Ada Habershon
“Ora, estas coisas se tornaram exemplos para nós” (1 Co 10:6).
Existem muitas razões pelas quais não devemos negligenciar os tipos, que ocupam uma posição tão proeminente nas Escrituras, em nosso estudo da Palavra de Deus.
(1) É muito claro que o próprio Deus coloca um grande valor neles. Foi o Seu Espírito que os projetou; porque aprendemos na Epístola aos Hebreus que, na construção do Tabernáculo, cada detalhe foi planejado por Ele. Quando falando do véu que dividia o Santo Lugar do Santo dos Santos, o escritor da epístola diz: “querendo com isto dar a entender o Espírito Santo que ainda o caminho do Santo Lugar não se manifestou, enquanto o primeiro tabernáculo continua erguido” [Hb 9:8].
Havia um sentido naquele véu; e não era simplesmente algo pendurado para dividir as duas partes do Tabernáculo. Ele era designado para transmitir uma superior lição. Outros detalhes do Tabernáculo e todos os outros tipos devem ser também significativos; e apesar de todos não serem claramente explicados, podemos, com a ajuda do seu Autor, tentar aprender o sentido que Ele intencionou para eles. Sem esse Mestre, a dificuldade no estudo poderia nos deter; mas temos a promessa do Senhor de que “esse vos ensinará todas as coisas” [Jo 14:26]; “ele vos guiará a toda a verdade” “porque há de receber do que é meu e vo-lo há de anunciar” [Jo 16:13,14]. Quando lemos nos Evangelhos que o véu foi rasgado, e nos lembramos de Hebreus, dessa passagem a respeito do véu erguido no Tabernáculo, podemos escrever nas margens das nossas Bíblias: “querendo com isto dar a entender o Espírito Santo que o caminho do Santo Lugar agora foi manifestado”. Uma mão invisível rasgou o véu “de alto a baixo” [Mt 27:51; Mc 15:38], pois se fosse de “baixo para cima” poderia parecer que o homem tinha algo a ver com isso. Foi o próprio Deus que completou o tipo, e adicionou os toques finais à figura.
Isso não demonstra a imensa importância que Ele coloca nos tipos, porque mesmo naquele momento, Ele não se esqueceu de marcar a significância daquele evento para o qual tantos daqueles tipos apontavam e, em rasgando o véu, declarou que o caminho fechado estava agora aberto pela morte do Seu Filho? “Falavam de sua partida, que Ele estava para cumprir em Jerusalém” [Lc 9:31], esse era o assunto da conversa quando Moisés e Elias falavam com o Senhor Jesus Cristo no Monte da Transfiguração, e posteriormente todo o céu deve ter ficado ocupado com o que tomava lugar no Calvário, ainda assim, os tipos não foram esquecidos por Deus.
Seus detalhes são tão exatos, que cada um deveria ser cumprido pelo grande Antítipo quando Ele veio. Não apenas eram figuras de eventos em um passado distante, que podemos comparar com o que aconteceu depois, mas eles foram os planos nos quais os eventos subsequentes deveriam corresponder. Por isso, no registro de João a respeito da crucificação, lemos: “chegando-se, porém, a Jesus, como vissem que já estava morto, não lhe quebraram as pernas… E isto aconteceu para se cumprir a Escritura: Nenhum dos seus ossos será quebrado” [Jo 19:33, 36]. Onde nas Escrituras, além de na ordenação da Páscoa, estava distintamente estabelecido, “nem lhe quebrareis osso nenhum” [Ex 12:46]?
(2) Nosso Senhor pensou muito nos tipos. Diversas vezes Ele se referiu a eles e mostrou como apontavam para Ele mesmo. Que maravilhosa leitura da Bíblia Ele deve ter dado àqueles dois discípulos na estrada de Emaús, quando “começando por Moisés, discorrendo por todos os Profetas, expunha-lhes o que a seu respeito constava em todas as Escrituras”; e deles respondeu Sua própria pergunta “Porventura, não convinha que o Cristo padecesse e entrasse na sua glória?” [Lc 24:26,27]. Os sofrimentos e a glória foram preditos pelos tipos, assim como pelas profecias relacionadas ao assunto; e não era de se maravilhar que os corações deles queimassem dentro deles nessa memorável caminhada, e mais tarde, na mesma noite, quando “Então, lhes abriu o entendimento para compreenderem as Escrituras” [Lc 24:45]. Os eventos que haviam acabado de acontecer tinham sido prefigurados ali; mas eles não tinham compreendido aquelas antigas passagens tão familiares, até que Ele mostrou a eles como “importava se cumprisse tudo o que Dele está escrito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos” [Lc 24:44]. Aqueles que negligenciam os estudos dos tipos falham em ver quanto existe de Cristo na lei de Moisés.
