A Grandiosa Reversão é um artigo baseado no artigo “The sacred Reversal” de Julia Blum, do blog “Israel Biblical Studies”, e no capítulo 2 do livro “Spiritual Sight”, de T. Austin-Sparks.
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“Abriram-se, então, os olhos de ambos; e, percebendo que estavam nus, coseram folhas de figueira e fizeram cintas para si” (Gênesis 3:7).
“E aconteceu que, quando estavam à mesa, tomando ele o pão, abençoou-o e, tendo-o partido, lhes deu; então, se lhes abriram os olhos, e o reconheceram; mas ele desapareceu da presença deles” (Lucas 24:30,31).
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Em Gênesis vemos uma criação perfeita, até o surgimento daquele acontecimento trágico relatado em Gênesis 3, quando Adão e Eva pecaram, violando a ordem de Deus ao comer o fruto da Árvore do Conhecimento. Ali a ordenação natural e boa estabelecida pelo Criador foi invertida, e a Escritura nos revela que: “abriram-se, então, os olhos de ambos…”.
O que significa isso? Ali Adão e Eva perceberam, pela primeira vez, que estavam nus. Mas, de fato, algo muito mais profundo havia acontecido!
“De acordo com o registro sagrado, a queda não foi simplesmente um dos eventos ocorridos ao longo da história da criação, mas foi um cataclisma global, uma mudança total no status do universo.
O que a Bíblia descreve, ao se referir ao fato de os olhos de Adão e Eva terem sido abertos, é uma das manifestações e consequências mais substanciais e fundamentais dessa mudança global.
Adão e Eva, que até então viam Deus em Sua realidade e enxergavam tudo à luz dessa realidade, passaram a ver o mundo com uma visão obscurecida e pecaminosa.
Essa se tornou a visão de toda humanidade a partir dali. Aquela capacidade congênita de VER A DEUS se obscureceu, e a partir da queda, Adão e Eva e seus descendentes começaram a VER ESSE MUNDO, oprimidos pelo pecado e por tudo aquilo que é físico e material.
Eles deixaram a presença de Deus, e seus olhos foram abertos para esta perspectiva. A partir dali, para VER O INVISÍVEL, o homem precisaria de FÉ.
É por isso que o Senhor estava tão preocupado em impedi-los de estenderem a mão e tomarem também da Árvore da Vida, pois ao dela comerem, viveriam para sempre naquela condição, incapazes de VER a realidade espiritual – sendo capazes de ver apenas aquilo que é físico e material...” (Julia Blum).
Ao examinarmos a Septuaginta, que é a tradução grega do Antigo Testamento, veremos que essa frase em grego é escrita assim: “δε διηνοιχθησαν οι οφθαλμοι”. O verbo original indica olhos completamente, totalmente abertos. Essa palavra é muito usada na Septuaginta, mas um fato é muito significativo: Apenas uma única vez vemos essa frase sendo usada exatamente na mesma ordem de Gênesis 3, e ela fica no Novo Testamento.
Essa menção foi feita no Evangelho de Lucas, no capítulo 24, no relato dos discípulos que se dirigiam a Emaús. Essa é uma história de grande importância, e é muito conhecida de todos nós. Logo após a crucificação, aqueles dois discípulos de Jesus estavam se dirigindo a Emaús, e estavam perplexos e aturdidos com a perda do Mestre. O Senhor Se junta a eles, mas por alguma razão, eles se encontravam impedidos de O reconhecer, como se os seus olhos estivessem fechados. Finalmente, ao partir o pão, o relato de Lucas nos indica que: “se lhes abriram os olhos”.
Curiosamente, essa é exatamente a mesma frase mencionada em Gênesis 3:7, na versão da Septuaginta (em grego)!
O Sentido espiritual
É interessante sabermos que o grego de Lucas é considerado o melhor dos quatro evangelhos, dentro da opinião dos eruditos, e é bem provável que aquele fosse seu idioma nativo. Por isso, possivelmente ele conhecia bem a Septuaginta. Nesse caso, fazer uma análise comparativa entre as palavras gregas usadas pelo evangelista e as palavras usadas na Septuaginta pode ser muito esclarecedor.
Quando vemos esse paralelo entre Gênesis 3 e Lucas 24, não podemos deixar de imaginar que Lucas pode ter repetido propositalmente essa frase de Gênesis, dentro da direção do Espírito Santo.
Naquele momento em que o Senhor Se revela aos discípulos que seguiam para Emaús, temos uma GRANDIOSA REVERSÃO na história do homem.
Quando Adão e Eva pecaram, seus olhos FORAM ABERTOS para este mundo, mas naquele momento impressionante descrito no relato de Lucas, vemos um novo ABRIR DE OLHOS, só que agora para ver a DEUS.
Lucas traça um paralelo entre o momento da QUEDA e o momento da RESTAURAÇÃO – o instante da virada fundamental do destino da humanidade. Entre esses dois eventos, podemos ver o GRANDIOSO PROPÓSITO DE DEUS em ação na direção da salvação do homem, trazendo-o ao ponto que Deus sempre intencionou.
Por meio dessa impressionante simetria, “podemos compreender a profundidade e enormidade do que aconteceu no caminho para Emaús” (Julia Blum).
