O Estudo dos Tipos, uma Introdução

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Ada Habershon (1861-1918)

“Estas coisas lhes sobrevieram como exemplos e foram escritas para advertência nossa, de nós outros sobre quem os fins dos séculos têm chegado” (1 Coríntios 10:11).

A consideração dos tipos do Antigo Testamento é um dos assuntos mais interessantes e úteis para nosso estudo Bíblico, além de ser absolutamente necessário se quisermos compreender corretamente a Palavra de Deus.

O Antigo Testamento é frequentemente visto como uma mera coleção de contos históricos, que descrevem a origem do povo Judeu e ilustra os costumes e maneiras orientais, sendo útil para suprir temas para as histórias de crianças na escola bíblica, mas de pouca importância prática para o ensino espiritual.

A Bíblia pode ser comparada com aqueles belos volumes ilustrados, tão frequentemente publicados, com gravuras no início, seguidas de textos que as descrevem ou explicam, dando sua história ou contando algo da vida do artista. Podemos dificilmente conceber que qualquer um, ao ler os textos explicativos, tentando compreender as descrições das figuras, não volte à elas, a fim de entender melhor o que o texto está dizendo; mas não é assim que a Bíblia é frequentemente tratada.

Deus nos deu uma série de figuras nos primeiros livros da Bíblia. O Novo Testamento se refere a elas e as explica; ainda assim, muitas pessoas estão satisfeitas em ler o Novo Testamento sem nenhuma referência aos tipos descritos no Antigo. Tais pessoas não acreditam na palavras de Santo Agostinho:

O Novo está contido no Antigo;

O Antigo é explicado pelo Novo.

Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil … a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra” [2 Tm 3:16,17]; e ainda assim, muitos ficam satisfeitos em saber pouco, ou até mesmo nada sobre as partes da Bíblia que foram evidentemente dadas a nós por Deus para algum propósito.

Somos privilegiados por viver em dias de muita atividade Cristã; mas ainda que exista tanta energia e zelo, é possível nos engajarmos em “boas obras”, sem sermos “perfeitamente habilitados” – e assim, tais obras sofrerão as consequências. Maria fez uma “boa ação” quando quebrou o vaso de alabastro cheio de unguento e ungiu o Senhor; mas isso foi o resultado da “boa parte” que ela escolheu quando, “assentada aos pés do Senhor, ouvia-lhe os ensinamentos” [Mt 26:10 / Lc 10:39-42]. Foi naquele momento que ela provavelmente soube do Seu propósito relacionado à Sua ressurreição, e soube que, se não O ungisse para Seu sepultamento “antecipadamente”, não teria outra oportunidade. O Senhor ainda teria Seus filhos tomando esse lugar, em humilde dependência Dele, para aprender o que Ele iria os ensinar. Isso quer dizer que não devemos ler o Antigo Testamento como lemos escritos a respeito da antiga Roma ou da história Grega; mas devemos ler por meio de um cuidadoso estudo sob a direção do Senhor, para encontrar as Suas razões, as causas que levaram os eventos a ocorrer ou que permitiram que eles ocorressem, nos dando o registro desses eventos.

O sucesso das iniciativas Cristãs é uma das principais características dos dias em que vivemos. Entretanto, não podemos fechar nossos olhos para o lado escuro da figura. Existem outras coisas também crescendo, e entre elas está o avanço visível da disseminação de doutrinas falsas. Muitos estão deixando de lado as verdades simples da Palavra de Deus. A Inspiração das Escrituras é atacada por todos os lados; a doutrina da Expiação por substituição é negada, ou diminuída, enquanto outras coisas contrárias à Palavra são pregadas. Isso não seria tão frequente se os tipos do Antigo Testamento fossem mais cuidadosamente estudados e sabiamente ensinados. “A Tipologia do Antigo Testamento é o alfabeto do idioma no qual a doutrina do Novo Testamento é escrita; e à medida que nossos grandes teólogos são ignorantes confessos de tipologia, não devemos nos surpreender se estes não são os mais seguros expoentes das doutrinas” (“The Literal Interpretation of Scripture”- Sir Robert Anderson, C.B. LL.D.).

Além disso, a perda na escala pessoal é enorme para aqueles que não estudam por si mesmos essa parte da Bíblia; e ainda assim, é comum encontrarmos aqueles que são cristãos por anos e que são professores Bíblicos, sem nunca atentarem para isso.

