Da colheita para a eira

Print Friendly, PDF & Email

Da colheita para a eira é um artigo baseado em meditações nos versículos 1 a 6 do capítulo 3 de Rute. Tomamos por referência os livros: “Estudos sobre o livro de Rute” de H. L. Heijkoop e “União com Cristo: Um vislumbre do livro de Rute” de Christian Chen.

***

“Disse-lhe Noemi, sua sogra: Minha filha, não hei de eu buscar-te um lar, para que sejas feliz? Disse-lhe Noemi, sua sogra: Minha filha, não hei de eu buscar-te um lar, para que sejas feliz?Ora, pois, não é Boaz, na companhia de cujas servas estiveste, um dos nossos parentes? Eis que esta noite alimpará a cevada na eira. Banha-te, e unge-te, e põe os teus melhores vestidos, e desce à eira; porém não te dês a conhecer ao homem, até que tenha acabado de comer e beber. Quando ele repousar, notarás o lugar em que se deita; então, chegarás, e lhe descobrirás os pés, e te deitarás; ele te dirá o que deves fazer. Respondeu-lhe Rute: Tudo quanto me disseres farei. Então, foi para a eira e fez conforme tudo quanto sua sogra lhe havia ordenado.” (Rute 3:1-6).

***

Compartilhamos a respeito da transição indicada pela mudança na forma que Rute iria se alimentar e no seu relacionamento com Boaz a partir do Capítulo 3. Antes, Rute colhia aquilo que sobejava dos servos, mas agora a colheita havia acabado. Aquela forma de se alimentar, que dependia da colheita das espigas deixadas pelos servos, não seria mais possível. 

Outra mudança encontrada no capítulo 3 é que ali vemos Boaz trabalhando na eira, tirando a casca da cevada, enquanto no capítulo 2, quem estava trabalhando eram os seus servos. 

Esse trabalhar de Boaz na eira, nos fala do trabalhar do Senhor, que consiste em obter em nós a essência dEle mesmo – o grão de trigo. Tudo que é do homem, do ego – a palha – o Senhor deseja tirar.

Já mencionamos a respeito da circuncisão, que é também nos fala dessa obra do Senhor em nós – uma vida dependente de Deus, que não mais confia na própria carne. Esse trabalhar é feito pelo próprio Senhor, não é delegado para homem algum. Por isso vemos Boaz trabalhando na eira, e não seus servos.

O Senhor, nossa morada

“Senhor, tu tens sido nossa morada, de geração em geração” (Salmo 90:1 – Darby Translation).

Também mencionamos que Noemi disse que buscaria um lar para Rute, para que esta fosse feliz. Isso indica que a sogra buscava um lugar onde Rute poderia manter comunhão permanente com Boaz – não se tratava de algo esporádico, mas um lar, um lugar de habitação. Assim como Paulo se referiu em sua epístola aos Efésios na expressão “em Cristo”, “nEle”, “por meio dEle”, “no Amado”, “no qual” – uma habitação nEle – em Cristo. (Ef 1:3-7, entre outros). 

“Logo no início do seu salmo, que é uma oração, Moisés faz uma declaração de fé: “Senhor, tu tens sido o nosso refúgio, de geração em geração”. Uma tradução mais moderna seria: “Senhor, tu tens sido nosso lar ao longo de todas as gerações” – porque a palavra lar traduz a ideia expressa nessa frase, um lugar de habitação. O Egito não foi o lar dos filhos de Israel, apesar de eles terem permanecido ali por mais de 400 anos. Em vez disso, o Egito foi uma fornalha ardente de severas provações. (…) Além disso, provavelmente pensamos que Canaã poderia ser considerado o lar deles. Sim, em certo sentido, é verdade que Deus prometeu aos filhos de Israel que a terra de Canaã seria sua herança, para que eles pudessem se estabelecer e morar ali. No entanto, ao ler a história desses israelitas, aprendemos que, enquanto obedecessem a Deus e cumprissem Sua aliança, eles permaneceriam naquela terra de promessas; mas se eles se rebelassem contra Deus e deixassem de cumprir Sua aliança, seriam espalhados pelos quatro cantos do mundo. E foi exatamente isso que lhes aconteceu mais à frente. Assim, em um sentido muito real, nem mesmo Canaã poderia ser considerado o seu lar. O que então, deveria ser a casa deles? Sem dúvida, o próprio Deus. Deus sempre deveria ter sido o “lar” do Seu povo. Assim, quando Moisés escreveu esse salmo, ele olhou não apenas para sua própria geração, mas para as que o antecederam – Abraão, Isaque e Jacó. Assim, pela fé, ele pôde declarar que Deus tinha sido o lar do Seu povo em todas as gerações. Que declaração de fé! Será que podemos fazer a mesma declaração em nossos dias e gerações – que Deus é nosso lar?” (Stephen Kaung – Abiding in God, Capítulo 1).

