Descanso aos seus pés é um artigo baseado em meditações no capítulo 3 de Rute. Tomamos por referência os livros: “Estudos sobre o livro de Rute” de H. L. Heijkoop e “União com Cristo: Um vislumbre do livro de Rute” de Christian Chen.
“Havendo, pois, Boaz comido e bebido e estando já de coração um tanto alegre, veio deitar-se ao pé de um monte de cereais; então, chegou ela de mansinho, e lhe descobriu os pés, e se deitou. Sucedeu que, pela meia-noite, assustando-se o homem, sentou-se; e eis que uma mulher estava deitada a seus pés. Disse ele: Quem és tu? Ela respondeu: Sou Rute, tua serva; estende a tua capa sobre a tua serva, porque tu és resgatador. Disse ele: Bendita sejas tu do SENHOR, minha filha; melhor fizeste a tua última benevolência que a primeira, pois não foste após jovens, quer pobres, quer ricos. Agora, pois, minha filha, não tenhas receio; tudo quanto disseste eu te farei, pois toda a cidade do meu povo sabe que és mulher virtuosa”
(Rute 3:7-11).
Comer, beber e se alegrar
“Havendo, pois, Boaz comido e bebido e estando já de coração um tanto alegre” (Rt 3:7).
Como já vimos, Boaz tipifica Jesus como nosso resgatador. O Senhor mais tarde nos disse, conforme relatado por João em seu evangelho, que Sua comida era realizar a vontade do Pai (Jo 4:32-34). As Escrituras também nos informam que, depois de ter cumprido essa vontade, Seu coração se alegrou (Hb 12:2).
Descanso aos pés do monte de cereais
“Veio deitar-se ao pé de um monte de cereais” (Rt 3:7).
O fato de Boaz ter-se deitado ao pé do monte de cereais nos trás a ideia de descanso, como ocorreu no sétimo dia da criação. Esse descanso nos fala da obra completa do Senhor Jesus. Deus descansou na criação porque a obra estava concluída, não por estar cansado, pois Ele não se cansa nem se fatiga (Is 40:28). Quando o Senhor Jesus morreu na cruz, disse: “Está consumado” (Jo 19:30). Depois de três dias, Ele ressuscitou. Então podemos dizer que esse descanso indica aquilo que segue uma obra completa.
O que então representava aquele monte de cereais onde Boaz se deitou? Devemos nos lembrar que Boaz estava na eira tirando a casca dos cereais recentemente colhidos. Ali, o cereal remete à vida do Senhor Jesus. Jesus nos conduz até a eira para realizar o trabalho de limpeza, extraindo de nós aquilo que não é dEle. Quando Ele encosta e repousa aos pés do monte de cereal, isso indica que Ele repousa descansa no fruto de Sua obra (o fruto do Seu penoso trabalho – Is 53:11). Ao encontrar na comunhão de Seus santos a expressão da vida do trigo, Ele pode descansar. Nesse local, finalmente Boaz descansa, e isso é muito representativo para nós.
“Os primeiros versículos do Salmo 22 descrevem os sentimentos do nosso Senhor ao atravessar as profundas agonias da cruz, onde Ele foi desamparado por Deus, carregou nossos pecados e foi feito pecado por nós. Mas no versículo 22, ouvimos a sua voz: “A meus irmãos declararei o teu nome; cantar-te-ei louvores no meio da congregação”.” (HEIJKOOP, HL – Estudos RUTE-Capítulo 3, p.14)).
Ao realizar a Sua obra, o Senhor Se alegra e canta louvores no meio da congregação. Finalmente Ele pôde descansar. Quando nos relacionamos com Ele em intimidade, como vemos ilustrado em Rute e posteriormente no caso de Maria (que escolheu a boa parte – Lc 10:42), encontramos o Senhor descansando. É isso que Ele busca: que o único desejo do coração de Seus filhos seja estar em Sua presença.