No livro de Apocalipse o Senhor é visto como o Antítipo de todos os sacrifícios. Não menos que vinte e oito vezes Ele é chamado de Cordeiro. Mesmo no capítulo cinco, onde o Apóstolo espera ver o Leão da tribo de Judá se posicionando em Sua força, Ele aparece como um “cordeirinho”; e o discípulo amado O vê novamente como ele O havia visto pela primeira vez, naquele dia memorável quando João Batista apontou: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” [Jo 1:29].
(3) Não apenas Cristo falou dos tipos, mas eles falam Dele. Se vamos “crescer na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo” [2 Pe 3:18], não podemos fazer nada menos do que estudar o que eles falam de Sua pessoa e da Sua obra. Ele disse aos Judeus, quando estava na terra, “se, de fato, crêsseis em Moisés, também creríeis em mim; porquanto ele escreveu a meu respeito” [Jo 5:46]. Com exceção de algumas poucas passagens como a de Dt 18:15-19, na qual o Messias é claramente prefigurado, foi por meio de tipos que Moisés escreveu de Cristo. Todos eles falavam Dele: o tabernáculo, as ofertas, as festas, todos falavam de diferentes aspectos da Sua obra por nós e, assim como “no seu templo cada partícula pronuncia de Sua glória!” [Sl 29:9 – tr.KJV – margin], assim também em cada um daqueles primeiros tipos.
(4) Outra razão para valorizarmos essa parte da Palavra de Deus é o supremo lugar que é concedido aos tipos pelos escritores do Novo Testamento. Eles são referidos como “a Escritura”, e sabemos que “a Escritura não pode falhar” [Jo 10:35]. Os tipos e sombras do Antigo Testamento devem ser cumpridos no Novo. Por exemplo, lemos em 1 Co 15:4 que Cristo “ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras”. Não foi a ressurreição de Cristo profetizada nos tipos mais plenamente do que em qualquer outro lugar? Na oferta movida dos molhos de primícias “no dia imediato ao sábado”, imediatamente depois da páscoa (Lv 23), este próprio dia é prefigurado; e nós sabemos por meio de outro verso em 1 Co 15, que isso se refere à Sua ressurreição, porque Paulo fala de “Cristo, as primícias; depois, os que são de Cristo, na sua vinda” [vs 23].
(5) Existem muitas passagens no Novo Testamento que nós não podemos compreender sem estar em alguma medida familiarizados com os tipos. A Epístola aos Hebreus é quase que inteiramente feita de referências ao Antigo Testamento: como a substância, Cristo, é provada como sendo melhor do que as sombras – melhor do que Moisés, que Josué, que Abraão, que Aarão, que o primeiro Tabernáculo, que os sacrifícios Levíticos, e que a nuvem de testemunhas na imagem da galeria de heróis da fé; e finalmente, Seu sangue é provado melhor que o sangue de Abel.
Algumas vezes nos esquecemos que os escritores do Novo Testamento eram estudantes do Antigo Testamento; essa era a sua Bíblia, e eles iriam naturalmente aludir vez após vez sobre os tipos e sombras, esperando que seus leitores também estivessem familiarizados com eles. Se falharmos em perceber essas alusões, iremos perder muito da beleza das passagens, e não poderemos compreendê-las corretamente. Por exemplo, vamos tomar Atos 3. Pedro, quando falando do retorno do Senhor, diz: “ao qual é necessário que o céu receba até aos tempos da restauração de todas as coisas”; e iremos perder o sentido disso se falharmos em ver o tipo para o qual ele evidentemente se referia. Nós lemos em Lev 25 que no soar da trombeta no jubileu, “tornareis, cada um à sua possessão, e cada um à sua família” (vs 10). E “no Ano do Jubileu, o campo tornará… àquele de quem era a posse do campo por herança” (Lv 27:24). Isso será o que vai acontecer com Israel quando o seu Messias aparecer. O país vai mais uma vez pertencer a eles, e o Filho de Davi vai retornar para Sua família e Sua terra. Essa expressão em Atos é um exemplo de como a interpretação básica de uma passagem pode ser perdida pela falta de ver o tipo do Antigo Testamento do qual a alusão foi feita, porque elas são muito frequentemente usadas como um terreno para edificação de toda a sorte de teorias que não estão na Bíblia.