Também já discorremos bastante a respeito da direção que Noemi deu a Rute quando fosse se encontrar com Boaz na eira: “Banha-te, e unge-te, e põe os teus melhores vestidos, e desce à eira” (Rt 3:3). 

Cristo lavou meus pecados. Isso aconteceu pelo Seu sacrifício único. Mas lavar os pés é um ato recorrente. Comparamos esse lavar com a bacia de bronze, onde os sacerdotes se lavavam antes de entrar no Tabernáculo. Toda vez que havia alguma sujeira, eles deveriam lavar-se novamente. Esse processo do lavar de água pela Palavra deveria ser uma constante em nossa vida, nos limpando da poeira desse mundo.

“Habite, ricamente, em vós a palavra de Cristo” (Cl 3:16).

 “Filhinhos meus, estas coisas vos escrevo para que não pequeis. Se, todavia, alguém pecar, temos Advogado junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo; e ele é a propiciação pelos nossos pecados e não somente pelos nossos próprios, mas ainda pelos do mundo inteiro” (1Jo 2:1,2).

Nesse ponto a referência não é ao arrependimento inicial do pecador que está perdido. Apesar do sacrifício do Senhor cobrir esse aspecto da nossa restauração plena, no caso de um deslize, existe um aspecto que é a necessidade de refrigério da nossa comunhão e permanência no Senhor. Muitas vezes ficamos empoeirados pelas coisas deste mundo, e nossos sentidos espirituais ficam embotados. 

“Se andar descalço, com sandálias ou até mesmo com sapatos, a poeira acumulada em meus pés será inevitável. Não posso impedi-la. (…) Caminhando pelo mundo, não importa quão cuidadosos sejamos, é inevitável que alguma coisa fique grudada em nossos pés. (…) João 13 diz mais respeito ao nosso andar diário no mundo, em que é inevitável que alguma coisa se grude em nós. “Vós estais limpos”, diz Jesus. É assim que o precioso sangue vê. “Aquele que está lavado não necessita lavar…” (Jo 13:10). E, no que se refere ao pecado, a sentença poderia terminar ali. Mas mova-se pelo reino de Satanás e, certamente, algo irá apegar-se a você. Como uma película sobre nós, isso se coloca entre nós e o Senhor. E não há escapatória, simplesmente porque estamos em contato com as coisas do mundo o tempo todo, com negócios, seus prazeres, sua corrupta escala de valores e toda a sua ímpia perspectiva. Por isso, Jesus conclui com essas palavras: “Senão os pés”. (…) Muitas vezes sentimo-nos cansados e esgotados em virtude de nossos serviços seculares. Quando paramos para orar, parece que temos de esperar por um instante, que vamos levar dez ou vinte minutos para voltar àquele lugar onde realmente podemos alcançar a Deus. Ou, se nos sentamos para ler a Palavra, parece que precisamos de certo esforço para recobrar novamente a receptividade ao Seu falar. Mas como é bom quando, ao voltar para casa, encontramos um irmão com um coração transbordante, com o frescor da comunhão com Deus! Sem qualquer outra intenção, ele simplesmente aperta nossa mão e diz: “Irmão, louvado seja Deus”. Ele pode nem saber, mas, de alguma forma, é como se viesse com um espanador e limpasse tudo. Imediatamente, sentimos que nosso contato com Deus foi restaurado (…) você está refrescado; seus pés foram lavados. (…) É isto o lava-pés, refrescar meus irmãos em Cristo, trazer um irmão novamente ao lugar no qual é como se ele tivesse acabado de sair da presença de Deus. É esse o ministério de um para o outro que o Senhor deseja ver entre os Seus filhos. Se caminharmos com Deus, não há um único dia em que não possamos, se assim o desejarmos, ser um refrigério para nossos irmãos (…) Este é um dos maiores ministérios. E pode ser nada mais que um aperto de mão, uma palavra de encorajamento, quase dita ao acaso, pode ser a luz do céu em nossa face. (…) Podemos nem estar ciente disso (…) de fato pode ser melhor jamais sabê-lo (…) constantemente somos usados para o refrigério dos nossos irmãos” (Watchman Nee, Não Ameis o Mundo, extrato selecionado do Capítulo 8). 