“Lançai fora o velho fermento, para que sejais nova massa, como sois, de fato, sem fermento. Pois também Cristo, nosso Cordeiro pascal, foi imolado. Por isso, celebremos a festa não com o velho fermento, nem com o fermento da maldade e da malícia, e sim com os asmos da sinceridade e da verdade” (1Co 5:7,8).
Encontramos essa mesma figura neste texto do apóstolo Paulo. Em Rute, a cevada foi separada da casca, ficando apenas a cevada pura. Aqui em 1 Coríntios vemos uma massa pura, sem o velho fermento. Fomos resgatados sem trazer o fermento dentro de nós. A massa sem fermento em 1 Coríntios pode equivaler ao trigo sem a casca no livro de Rute.
Aos Seus pés
“Então, chegou ela de mansinho, e lhe descobriu os pés, e se deitou” (Rt 3:7).
Pensando agora na intimidade entre Rute e Boaz, pois ela está deitada aos Seus pés, encontramos uma ilustração daquele verso de Romanos 6:4: “fomos crucificados com Cristo”. O Senhor foi rejeitado aqui na terra ao ponto de ter sido crucificado. Quando encontramos Rute junto com Boaz naquela eira, é como se ela dissesse: “Estou com você aqui”. Vemos a comunhão da cruz. Isso faz parte do processo de tomarmos a Cruz com o Senhor Jesus (Mt 10:38). Quando temos essa comunhão com o Senhor na eira, a intimidade com Ele se torna um prazer, apesar de ser algo dolorido para a nossa natureza. Entretanto, sabemos que não estamos sós, pois o Senhor está conosco. Podemos compreender que Ele tem uma glória muito maior diante e nós.
Entretanto, no que diz respeito ao mundo, isso representa rejeição. Nunca seremos aceitos por essa mensagem que levamos. Mas é justamente nesse lugar que encontraremos a intimidade com o Senhor, como nos diz o hino:
“Sim, eu amo a mensagem da cruz
Até morrer eu a vou proclamar
Levarei eu também minha cruz
‘Té por uma coroa trocar”
A Igreja aos Seus pés, Filadélfia
“Sucedeu que, pela meia-noite, assustando-se o homem, sentou-se; e eis que uma mulher estava deitada a seus pés” (Rt 3:8).
Se tomarmos as cartas enviadas às sete igrejas da Ásia, em Apocalipse 2 e 4, como sendo uma profecia do que aconteceria na história da Igreja, o período correspondente à igreja de Tiatira seria aquele marcado pela Igreja Católica Apostólica Romana, durante seu período de poder na tenebrosa Idade Média (Ap 2:18-28). O Senhor veio julgar o povo que vivia naquela ocasião, pois ela era corrupta e rejeitava a chamada ao arrependimento. “Dei-lhe tempo para que se arrependesse; ela, todavia, não quer arrepender-se da sua prostituição” (Ap 2:21).
Aquele julgamento ocorreu por meio da Reforma Protestante, que trouxe um novo começo. Se antes o único testemunho conhecido era aquele manifestado na Igreja Católica, agora, com a reforma, há um novo frescor, que é representado pela Igreja de Sardes. Entretanto, o Senhor lhes diz: “Tens nome de que vives, e estás morto” (Ap 3:1). Ainda que nessa triste condição, em Sardes ainda havia um remanescente: “Tens, contudo, em Sardes, umas poucas pessoas que não contaminaram as suas vestiduras” (vs 4). Logo depois da reforma, a Igreja começou a perder a essência daquilo para a qual foi levantada, mas algumas pessoas ainda mantiveram o testemunho exterior.
Isso foi acontecendo até a revolução francesa, durante o período de Napoleão Bonaparte. A partir desse período, algo novo voltou a acontecer. De alguma forma, o Senhor despertou vários países para retornar para Sua Palavra (no século XVIII), principalmente os países cristãos, quando ocorreu uma busca por um relacionamento mais íntimo com o Senhor. Isso corresponde ao período tipificado pela igreja de Filadélfia.