Muitas razões são dadas para essa negligência. Alguns pensam que os tipos são difíceis; outros dizem que o estudo é fantasioso, ou que não é interessante; e entre as diversas causas, eles perdem um rico tesouro que poderiam ali obter. As coisas preciosas da Palavra de Deus não estão todas sobre a superfície. Devemos cavar para encontra-las. Como acontece ao afundar um eixo na escavação de um poço, o trabalho pode ser difícil no início, e necessita de diligência; mas quando encontramos um veio de minério, somos recompensados, porque descobrimos que encontramos uma mina de inesgotável riqueza.

É muito importante entender o que é representado por um tipo. Em 1 Coríntios 10 nos são enumeradas diversas experiências do deserto dos filhos de Israel, e “Estas coisas lhes sobrevieram como figuras” (vs 11 – ARA); Paulo explica que o registro desses eventos é dado a nós na Bíblia com um propósito especial, ou seja, para nos ensinar certas lições. Essa passagem parece cobrir tudo o que aconteceu com o povo redimido de Deus na sua jornada do lugar de escravidão em direção à terra da promessa. Disso podemos concluir que essas porções da história nos são dadas com um similar propósito. Mas apensar de estudar as lições espirituais, os incidentes realmente ocorreram. Alguns que estão abrindo mão de sua crença na inspiração da Bíblia tentam nos fazer acreditar que, apesar de nessas velhas histórias existir um sentido espiritual, elas são apenas tradições e fábulas; não registros de eventos reais. São alegóricos e não devem ser tomados literalmente mais do que o livro “O Progresso do Peregrino” de John Bunyan. É suficiente para nós o fato de que o Próprio Senhor e os escritores do Novo Testamento olharam para esses registros verdadeiros como eventos reais.

Alguns personagens Bíblicos são claramente referidos no Novo Testamento como tipos. Eles eram pessoas reais, que viveram vidas reais. Não são personagens míticos que nunca viveram; e o registro de sua história é evidentemente dado para nos ensinar a respeito Daquele que eles prefiguravam. A história de José é um exemplo impressionante disso; e quando vemos na sua vida a figura dos “sofrimentos referentes a Cristo e sobre as glórias que os seguiriam” [1 Pe 1:11], e do livramento que Ele forjou, compreendemos porque uma porção tão grande do Livro de Gênesis é devotada à história de José. Ele é talvez o mais completo tipo do Senhor que podemos encontrar; e diferente de muitos heróis do Antigo Testamento, não parece haver nenhuma mancha nas páginas de sua vida para desfigura-lo.

Mas, além de incidentes e de pessoas típicas, existe uma outra classe muito importante de tipos, a dizer, todas as coisas que foram expressamente ordenadas por Deus em conexão com o Tabernáculo e o serviço do Templo, e que, em cada detalhe, foram claramente dados como tipos: “querendo com isto dar a entender o Espírito Santo” [Hb 9:8]. Essas são algumas lições sobre o Senhor e Sua obra. Alguns poderiam tentar nos fazer acreditar que a religião Hebraica, como descrita nos livros de Moisés, foi apenas emprestada das nações pagãs ao seu redor; mas um estudo cuidadoso dos tipos não dá lugar à duvida, porque vemos que toda a economia Levítica era divinamente instituída para prefigurar a obra e a pessoa do próprio Senhor Jesus Cristo.

Não podemos afirmar com certeza que algo é um tipo, a não ser que tenhamos alguma garantia para isso. Se não pudermos nos voltar para uma passagem do Novo Testamento para nos autorizar, ou se não existe expressão ou analogia que traga indicação do antítipo, é mais seguro e correto chamar isso de uma ilustração.

“Enquanto visitávamos Northfield, alguns de nós estávamos olhando para o belo modelo do Templo de Salomão, projetado pelo Mr. Newberry, que está na biblioteca do seminário Moody, uma senhora, que ouviu nossa conversa, disse que não acreditava em nenhum dos tipos – ela os considerava todos fantasiosos. Tentamos lhe explicar que o verdadeiro tipo era algo projetado por Deus para nos ensinar uma lição, e que se o Novo Testamento evidencia isso, não havia risco de ser fantasioso. Perguntamos a ela se não haviam tipos nos quais ela acreditasse”.

“Não”, disse ela, “nenhum”.

“Você não pensa que quando João o Batista disse, ‘Eis o Cordeiro de Deus’, ele quis dizer que todos os cordeiros que foram oferecidos como sacrifício antes daquele tempo eram tipos do Senhor Jesus?”

“Sim”, ela respondeu, “vejo isso”.

“Você não pensa que quando Pedro fala dos crentes como pedras vivas edificadas em uma casa espiritual, ou de um sacerdócio real, ele pode ter tomado as pedras do templo e o sacerdócio Levítico como um tipo dos crentes?”