Como já mencionamos, essa água usada para nos lavar os pés faz referência ao Espírito Santo e a Palavra, conforme citado em Efésios 5:25,26 e João 7:38,39. 

O alimento do Senhor

“…Porém não te dês a conhecer ao homem, até que tenha acabado de comer e beber” (Rute 3:3).

Por que Boaz estaria comendo e bebendo? O que isso tem a ver conosco? Temos que nos lembrar que antes eram os servos que estava colhendo, agora é Boaz que está trabalhando na eira.

Em João 4:32-34, o próprio Senhor Jesus nos diz O QUE É O SEU ALIMENTO:

“A minha comida consiste em fazer a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra” (vs 34).

O “alimento do Senhor” era fazer a vontade do Pai, e quando Ele a cumpriu totalmente, morreu e foi para o túmulo (Hb 10:5-10). Rute deveria vê-Lo fazendo a vontade do Pai em completa obediência, porque ela precisava aprender a obedecer. 

Um detalhe é que quando nosso Boaz está trabalhando, Ele está comendo também. Realizar a obra do Pai é o alimento do Senhor.

Jesus disse mais:

“Não dizeis vós que ainda há quatro meses até à ceifa? Eu, porém, vos digo: erguei os olhos e vede os campos, pois já branquejam para a ceifa. O ceifeiro recebe desde já a recompensa e entesoura o seu fruto para a vida eterna; e, dessarte, se alegram tanto o semeador como o ceifeiro. Pois, no caso, é verdadeiro o ditado: Um é o semeador, e outro é o ceifeiro. Eu vos enviei para ceifar o que não semeastes; outros trabalharam, e vós entrastes no seu trabalho.” (vs 35-38)

Destacamos três pontos importantes nesse texto:

– Os discípulos ainda não conheciam essa comida (vs 32).

– Um é o semeador e outro o ceifeiro (vs 37).

– Ele enviou os discípulos para ceifar aquilo que não semearam (vs 38). 

Assim como Rute, o que nós colhemos e nos alimentamos não foi semeado por nós, mas pelo próprio Senhor, em Sua graça. O Espírito Santo hoje semeia em nossas vidas e nós colhemos o fruto do trigo (a vida do Senhor). Esse fruto não foi plantado por nós. Não dependeu do nosso esforço.

Mas ainda precisamos aprender a conhecer a comida de Jesus, assim como aconteceu com os discípulos, pois eles não a conheciam. A comida que era desconhecida para eles estava relacionada à obediência ao Pai. A comida não era só colher o fruto do Espírito, mas também FAZER A VONTADE DO PAI. Vamos nos lembrar que Rute foi advertida a fazer tudo que Boaz lhe falasse. Sempre nos será requerida a obediência. A obediência ao Pai é um alimento especial que iremos aprender a desfrutar a partir da eira. 

Fazer a vontade do Pai e realizar Sua obra —-> demanda obediência.

“De acordo com 1Pedro 1:2, todo crente foi levado à ‘santificação do Espírito, para a obediência e a aspersão do sangue de Jesus Cristo’, isto é, à vida e à morte do Senhor. Encontramos a obediência de Jesus Cristo no lugar para onde fomos levados” (H. L. Heijkoop – Estudo de Rute, capítulo 3).

Jesus disse para os discípulos erguerem os olhos e ver os campos que já estavam brancos para a ceifa. Isso ele falou antes da Sua obra na cruz. De alguma forma, mesmo antes passarem pela realidade da obra da cruz, a comunhão dos Seus sofrimentos, o conformar-se com Ele em Sua morte – como disse Paulo – os discípulos já experimentavam da realidade eterna de colher aquilo que não plantaram – o poder da Sua ressureição (veja Fp 3:10).

Nós somos naturalmente aquele boi bravo no jugo com o Senhor, que deseja fazer a própria vontade (Mt 11:29). Mas o Espírito Santo busca nos conduzir à obediência, aprendendo do Senhor, “que é manso e humilde de coração”, para então alcançar descanso para as nossas almas. 