O irmão Heijkoop entende que essa expressão de Rute aos pés de Boaz, deitados aos pés do monte de cevada, tipifica o Senhor descansando por ver Sua igreja limpa da casca, buscando uma expressão de testemunho verdadeiro, sem a casca exterior da religião. Essa é a expressão do que aconteceu a partir do período da Revolução Francesa e perdurou até ao final do século XIX. Esse foi um tempo em que a Igreja desistiu das coisas técnicas e formais, retornando a um relacionamento íntimo e simples com o Senhor, por meio da Sua Palavra. Aquelas pessoas desejavam a Palavra do Senhor sem liturgias, as quais trouxeram morte, como aconteceu com a Igreja Luterana.
Mas Filadélfia representava o oposto de Sardes: era um pequeno rebanho do Senhor Jesus, mas cheio de Sua vida.
Quem és tu?
“Disse ele: Quem és tu? Ela respondeu: Sou Rute, tua serva; estende a tua capa sobre a tua serva, porque tu és resgatador” (Rt 3:9).
Quando lemos todo o texto, vemos que Boaz já sabia quem Rute era. Então por que ele lhe perguntou isso? Se pensarmos em Boaz como representando o Senhor Jesus, podemos atribuir a necessidade dessa pergunta do Senhor a nós, porque nós não nos conhecemos. Quem é você? Qual é a sua identidade? Onde você está apoiando suas esperanças? O Senhor nos faz hoje essas perguntas, não para nos conhecer, porque Ele já nos conhece, mas para mostrar para nós mesmos quem somos.
Isso aconteceu com Jacó. O anjo lhe perguntou: “Como te chamas?” (Gn 32:27). Ali Jacó reconheceu quem realmente era. O anjo já sabia, mas queria que Jacó tivesse essa revelação.
Vemos esse mesmo princípio em Jó. O Senhor conhecia o ponto fraco de Jó, mas permitiu que ele passasse por todo tipo de situação para que pudesse se conhecer.
Quando olhamos para a história da igreja nos primeiros séculos, até chegarmos ao penúltimo século para cá, veremos como a Igreja perdeu muita coisa. E nesses desvios da Igreja durante os séculos, muitas doutrinas e entendimentos errôneos da Palavra foram trazidos para dentro. Por exemplo, nosso entendimento sobre céu e inferno muitas vezes se baseia mais na obra de Dante Alighieri, na Divina Comédia, do que na Palavra de Deus.
A revelação do Senhor não nos é concedida de uma só vez, mas paulatinamente o Senhor vai descortinando quem Ele é para nós.
No período da Igreja Católica, as pessoas acreditavam na venda de indulgências, e pensavam que havia um mérito no homem para conquistar sua salvação. Depois, a Igreja do Senhor descobriu que a graça era imutável.
Vemos que a revelação do Senhor foi sendo assimilada gradualmente, como se o Senhor, de tempos em tempos, nos perguntasse: ‘quem é você?’. Para que possamos receber mais revelação e entendimento hoje, precisamos passar periodicamente por esses confrontos – “quem é você?”. A partir disso, o Senhor pode nos conduzir mais adiante.
A resposta de Rute à Boaz que é ela era sua serva. Isso, de alguma forma, indica que ela não se considerava mais como Moabita, mas como serva.
Esse é o primeiro ponto que o Senhor quer nos levar. Não somos mais Moabitas. Agora não andamos mais segundo a carne. Somos servos do Senhor Jesus. Rute também é levada a saber que Boaz, de alguma forma, era seu parente.
Isso também era fundamental para sua consciência, dando-lhe segurança para fazer o que fez. Ela estava aos pés de alguém da família, mesmo que não fosse um laço de sangue. Rute tomou para si a ideia de que era parente dele.