A importância da visão espiritual
“Porque Deus, que disse: Das trevas resplandecerá a luz, ele mesmo resplandeceu em nosso coração, para iluminação do conhecimento da glória de Deus, na face de Cristo”. (2Co 4:6)
É impressionante pensar na grandiosa mudança que ocorreu depois da ressurreição do Senhor Jesus! Como aquele cego de nascença, nós também podemos dizer: “eu era cego e agora vejo” (Jo 9:25). Nunca devemos deixar que isso perca a importância que tem para nós. Hoje somos um povo restaurado, que tem a possibilidade de VER o Senhor, e pelo sacrifício e ressurreição do Senhor da Glória, PODEMOS voltar a desfrutar de algo que havia sido perdido.
Também devemos nos lembrar que visão espiritual é algo progressivo. Assim como um bebê vai tendo sua visão amadurecida depois que nasce, nossos sentidos espirituais vão se consolidando e nossa visão espiritual deve ser cada vez mais ampliada em nossa jornada espiritual.
“O início da vida cristã é marcado pelo “ver”. (…) A própria lógica das coisas demanda que seja assim, e por esta razão, até o fim, toda a vida cristã deve ser um movimento progressivo nessa linha. O fim é Cristo. (…) O resultado da visão espiritual produz um reconhecimento do Senhor Jesus, e sempre será assim ao longo de todo o caminho.
Podemos até dizer que na nossa salvação nos vimos como pecadores. Mas se tivéssemos parado nesse ponto, nossa expectativa seria muito pobre. (…) O que nos acontece quando realmente vemos Jesus? Vamos lembrar do que aconteceu a Saulo de Tarso.(…) Nunca poderíamos persuadir um Saulo de Tarso a se tornar um cristão, tampouco conseguiríamos amedrontá-lo por meio de argumentos ou emoção. (…) Mas Saulo VIU a Jesus de Nazaré, e isso foi suficiente. Ele se tornou num homem emancipado porque VIU.” (T. Austin-Sparks).
Ver interiormente é um indicativo de que uma pessoa se tornou cristã! Este é o fundamento para todo o restante, até a consumação de nossas vidas, porque essa obra é crescente. Ela progride por meio de ver e continuar a ver cada vez mais claramente a Cristo.
A perda da visão espiritual
Mas seria possível perder a visão espiritual? A Palavra de Deus nos deixa claro que sim, ao registrar situações como a da Igreja de Laodicéia, que pensava que via, mas de fato estava cega (Ap 3:18).
Também conhecemos a história de Balaão, que profetizou como um homem “de olhos abertos”, “viu o Anjo do Senhor” (Nm 22:31; 24:3,4), mas que depois foi cegado por suas considerações pessoais. O desejo de lucro o cegou, deixando para nós o exemplo “do caminho de Balaão”, relatado na segunda epístola de Pedro, no capítulo 15. As Escrituras nos deixam claro que O SENHOR abriu os olhos de Balaão, mas depois aquele homem perdeu a visão interior, se tornando cego pelas suas considerações pessoais, seus desejos e suas ambições.
A visão espiritual governa o crescimento da nossa vida espiritual, conforme descrito pelo apóstolo Paulo:
“E todos nós, com o rosto desvendado, contemplando, como por espelho, a glória do Senhor, somos transformados, de glória em glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, o Espírito” (2Co 3:18).
“O que é crescimento espiritual? É ser conformado à imagem do Filho de Deus. Para que isso aconteça, temos que seguir progressiva, firme e consistentemente. Somos conformado pelo ver, e também crescemos pelo ver” (T. Austin-Sparks).
Visão e utilidade espiritual
Nossa utilidade espiritual também está atrelada à nossa visão (2 Co 4:7). “Em tudo somos atribulados…”. Ao sermos rebaixados, perseguidos, abatidos, descobrimos que essa é a maneira que Deus escolheu para manifestar a Cristo. Nesse caminho, aprenderemos experimentalmente sobre a graça do Senhor! Vemos o Senhor! Em nossos sofrimentos, podemos vê-Lo de forma maravilhosa.
“De quem você mais recebeu ajuda? Sei quem mais me ajudou, e não foi alguém que estava no púlpito. Foi alguém que passou por um intenso e terrível sofrimento durante muitos anos, provando a suficiência da graça de Deus. Pude afirmar: “Se passar por um sofrimento como este, meu cristianismo será de grande valor, e valerá a pena ter um Cristo como o meu”. Não pregue para mim, mas viva, e isso será de enorme ajuda. Nossa provação e adversidade são um meio para que as pessoas VEJAM O SENHOR. O MODO como passamos pela provação é o que mais ajudará aos outros, MUITO MAIS do que nossas palavras (…). O ministério dado e o ministério recebido depende integralmente da OBRA DIVINA DA GRAÇA no abrir dos nossos olhos” (T. Austin-Sparks).
Se formos honestos para com o Senhor, respondendo positivamente aos Seus tratos conosco, aquele maravilhoso milagre original da VISÃO será ampliado. Ao darmos espaço para a graça de Deus, essa visão crescerá, e seremos um testemunho vivo e útil para que outros VEJAM.
“Mas, pela graça de Deus, sou o que sou; e a sua graça, que me foi concedida, não se tornou vã; antes, trabalhei muito mais do que todos eles; todavia, não eu, mas a graça de Deus comigo” (1Co 15:10).
A MARAVILHOSA GRAÇA de Deus sempre será a causa e motivo do nosso louvor, eternamente.
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