O significado do alimentar-se de Cristo

“Respondeu-lhes Jesus: Em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes o seu sangue, não tendes vida em vós mesmos” (Jo 6:53).

Alimentar de Cristo! Lembre-se de que você começou a se alimentar de Cristo ao fazer Dele a sua vida, e isso deve ser mantido como um hábito. De acordo com o que o Senhor estipulou e com a Sua Palavra, não será suficiente ter se alimentado ontem e não o fazer hoje, ou pensar que o alimento de hoje será suficiente para alguns dias. Tem que ser algo contínuo, diário, habitual. Então, o que é se alimentar de Cristo? Está relacionado a algumas coisas simples, cuja importância e magnitude somente podem ser reconhecidas a partir do ponto de vista do Testemunho para o qual estão conduzindo, apesar de serem consideradas comuns. 

Existe algum outro maior Testemunho do que a vida triunfante sobre a morte? Não há! E nós, à medida que caminhamos no Senhor, descobriremos que esta é a coisa mais elevada em nossa experiência, e é o que desperta toda a ira do inferno. Realmente estamos posicionados contra as forças diretas do Diabo e elas estão contra nós, quando tomamos nosso lugar com o Senhor Jesus. A questão está entre dois lados: será a destruição do nosso Testemunho pelas forças da morte, nos trazendo morte espiritual ou de qualquer outra natureza; ou será mantido o Testemunho da tremenda vitória de Cristo sobre todas as forças do Diabo. Quando virmos as coisas a partir desse ponto de vista, tudo o que se relaciona a elas passam a ter importância. (T. Austin-Sparks – Vimos a Sua Glória, Cap. 6).

Por diversas vezes, o Senhor desafiou pessoas que o buscavam a obedecê-Lo em circunstâncias absolutamente impossíveis. Em suas respostas positivas, aquelas pessoas experimentavam o poder do Senhor:

“Jesus, vendo-o deitado e sabendo que estava assim há muito tempo, perguntou-lhe: Queres ser curado?  Respondeu-lhe o enfermo: Senhor, não tenho ninguém que me ponha no tanque, quando a água é agitada; pois, enquanto eu vou, desce outro antes de mim. Então, lhe disse Jesus: Levanta-te, toma o teu leito e anda. Imediatamente, o homem se viu curado e, tomando o leito, pôs-se a andar. E aquele dia era sábado”. (Jo 5:6-9).

Quando o Senhor fala, e o Espírito Santo comunica conosco qual é a Sua vontade, Ele fala aquilo que para nós é impossível. O Senhor não curou aquele paralítico, depois o mandou levantar-se. Ao contrário, Ele pediu que o paralítico primeiro se levantasse, carregasse o leito, e nesse processo seria então curado. Quando o Senhor dá a Palavra, apesar de aparentemente impossível de obedecer, em nossa reposta, damos ao Espírito Santo a possibilidade de tornar tudo real para nós. No entanto, será necessário ouvir e depender do Senhor em tudo – pois a capacidade de obedecer a própria palavra do Senhor vem também dEle.

Assim, não teremos dúvidas de que foi o Senhor que fez todas as coisas. Não tínhamos capacidade alguma para obedecer e seguir naquela direção do Senhor. Somos como aquele paralítico – como podemos levantar e tomar nosso leito e seguir? Somente pela força e energia do Senhor que nos fala com Sua voz de poder.

Quando tudo então acontecer, diremos: “o Senhor fez isso” (Is 41:20). Se o Senhor tiver nossa disposição em obedecer, tudo que é necessário virá do próprio Senhor. 

Rute mostra seu coração desejoso em obedecer antes mesmo de entrar em contato com Boaz na eira: ”Tudo quanto me disseres farei” (Rt 3:5).

“Caminhando Jesus, viu um homem cego de nascença… Dito isso, cuspiu na terra e, tendo feito lodo com a saliva, aplicou-o aos olhos do cego, dizendo-lhe: Vai, lava-te no tanque de Siloé (que quer dizer Enviado). Ele foi, lavou-se e voltou vendo” (Jo 9:1; 6,7).

No relato a respeito do cego vemos que o Senhor segue o mesmo princípio. O Senhor dá a Palavra de ordem! É interessante que o Senhor cuspiu na terra, gerando lodo com sua saliva. Sim, “de tudo o que procede da boca do SENHOR viverá o homem” (Dt 8:3). Vemos ilustrado nesse milagre do Senhor que aquilo que sai de Sua boca (saliva), e é agregado à nossa humanidade (pó), possibilita o milagre. Ele é o milagre! 