Precisamos saber que, mesmo que nossa origem vem de Adão, agora somos servos do Senhor, transportados do império das trevas para o reino do Filho do Seu amor (Cl 1:13), e fomos feitos filhos de Deus e Seus irmãos (Jo 20:17). Não somos estrangeiros, mas parte da família de Deus (Ef 2:19). Se isso não estiver claro para nós, deixaremos de usufruir do relacionamento com o Senhor. A segurança da filiação nos concede ousadia para nos aproximarmos de Deus.
Estende Tua capa
“Estende a tua capa sobre a tua serva, porque tu és resgatador” (Rt 3:9).
Estender a capa aqui é a mesma expressão usada por Boaz, quando falou com Rute, no capítulo 2, verso 12: “o Deus de Israel, sob cujas asas vieste buscar refúgio”. Vemos a humildade de Rute ao se colocar como serva de Boaz, mas também sua ousadia em buscar refúgio “sob suas asas”, pois ela precisava do suporte e do socorro de Boaz.
O Senhor Jesus usou uma expressão similar, quando chorou por Jerusalém: “Quantas vezes quis eu reunir os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintinhos debaixo das asas, e vós não o quisestes!” (Mt 23:27).
Por diversas vezes, Davi usou essa expressão, em especial no Salmo 57:1: “Tem misericórdia de mim, ó Deus, tem misericórdia, pois em ti a minha alma se refugia; à sombra das tuas asas me abrigo”.
Mas como Boaz reagiu diante dessa atitude de Rute? Da mesma forma que o Senhor, quando nos lançamos aos Seus pés como servos, pois isso agrada muito o Seu coração.
No capítulo 2, Rute nos diz que era serva, mas não se comparou com uma daquelas que trabalhava com Boaz, mas se colocou em posição abaixo delas. Mas agora, mesmo sendo serva, Rute foi mais longe. Ao pedir para se refugiar sob as asas de Boaz, estava lhe pedindo para ser sua esposa.
Por um lado, ela se humilhou, por outro, foi muito intrépida. Seu pedido era para ser sua esposa. Como sua esposa ela também seria senhora de muitos bens, como ele.
Tu és resgatador
“Disse ele: Quem és tu? Ela respondeu: Sou Rute, tua serva; estende a tua capa sobre a tua serva, porque tu és resgatador” (Rt 3:9).
Rute, de fato, não tinha direito de solicitar a Boaz o que ela pediu. Vamos rever as possibilidades da lei relacionadas ao RESGATADOR, para compreendermos a grandeza da GRAÇA de Deus, ilustrada na situação de Rute, pois seu pedido excedeu aquilo que estava prescrito na LEI.
O resgate da terra devido a pobreza
“Também a terra não se venderá em perpetuidade, porque a terra é minha; pois vós sois para mim estrangeiros e peregrinos. Portanto, em toda a terra da vossa possessão dareis resgate à terra. Se teu irmão empobrecer e vender alguma parte das suas possessões, então, virá o seu resgatador, seu parente, e resgatará o que seu irmão vendeu” (Lv 25:23-25).
A terra não podia ser vendida perpetuamente, mas, a cada cinquenta anos, no ano do jubileu, deveria retornar à posse do dono original (vs 10; 13-16). Também havia a possibilidade na lei de que qualquer parente próximo resgatasse a terra no lugar da pessoa pobre.
Rute não tinha herança, pois ela não vendeu a terra dela para ninguém. Quem tinha a terra era seu sogro. Por isso, ela não tinha direito de resgatar a terra que não lhe pertencia.
O resgate da terra devido a escravidão
“Depois de haver-se vendido, haverá ainda resgate para ele; um de seus irmãos poderá resgatá-lo: seu tio ou primo o resgatará; ou um dos seus, parente da sua família, o resgatará; ou, se lograr meios, se resgatará a si mesmo” (Lv 25:48,49).
