Deus não o dava nesta vida. Não acho que tentava obtê-la com minhas próprias forças. Sabia que não tinha esse poder. Falei isso ao Senhor, e pedi-Lhe assistência e poder. Às vezes quase cria que Ele haveria de me guardar e suster; mas, olhando para trás, ao entardecer – ah! Só havia pecados e derrotas para confessar e chorar diante de Deus.

Não quero dar a impressão de ter sido esta a única experiência daqueles longos e exaustivos meses. Mas foi um estado de alma bastante frequente, que quase terminou em desespero. Entretanto, Cristo nunca me pareceu tão precioso! Um Salvador que podia e queria salvar este pecador! Às vezes havia períodos não só de paz como também de gozo no Senhor, porém duravam pouco, e ainda assim fazia-se sentir em mim a triste falta de poder. Oh! Como o Senhor foi bom em dar um fim a este conflito!

Em todo tempo eu tinha a certeza de que em Cristo havia tudo que precisava, mas o que eu me perguntava então era – como obtê-lO? Ele é tão rico, e eu tão pobre; Ele é tão forte, eu tão fraco. Eu sabia que havia fartura na raiz e no tronco, mas como fazê-la passar para o meu raminho desnutrido, era a questão. Fui vendo como que um raio de luz, e percebi que a fé era o único requisito, a única exigência – o instrumento pelo qual poderia me apossar de Sua plenitude, tornando-a minha. Mas não tinha essa fé.

Lutei para obter fé, mas não a recebia; tentei exercitá-la, porém em vão. Ao ver mais e mais a maravilhosa abundância de graça que estava em Jesus, a plenitude da perfeição de nosso precioso Salvador, a minha culpa e incapacidade pareciam aumentar. Os pecados cometidos pareciam-me insignificantes comparados ao pecado da incredulidade que causava os outros, aquele pecado que recusava confiar que Deus cumpre a Sua Palavra, fazendo-O mentiroso! Eu achava ser a incredulidade o pecado que condena o mundo; e eu o possuía. Orava por mais fé, e não recebia. O que devia fazer?

Quando a agonia da alma em que me encontrava chegou ao auge, uma frase de uma carta escrita pelo meu querido amigo McCarthy agiu para remover as escamas dos meus olhos, e o Espírito de Deus me revelou a verdade de nossa união com Jesus como nunca antes a tinha conhecido. McCarthy, que fora abalado pelo mesmo sentimento de fracasso que eu, enxergara a luz primeiro, e assim escreveu (cito de memória):

Como fazer para que a fé se fortaleça? Não lutando por ela, mas, sim, descansando sobre Aquele que é fiel’.

Lendo, compreendi perfeitamente! ‘Se somos infiéis, Ele permanece fiel’. Olhei para Jesus e vi (e quando vi, ah, que gozo senti!) que Ele havia dito: ‘Nunca o deixarei’.

Oh! está o descanso! Pensei. Lutei em vão para descansar nEle. Então parei de lutar, pois Ele não prometeu que ficaria comigo – nunca me deixaria e nunca me desampararia? Sabe, mana, o Senhor nunca vai me deixar.

Não foi só isto que Ele me mostrou. Esta foi uma fração do todo. Enquanto pensava na Videira e nas varas, quanta luz o Espírito bendito derramou em minha alma! Como parecia errado querer tirar a seiva, a plenitude dEle! Vi então que Jesus não só nunca me deixará, mas que sou membro do Seu Corpo, da Sua carne e de Seus ossos. A videira não é só a raiz, mas é tudo – raiz, tronco, galhos, raminhos, folhas e frutos. Jesus não é só isto – Ele é solo e sol, ar e chuva, e dez mil vezes mais do que tudo que já sonhei, desejei ou precisei. Ah! O gozo de ver esta verdade! Oro para que os olhos de seu entendimento possam também ser esclarecidos, para que você conheça e experimente as riquezas a nós concedidas, gratuitamente, em Cristo.

Ah! Minha cara irmã, é uma coisa esplêndida ser realmente um com o Salvador ressurreto e exaltado, ser membro de Cristo! Pense no que isto implica. Cristo pode ser rico e eu pobre? Sua mão direita pode ser rica e a esquerda pobre? Ou sua cabeça bem nutrida enquanto o corpo morre de fome? E mais, pense no que significa a oração. Será que o funcionário do Banco pode dizer a um cliente: ‘Foi só a sua mão, não foi o Sr. que preencheu aquele cheque‘; ou então: ‘Não posso pagar essa quantia à sua mão, só ao Sr. mesmo?‘ Do mesmo modo, nossas orações não podem ser desacreditadas se são oferecidas em nome de Jesus (e.e., não só por causa de Jesus, por amor de Jesus, mas na base de que nós somos dEle, Seus membros), contanto que fiquemos dentro dos limites de Cristo – o que é um limite razoavelmente amplo! Se pedirmos qualquer coisa contrária às Escrituras, ou que não esteja de acordo com a vontade de Deus, Cristo mesmo não faria isso. Mas ‘se pedirmos alguma coisa segundo a Sua vontade… obteremos os pedidos que Lhe temos feito’.