“Instruir-te-ei e te ensinarei o caminho que deves seguir; e, sob as minhas vistas, te darei conselho” (Sl 32:8).

Ali, na eira, poderemos ser instruídos e dirigidos diretamente por Ele. Rute simplesmente creu e se dispôs a obedecer. Boaz também confiou plenamente na Palavra, ao se posicionar como resgatador. É a palavra de Deus que vai gerar essa fé em nossos corações, possibilitando em nós a disposição de ir até a eira.

“Para sempre, ó SENHOR, está firmada a tua palavra no céu” (Sl 119:89).

“Com terna compaixão, Ele se compadece de nossas fraquezas. Com infinita paciência, Ele suporta nossa lentidão. Com gentil benignidade, Ele trata de nossos temores e tolices. Esse amor é o amor do Pai para com o Filho: embelezado, glorificado, condescendente e perfeitamente adaptado às nossas necessidades. O amor de Deus é imutável. “Porque os montes se retirarão, e os outeiros serão removidos; mas a minha misericórdia não se apartará de ti” (Is 54:10)”. (Andrew Murray- Permanecei em Cristo, Dia 22, pg 115). 

Lhe descobrirás os pés

Quando ele repousar, notarás o lugar em que se deita; então, chegarás, e lhe descobrirás os pés” (Rt 3:4).

Os pés do Senhor estão relacionados aos Seus caminhos. Vá até lá e descubra os pés de Boaz. Precisamos conhecer os caminhos do Senhor. 

Também devemos nos lembrar que os pés do Senhor têm as marcas da cruz. Para aprender a obediência, precisaremos aprender como o Senhor trilhou o caminho da obediência. O Senhor viveu Sua vida aqui na terra em total obediência ao Pai. Ele viveu integralmente para fazer a vontade do Pai. Mas viver essa vida só será possível por meio de um relacionamento com o nosso Boaz. Só conseguiremos isso pela obra do Espírito Santo em nós. 

“Tinha ela uma irmã, chamada Maria, e esta quedava-se assentada aos pés do Senhor a ouvir-lhe os ensinamentos. Marta agitava-se de um lado para outro, ocupada em muitos serviços. Então, se aproximou de Jesus e disse: Senhor, não te importas de que minha irmã tenha deixado que eu fique a servir sozinha? Ordena-lhe, pois, que venha ajudar-me. Respondeu-lhe o Senhor: Marta! Marta! Andas inquieta e te preocupas com muitas coisas. Entretanto, pouco é necessário ou mesmo uma só coisa; Maria, pois, escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada” (Lc 10:39-42).

Na lição de Maria, descrita no Evangelho de Lucas, aprendemos algo muito precioso da boca do próprio Senhor. Aquele lugar onde Maria se assentou estava relacionado ao pouco que seria necessário, ou mesmo uma só coisa. Apesar de sermos muito dados a realizar coisas para o Senhor, A COISA NECESSÁRIA, que NÃO SERIA TIRADA de Maria, era aquilo que ela recebeu aos pés do Senhor.

Aos pés do Senhor encontramos a COISA NECESSÁRIA para de fato agradarmos ao Senhor. Ali, aprenderemos dEle, em primeira mão.

“Vede as minhas mãos e os meus pés, que sou eu mesmo; apalpai-me e verificai, porque um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que eu tenho” (Lc 24:39).

Os pés do Senhor também retratam Sua pessoa. Neles contemplamos as marcas da cruz, do Cordeiro de Deus. O Senhor era manso e humilde. Por isso, seus pés também nos lembram da comunhão da cruz. Ali também provamos do Seu amor, pois aquelas marcas evidenciam o preço pago pelo DIREITO DE REDENÇÃO. 

Não podemos deixar de lembrar que aquele mesmo Cordeiro um dia julgará as nações. Aqueles pés traspassados serão usados para pisar pessoalmente o lagar do vinho do furor da ira do Deus Todo-Poderoso. (Ap 19:15). Aquele que amou até o fim é apto a julgar! (Jo 13:1; 5:22-30).

Esse processo de passagem dos campos de colheita para a eira retrata o amadurecimento do relacionamento entre Rute e Boaz.