Aqui vemos que poderia haver o resgate da escravidão por parte de alguém da família da pessoa escravizada. Mais uma vez, essa previsão da lei não se aplicava à Rute, já que ela não havia sido vendida como escrava, tampouco era parente de Boaz para ser resgatada por ele.
O resgate da descendência
“Se irmãos morarem juntos, e um deles morrer sem filhos, então, a mulher do que morreu não se casará com outro estranho, fora da família; seu cunhado a tomará, e a receberá por mulher, e exercerá para com ela a obrigação de cunhado. O primogênito que ela lhe der será sucessor do nome do seu irmão falecido, para que o nome deste não se apague em Israel. Porém, se o homem não quiser tomar sua cunhada, subirá esta à porta, aos anciãos, e dirá: Meu cunhado recusa suscitar a seu irmão nome em Israel; não quer exercer para comigo a obrigação de cunhado. Então, os anciãos da sua cidade devem chamá-lo e falar-lhe; e, se ele persistir e disser: Não quero tomá-la, então, sua cunhada se chegará a ele na presença dos anciãos, e lhe descalçará a sandália do pé, e lhe cuspirá no rosto, e protestará, e dirá: Assim se fará ao homem que não quer edificar a casa de seu irmão; e o nome de sua casa se chamará em Israel: A casa do descalçado.” (Dt 25:5-10).
Como vemos no texto acima, o resgate da descendência se aplica à irmãos, não a parentes. O irmão do falecido deveria se casar com a cunhada e não permitir que o nome de seu irmão se apagasse de Israel. Vemos que esse aspecto da lei foi inclusive abordado pelos saduceus com o Senhor Jesus em Mateus, no capítulo 22, versos 23 a 33, reforçando esse aspecto da lei – o irmão do morto deveria dar continuidade à descendência do falecido.
O cunhado de Rute, que seria então a pessoa que deveria lhe resgatar, também havia morrido. Portanto, também nesse caso, Boaz, que não era cunhado de Rute, nem de Noemi, não teria obrigação de suscitar a descendência para Elimeleque (sogro de Rute) ou Malom (marido de Rute).
Por isso, Rute não tinha direito legal de pedir o resgate da terra nem da sua descendência para Boaz. Ela foi muito além do que a lei lhe assegurava. A base de seu pedido, portanto, não foi a lei, mas sua fé.
A esposa filha
“Disse ele: Bendita sejas tu do SENHOR, minha filha” (Rute 3:10).
Rute era moabita e, portanto, estava privada do direito de entrar na assembleia do Senhor (Dt 23:3). Também não tinha como parente a Boaz, o que não lhe dava o direito de ser por ele resgatada (como vimos anteriormente).
Entretanto, no versículo 10, Boaz a chama de “milha filha”. Isso é muito representativo, pois, naquele momento, Boaz estava incluindo Rute em sua família, a considerando como tal. Assim, como pertencente à família de Boaz, ela teria o direito de resgate.
Assim também aconteceu conosco. Pelo nosso direito de nascimento, somos de origem moabita, conduzidos pela nossa carne, “separados da comunidade de Israel e estranhos às alianças da promessa, não tendo esperança e sem Deus no mundo. Mas, agora, em Cristo Jesus, vós, que antes estáveis longe, fostes aproximados pelo sangue de Cristo” (Ef 2:12,13).
A graça nos alcançou. O Senhor agora nos chama de filhos e nos traz para dentro de Sua família. Aleluia! Nossa sorte foi mudada. Somos agora filhos de Deus, herdeiros dEle e cordeiros com Cristo (Rm 8:17).
De alguma forma, Rute, pela fé, ousou pedir o que não lhe era de direito. Como a fé abre portas para o Senhor operar coisas inimagináveis! Considerando nossa natureza, nunca poderíamos experimentar e desfrutar dessas coisas! Rute se lançou na direção de algo muito além de suas possibilidades, reconhecendo que não era merecedora.