No Evangelho de João existem constantes referências para os tipos. No primeiro capítulo, nossa atenção é trazida para o Cordeiro de Deus e nossos pensamentos levados de volta para todos os cordeiros que foram anteriormente sacrificados, desde o cordeiro de Abel em Gênesis 3, até o último oferecido no templo. No versículo que encerra o capítulo 1, temos a evidente referência à escada de Jacó. No verso 14, Cristo é mostrado como o Antítipo do Tabernáculo, porque ele nos diz como “o Verbo se fez carne e habitou entre nós”; enquanto no Capítulo 2, Ele se compara com o templo, quando diz: “Destruí este santuário, e em três dias o reconstruirei” [vs 19]. No capítulo 3, vemos o Senhor como a serpente de bronze. No capítulo 6, Ele diz que Ele é o verdadeiro maná. No capítulo 7, somos lembrados da rocha ferida, porque Ele mesmo foi a rocha da qual iria fluir os rios de águas vivas. Nos capítulos 8 e 9, Ele é a luz do mundo. No capítulo 10, Ele é o Antítipo de todos os pastores do Antigo Testamento. No capítulo 11, Ele é o grão de trigo que foi trazido no molho das primícias. No capítulo 13, temos a bacia, e no capítulo 15, a verdadeira videira em contraste com a videira que Ele trouxe do Egito. Portanto, em praticamente cada capitulo, um tipo do Antigo Testamento é trazido diante de nós.
Se compararmos o Evangelho de João meramente com um tipo, o Tabernáculo, veremos que ele parece dividir-se em três partes. Nos primeiros 12 capítulos, temos o ministério do Senhor na terra, no átrio exterior onde todos os povos são admitidos; e temos Suas últimas palavras para os de fora nos últimos versículos do capítulo 12. Assim como no Tabernáculo, a primeira coisa vista foi o altar e o cordeiro, e temos a abertura desse evangelho com o Cordeiro de Deus que tira todo o pecado do mundo. No capítulo 13, Cristo está preparando Seus discípulos para o serviço no Santo Lugar pelo uso da bacia. Nos capítulos 14, 15 e 16 vemos o Senhor com eles no Tabernáculo; e Ele os ensina muito sobre o Espírito Santo, tipificado pelo óleo do Candelabro; e sobre oração em Seu nome, tipificado pelo incenso no altar de ouro. Já no capítulo 17, temos o Sumo Sacerdote sozinho no Santo dos Santos.
(6) Nós já vimos que os tipos parecem cobrir toda a esfera do ensino do Novo Testamento. Não são apenas os tipos do Antigo Testamento desdobrados no Novo Testamento, mas o Novo Testamento está coberto por eles.
(7) Esse estudo nos dá um verdadeiro antídoto para o veneno da chamada “alta-crítica”. Se reconhecermos a intenção Divina em cada detalhe dos tipos, mesmo que não possamos compreender todo o seu ensino, e se acreditarmos que existe uma lição em cada incidente registrado, os ataques da crítica moderna não vão nos afetar. Podemos não ser tão sagazes para entender o que os críticos dizem, ou aptos para responder às suas críticas; mas se nossos olhos forem abertos para ver a beleza dos tipos, as dúvidas que esses escritores sugerem não nos incomodarão, e encontraremos uma ocupação mais proveitosa do que ler suas obras. Quando tanto dessas críticas destrutivas estão acontecendo, não podemos fazer melhor do que incitar todos – até mesmo os cristãos mais novos – a tomar o estudo típico da Palavra de Deus; porque apesar Dele ter ocultado essas coisas dos sábios e entendidos, Ele as revela aos pequeninos.
A “alta crítica” e o estudo dos tipos não podem seguir juntos, porque ninguém que aprendeu o ensino espiritual das figuras do Antigo Testamento iria acreditar, ou tentar provar, que a Bíblia não é o que reivindica ser.
Extraído do livro “The Study of the Types” de Ada Habershon (Capítulo 1).
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Irmãos graça e paz! Maravilho-me com os estudos fornecidos por vocês. Faz pouco tempo que descobrir este site e estou aprendendo bastante. Que O Senhor Jesus abençoe vocês!