***

Palavra de Deus e obediência: as vestes da noiva

“Alegremo-nos, exultemos e demos-lhe a glória, porque são chegadas as bodas do Cordeiro, cuja esposa a si mesma já se ataviou, pois lhe foi dado vestir-se de linho finíssimo, resplandecente e puro” (Ap 19:7,8).

“Se eu não te lavar, não tens parte comigo” (Jo 13:8b). 

No verso descrito em João 13, o Senhor não disse “em Mim”, pois isso iria indicar que a salvação final dependeria de nossa condição diária diante de Deus, mas “COMIGO”, como Meu companheiro e servo. 

A bacia está em Ef 5, usada como figura da Palavra de Deus: “água da Palavra”. A água (como ocorre frequentemente com o tipo) representa o Espírito de Deus: ”água viva… Isto ele disse com respeito ao Espírito que haviam de receber os que nele cressem; pois o Espírito até aquele momento não fora dado, porque Jesus não havia sido ainda glorificado” (Jo 7:37-39). Cristo diz ao crente redimido: se a obediência for imediata, a graça do Espírito será prontamente experimentada, tornando essa obediência possível. Essa é a lei das questões espirituais: “vai, lava-te… ele foi, lavou-se e voltou vendo”; “levanta-te, toma o teu leito e anda” (Jo 9:7; 5:8). Em cada ato de obediência, a energia para fazer algo impossível é concedida. (…)

Justificação é o benefício inicial, concedido irremissivelmente; santificação é um processo que dura a vida toda. O sacerdote precisa lavar suas mãos e pés até o fim de sua carreira.

Essa obra graciosa e indispensável no crente é forjada por meio do falar de Cristo à igreja. Dessa forma é dado a ela se tornar pura. Mas palavras precisam ser obedecidas ou permanecerão inoperantes, e assim “pois lhe foi dado vestir-se de linho finíssimo” por meio de atos de justiça dirigidos pela Palavra de Deus. Tudo isso provém da graça, mas de uma graça usada, não abusada, obedecida, não negligenciada. A graça de Deus nos instrui:

“Porquanto a graça de Deus se manifestou salvadora a todos os homens, educando-nos para que, renegadas a impiedade e as paixões mundanas, vivamos, no presente século, sensata, justa e piedosamente, aguardando a bendita esperança e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus, o qual a si mesmo se deu por nós, a fim de remir-nos de toda iniqüidade e purificar, para si mesmo, um povo exclusivamente seu, zeloso de boas obras” (Tt 2:11-14).

Assim: “E a si mesmo se purifica todo o que nele tem esta esperança, assim como ele é puro” (1Jo 3:3).

Aos justificados, aos que “obtiveram fé igualmente preciosa na justiça do nosso Deus e Salvador Jesus Cristo”, também é assegurado que serão concedidas “todas as coisas que conduzem à vida e à piedade” (2Pd 1:1-4). Assim, a santidade se torna possível. É como se um pai entregasse a um filho uma nota promissória emitida por um banco, e pagável sob demanda, de forma que Deus enriqueceu Seus filhos com todos os recursos para atender às demandas de uma vida santa. Nos apossamos da riqueza espiritual prometida por meio da oração da fé e da obediência às instruções de nosso Pai, e, à medida que Seu caráter se desenvolve em nós, nos tornamos “participantes da natureza divina”. Isso não é a mesma coisa que a vida eterna, mas uma consequência dela. 

Todos os seres humanos têm a vida humana, mas suas naturezas são diferentes. Alguns são mais ásperos, outros mais delicados, alguns ativos, outros indolentes. Toda a família de Deus tem a vida do Pai, mas eles diferem no grau em que aquilo que é natural a Deus (como a santidade, amor aos inimigos) se torna natural a eles. E essa diferença é proporcional na medida da apropriação de cada um deles das promessas Divinas. Negligenciar as promessas deixa a alma empobrecida, assim como negligenciar a promissória deixa o bolso vazio.

Ademais, a disciplina do Pai, que é recebida por meio de provações da vida, independente de sua causa, é outro fator de grande contribuição nesse processo. O Pai disciplina cada filho que recebe, para que se tornem “participantes da sua santidade” (Hb 12:10). Como justificados, eles já possuem Sua justiça, mas por meio de Seus tratos eles serão capacitados para participar de Sua santidade. Bendito é aquele que se humilha debaixo da poderosa mão de Deus, mesmo quando a mão que de fato nos pressiona é do maligno, em vez de se ressentir ou resistir à disciplina imposta pelo Pai celestial. Tal avanço na santidade é a preparação para a honra e alegria nupciais.