A solução não está nos recursos deste mundo
“Melhor fizeste a tua última benevolência que a primeira, pois não foste após jovens, quer pobres, quer ricos” (Rute 3:10).
A primeira benevolência foi deixar a sua terra e parentela e seguir a Noemi. Agora, sua última benevolência, elogiada por Boaz, foi não ter ido após jovens, quer pobres, quer ricos. Rute não buscou uma solução por meios naturais e carnais. De fato, buscar jovens pobres ou risos era a coisa mais natural a se fazer por uma jovem viúva.
Se ela fosse atrás de jovens ricos, poderia até evidenciar um caráter ruim, caso tivesse buscando apenas tirar proveito de sua viuvez para enriquecer. Mas, buscar jovens pobres, seria algo totalmente aceitável para sua condição de jovem viúva. No entanto, Boaz a elogia por não ir atrás de jovens, pobres ou ricos.
Seguir o curso natural de nossas vidas não agradará o coração do Senhor. Precisamos abrir mão de nós mesmos, inclusive das coisas consideradas justas. Devemos nos colocar aos pés do Senhor e Ele dirá o que haveremos de fazer (Rt 3:4). Ele deseja que deixemos de lado tudo aquilo que é natural, mesmo que seja aprovado pelos irmãos e pela sociedade, mas que busquemos aquilo que é de fato a vontade do Pai. Essa é a característica da eira – é a busca da vontade do Senhor – “Ele te dirá o que deve fazer” (3:4b).
Nessa intimidade entre Rute e Boaz é que será iniciado o processo de união entre os dois. Isso vai começar por esse relacionamento aqui, a partir do qual Boaz poderá começar a tomar as providências para formalizar essa união.
Tudo começa nesse nível de relacionamento, quando nos dispomos a ir até a eira. Ali o Senhor encontra o monte de cevada e pode descansar. A partir dali Ele começou a nos mostrar quem nós somos. Quando ali nos posicionamos com intrepidez e fé, reivindicado aquilo que de fato não temos direito em nós mesmos, mas passamos a ter por estarmos nEle, o Senhor começa esse processo de nos fazer Sua noiva.
“O reino dos céus é também semelhante a um que negocia e procura boas pérolas; e, tendo achado uma pérola de grande valor, vende tudo o que possui e a compra” (Mt 13:45-46).
Aquele que negocia as pérolas é o Senhor Jesus. Ele busca boas pérolas, que são várias. Quando o Senhor encontrou Sua igreja, vendeu tudo que tinha, abriu mão de tudo, se humilhou até a morte e morte de cruz (Fp 2:5-8). Ele viu em nós essa pérola. É exatamente isso que aconteceu ali com Rute e Boaz.
Uma mulher virtuosa
“Agora, pois, minha filha, não tenhas receio; tudo quanto disseste eu te farei, pois toda a cidade do meu povo sabe que és mulher virtuosa” (Rt 3:11).
Boaz descreve Rute como “mulher virtuosa”. Isso nos faz lembrar de Provérbios 31 e 12:4.
Ali descobrimos que a essência da mulher virtuosa é que ela “teme ao Senhor” e, por isso, ela desenvolveu todas aquelas lindas características ali descritas.
Mas um fato interessante é que, no texto original, a palavra usada para descrever Rute como “mulher virtuosa” é a mesma usada para descrever Boaz em Rute 2, verso 1, quando ele foi descrito como o senhor de “muitos bens”. A palavra hebraica usada nas duas instâncias é chayil. Ou seja, ambos compartilham da mesma natureza – ambos são virtuosos e ambos senhores de muitos bens.
Boaz é chayil, e Rute é chayil. É isso que acontece com Cristo e a Igreja – a Igreja tem a mesma essência de Cristo. Assim como Eva foi tirada do lado de Adão, vemos aqui que Rute e Boaz tem a mesma característica.