A parte mais doce, se é que podemos dizer que uma parte seja mais doce que a outra, é o descanso que decorre da plena identificação com Cristo. Agora já não estou mais ansioso sobre coisa alguma, quando reconheço isso; pois Ele, estou certo, é em tudo capaz de realizar a Sua vontade, e Sua vontade é a minha. Não importa onde Ele me coloque, nem como. Isto é antes para Ele do que para mim considerar; pois no lugar mais fácil Ele tem de dar-me Sua graça, e no lugar mais difícil, Sua graça me basta. Para o meu servo, por exemplo, não fará diferença que eu o mande sair para comprar algumas coisas de pouco valor, ou artigos muito caros. Em qualquer caso, ele me procurará para eu lhe dar o dinheiro e para me trazer as compras. Assim, se Deus me coloca em sérias perplexidades, não precisa me dar muita orientação? Se em posições de grande dificuldade, abundante graça? Em circunstâncias de fortes pressões e provas, grande força? Não há o perigo de que os Seus recursos sejam insuficientes para qualquer emergência! E os Seus recursos são meus, pois Ele é meu, está comigo, habita em mim.

Desde que Cristo tem assim habitado, pela fé, no meu coração, como me sinto feliz! Gostaria de poder falar-lhe, ao invés de estar escrevendo. Não é que eu seja melhor do que fui. Em certo sentido, não desejo ser, nem estou procurando isso. Mas eu estou morto e sepultado com Cristo – sim, e ressuscitado também! E agora Cristo vive em mim, ‘e esse viver que agora tenho na carne, vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e a Si mesmo se entregou por mim’.

Agora preciso terminar. Não disse a metade do que gostaria, nem disse como gostaria, se tivesse mais tempo. Que Deus lhe dê a apropriação dessas verdades benditas. Não continuemos a dizer, em efeito: “Quem subirá ao céu? (isto é, para trazer do alto a Cristo)” [Rm 10:6]. Em outras palavras, não consideremos que Ele esteja longe, quando Deus nos fez com Ele, membros de Seu próprio corpo. Nem devemos olhar essa experiência, essas verdades, como sendo para alguns poucos. São o direito e patrimônio de todos os filhos de Deus, e ninguém pode prescindir deles sem estar desonrando o seu Senhor, Cristo! Ele é o único poder para o livramento do pecado ou para o serviço verdadeiro”.


James Hudson Taylor (1832-1905) foi um médico inglês grandemente usado pelo Senhor para disseminar o Evangelho no interior da China. Seu grande segredo era cultivar o hábito simples de buscar constantemente o Senhor para o suprimento de todas as suas necessidades temporais e espirituais.

Seu filho Howard Taylor escreve em sua biografia que, apesar de sua pequena estatura e limitações físicas que o deixava com pouca energia, Hudson Taylor era um médico muito eficiente e um homem muito ativo em suas tarefas cotidianas – sabia cuidar de um bebê, preparar refeições, cuidar das finanças e consolar doentes e aflitos – tudo isso com a mesma segurança que se lançava em grandes empreendimentos. Ele foi um pai de família, com grandes responsabilidades e era um homem muito prático, vivendo uma vida que sofria constantes mudanças.

Acima de tudo, Taylor soube pôr as promessas de Deus à prova, atestando que era possível viver uma vida espiritual íntegra, em um nível muito elevado. Dezenas de milhares de almas foram ganhas para Cristo em muitas províncias chinesas que, até então, nunca tinham sequer conhecido um missionário. Cerca de mil e duzentos homens e mulheres trabalhavam em sua Missão para o Interior da China, dependendo somente de Deus para suprir todas as suas necessidades, pois viviam sem compromisso fixo de salário. Ele andava com Deus numa progressão contínua.

“Nunca fiz um sacrifício”, disse Hudson Taylor, recordando sua vida. De fato, se conhecermos seu testemunho, descobriremos que esse foi um elemento marcante em toda a sua trajetória. No entanto, Taylor entedia que as compensações de cada renúncia eram reais e duradouras, e que quando tratamos com Deus “de coração para coração”, negar-se a si mesmo sempre significa RECEBER.

Seu livro “Cântico dos Cânticos – União e comunhão pessoal com Cristo” retrata muito o seu coração, e foi um maravilhoso legado deixado pelo Senhor para a Igreja.


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