Extrato de tradução de texto de G. H. Lang (Pictures and Parables, capítulo 42, parte 4, pg 378).

***

“Noemi instruiu a Rute que observasse onde Boaz se deitaria, descobrisse seus pés e se deitasse, então ele lhe diria o que fazer. De nossa parte, apenas vamos até a eira e observamos onde ele se deitará, mas o importante é descobrir-lhe os pés (…) Essa é a nossa parte, Ele fará o resto. Qual o significado disso? Maria assentava-se aos pés do nosso Senhor (Lc 10::39). Se quisermos conhecer o segredo, e reivindicar os nossos direitos, se quisermos ser como o nosso Senhor e estar em união viva com Ele, só poderemos fazê-lo se estivermos aos Seus pés. Estar aos Seus pés equivale a estar na eira.

Quando Boaz perguntou a Rute: “Quem és tu?”, ela lhe respondeu: “Estende a tua capa sobre tua serva, pois tu és o resgatador”. Isso significa que ela propôs que ele exercitasse seu direito, ou seja: “Case-se comigo”. 

“Estende a sua capa”, em hebraico significa “estende as suas asas”. Essa expressão já apareceu no capítulo 2: “sob cujas asas viestes buscar refúgio” (vs 12). Essas asas são muito importantes. Rute estava aos pés de Boaz, e lhe disse: “Estende tuas asas sobre tua serva”. No Santo dos Santos, encontramos a arca debaixo do propiciatório e as asas dos querubins cobriam aquela arca.

Essas são as asas sob as quais Rute veio buscar refúgio. Ela desejava chegar na presença de Deus. Quando alguém está sob aquelas asas, isso significa que está no Santo dos Santos, onde está a arca.

No Antigo Testamento, a arca é o estrado dos pés de Deus. Deus está no céu, Seu trono está no céu, mas Ele estendeu Sua presença até a Terra (…) Ele não habita propriamente no templo, mas em Sua própria casa nos céus. Ele está assentado no trono, porém estende Sua presença até a Terra. Quando o povo chegava no Santo dos Santos, chegava na presença de Deus. (…)

Rute ansiava por aquele momento, ela havia chegado àquela terra para buscar refúgio; apenas ali encontraria descanso. Não temos nenhum outro lugar de descanso a não ser onde Cristo está, onde Deus está. O céu é o céu porque Deus ali está, e o inferno é terrível porque não tem a presença de Cristo. De acordo com a Palavra de Deus, nosso destino é sermos unidos com Cristo, esse é um direito nosso. Dessa forma venceremos a batalha, seremos vitoriosos. Mas como conseguiremos isso? Apenas quando chegarmos na eira, aos SEUS PÉS. Chegaremos ao Santo dos Santos e aí teremos uma comunhão maravilhosa com o nosso Deus. 

Chegar no Santo dos Santos significa chegar ao mais profundo do nosso ser, então estamos em Sua presença. Apenas nessa comunhão descobriremos a comunhão da CRUZ. O Espírito Santo passará a cruz para nós, fará com que tomemos a cruz. Tudo isso acontece por estarmos aos pés de Boaz. Ali tomamos o mesmo jugo dele.

A comunhão com Deus em nosso espírito é o início de tudo. Somente a partir dessa posição poderemos reivindicar nossos direitos, não estamos mendigando (…) Boaz honrava a Palavra de Deus, e por isso respondeu a Rute que atenderia seu pedido. Cristo nunca pode trair a si mesmo. NOSSO DESTINO É ENTRAR NESSA EXPERIÊNCIA MARAVILHOSA. (…) 

Extrato selecionado das páginas 114 a 116 do livro União com Cristo, de Christian Chen.

***

Referências:

Estudos sobre o livro de Rute – H. L. Heijkoop (Depósito de Literatura Cristã).
União com Cristo: Um vislumbre do livro de Rute – Christian Chen (Edições Tesouro Aberto).
Não Ameis o Mundo, Watchman Nee.
Vimos sua glória, T. Austin-Sparks.
Permanecei em Cristo, Andrew Murray.
Picture and Parables, G. H. Lang.
Abiding in God, Stephen Kaung.

Post anterior
Encontrando Boaz na eira
Próximo post
O testemunho de Deus na Sua palavra

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Preencha esse campo
Preencha esse campo
Digite um endereço de e-mail válido.

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.