“Sim, posso ver isso”.

“Então, quando nos é dito em Hebreus que o Senhor Jesus Cristo consagrou para nós um novo e vivo caminho, ‘por meio do véu, a dizer, a sua carne’, poderíamos nós dizer, destemidamente, que o véu era um tipo da Sua encarnação, e o rasgar do véu, a Sua morte?”

Sim, ela percebeu isso. E depois que ela reconheceu cinco ou seis tipos bastante evidentes, lhe recomendamos aprofundar mais o estudo, e lhe dissemos que certamente acreditávamos que ela iria desejar continuar depois. Ela logo ficou muito interessada no estudo.

Nesses dias de tantas conferências, por que nunca tivemos uma para o Estudo dos Tipos? Existem serviços evangelísticos para pregar o Evangelho; existem conferências para as Verdades Fundamentais; sobre a Inspiração da Palavra, a Vinda do Senhor e outros assuntos proféticos; a unidade e privilégios da Igreja, e convenções para o “aprofundamento da vida espiritual”. Todos esses assuntos estão incluídos no estudo dos tipos. Onde podemos encontrar tipos mais belos dos Evangelhos do que nas cenas do Antigo Testamento, como o levantar da serpente no deserto, o sacrifício do cordeiro pascal, e tantos outros? Verdades Fundamentais são claramente explicadas e ilustradas. As doutrinas da expiação, substituição, o valor do sangue são mais plenamente ensinadas nos tipos do que em qualquer outro lugar nas Escrituras – exceto no que tange ao próprio Calvário, o qual elas prefiguravam. Nossa crença na Inspiração da Bíblia não pode deixar de ser fortalecida por esse estudo. Iremos encontrar impressionantes figuras proféticas no Antigo Testamento, porque é impossível ver a completa beleza de tantas instituições Levíticas, sem a verdade dispensacional.

No que tange aos objetos relacionados aos privilégios e unidade da Igreja, esses são repetidamente prefigurados nos tipos. Algumas vezes é dito que a Igreja não é o assunto da profecia do Antigo Testamento; mas ainda que seja assim, não pode ser excluída dos tipos. Logo no segundo capítulo da Bíblia vemos a Igreja prefigurada; porque temos o registro da formação de Eva e de sua união com Adão, e Paulo nos diz em Efésios 5 que isso é um tipo de nosso relacionamento com Cristo. Citando o texto de Gênesis 2:24 “tornando-se os dois uma só carne”, ele acrescenta “Grande é este mistério, mas eu me refiro a Cristo e à igreja” [Ef 5:32].

De longe vemos que a maior quantidade de convenções são aquelas para “o aprofundamento da vida espiritual”; e acima de todas, o assunto da santidade parece ser enfatizado nos tipos.

Nos livros de Moisés aprendemos mais claramente, do que em qualquer outro lugar, sobre a visão correta da santidade de Deus e da nossa necessidade. Testemunhas oculares dos sofrimentos de Cristo nos deram registros nos Evangelhos de um grande antítipo, a cruz do Calvário; mas podemos falhar em ver todos os seus variados aspectos sem a ajuda dos tipos. Os detalhes, que são trazidos diante de nós em minuciosas direções, a respeito das ofertas e instituições do Tabernáculo, nos ensinam muitas lições que enfatizam muitas verdades que, sem esses registros, iríamos perder de vista. Como podemos falhar em aprender mais e mais da repugnância que Deus tem pelo pecado e nossa constante necessidade de limpeza, como vermos na maravilhosa provisão que Ele nos deu para cada tipo de impureza?

Por isso, vemos prefigurado nos tipos “todo o conselho de Deus”. Sem a completa revelação da verdade nas Epístolas, eles não poderiam ser completamente compreendidos; mas, com esse ensino, podemos ver sentidos que teriam sido ocultos daqueles que viveram no tempo do Antigo Testamento.

Foi observado que os tipos são apenas um pequeno pedaço da Bíblia, e isso é provavelmente uma opinião geral; mas será que está correto? Eles não seguem por meio de todo o Livro, envolvendo em seu estudo uma familiaridade crescente com o todo da Palavra de Deus? Nos livros de Moisés e nos livros históricos temos pessoas típicas, eventos, instituições; nos poéticos temos afirmações típicas dadas por pessoas típicas; nas profecias temos de novo pessoas típicas e eventos, e o cumprimento dos tipos preditos; enquanto que, em todo o Novo Testamento, eles são constantemente referenciados e explicados, e o grande Antítipo é apresentado.

Extraído do livro “The Study of the Types” de Ada Habershon (Introdução).

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