T. Austin-Sparks
“Então, Elias, o tesbita, dos moradores de Gileade, disse a Acabe: Tão certo como vive o SENHOR, Deus de Israel, perante cuja face estou, nem orvalho nem chuva haverá nestes anos, segundo a minha palavra” (1 Rs 17:1).
Leitura: 1 Reis 17.
O que temos em vista em primeiro lugar, é claro, é o servo do Senhor. Mais uma vez, vemos Deus reagindo ao estado das coisas em meio ao Seu povo, levantando-Se em descontentamento Divino, e colocando Sua mão sobre um instrumento para restauração.
Então, Elias surge diante de nós representando tal instrumento, e por meio dos tratos de Deus com ele, podemos ver os caminhos e princípios pelos quais um servo do Senhor é tornado em um servo eficaz em relação ao propósito de Deus.
A Escolha Soberana de Deus
O primeiro ponto relacionado a qualquer instrumento desse tipo é a soberania de Deus. Não há qualquer explicação natural e adequada para a escolha e nomeação que Deus faz de Seus servos. Podem haver coisas no instrumento escolhido que serão aproveitadas, quando forem totalmente santificadas e colocadas sob o governo do Espírito de Deus, mas, quando tudo for levado em consideração, precisamos reconhecer que a escolha de Deus de Seus instrumentos será sempre soberana, e não acontece porque há qualquer coisa neles que a justifique. Deus age soberanamente na escolha e nomeação para o Seu propósito. Mas, embora isso possa ser verdade, e embora Deus possa ir além da escolha e possa endossar esse instrumento com poder espiritual, ainda assim, o instrumento deve ser controlado e disciplinado continuamente pelas Suas mãos. Caso contrário, o servo do Senhor será encontrado seguindo a direção da sua própria alma, seus próprios julgamentos, e sendo influenciado por seus próprios sentimentos. A intenção e o motivo podem ser muito bons, muito piedosos, mas isso não dispensa a necessidade de que esse instrumento esteja continuamente sob a mão de Deus para governo e disciplina.
Isso é o que fica claro diante de nós logo no início, no caso de Elias. Não há dúvida sobre a escolha soberana de Deus, e não há dúvida quanto a Deus ter endossado Elias com poder Divino. Não obstante, nós o vemos a cada passo dado sob a mão de Deus, e todos eles são passos disciplinadores para o próprio homem. Deus está lidando com Seu servo o tempo todo, e trazendo-o ao longo de todo o caminho sob Sua mão, para que ele nunca se torne alguém em si mesmo, mas que tenha tudo no Senhor e somente Nele. Cometeremos um grande erro se pensarmos que é suficiente ter o pensamento Divino em relação ao Seu propósito, isto é, ter o conhecimento do que Deus deseja fazer. Isso não é suficiente. Ter o conhecimento do pensamento de Deus não é suficiente. Deve haver um trato conosco em relação a esse pensamento Divino, e esse trato é geralmente realizado de uma maneira além do nosso entendimento.
Se Deus estivesse lidando conosco como pecadores, isto é, se Ele estivesse lidando conosco por causa de certos pecados pessoais e falhas, poderíamos entender isso claramente; mas quando Ele está lidando conosco em relação ao Seu propósito, como Seus servos, Seu relacionamento conosco vai muito além do nosso entendimento. Somos levados à uma esfera onde não compreendemos o que o Senhor está fazendo conosco, e por que Ele nos conduz a certos caminhos. Estamos além da nossa profundidade, completamente desconcertados, e somos obrigados – isto é, se formos em frente com Deus – a acreditar que Deus sabe o que está fazendo, e precisamos apenas nos mover com Ele de acordo com qualquer luz que recebermos, acreditando que esses tratos conosco, tão além do nosso entendimento, estão de alguma forma relacionados àquele propósito para o qual fomos chamados, e que a explicação está um pouco adiante, e nós a encontraremos quando chegarmos lá. Deus não dá explicações quando Ele dá um passo adiante conosco. Deus nunca vem a um servo Dele e diz: ‘Agora vou conduzir você através de uma certa experiência que será desse caráter particular, e a razão para isso é essa e aquela.’ Sem qualquer informação do Senhor, nos encontramos em uma situação difícil, o que nos confunde, nos coloca além da capacidade de explicar tal experiência, e Deus nos conduz por meio disso tudo sem qualquer explicação, até que estejamos livres e o propósito para o qual a experiência foi dada seja alcançado. Então nós temos a explicação.
O ponto é que, mesmo um instrumento, soberanamente tomado por Deus em relação ao Seu propósito, mesmo conhecendo o Seu principal pensamento quanto a esse propósito, ainda precisa ser mantido a todo momento, em cada passo, sob a mão de Deus, para ser disciplinado em relação a esse pensamento, para ser governado inteiramente por Ele.
Elias, que foi um grande homem, notável na história dos movimentos de Deus, foi levado àquele ponto exato onde, embora soubesse que Deus o havia tomado, e soubesse qual era a Sua intenção, não podia, por meio de sua própria iniciativa e energia, cumprir livremente sua missão. Ele não podia se mover mais do que um passo de cada vez, e mesmo assim, cada passo deveria ser definitivamente governado por Deus. Ele só podia dar aquele passo sob a direção Divina. Vemos isso no capítulo inicial. Ele tinha que dar apenas um passo, e depois o seguinte, e isso tudo sob a direção Divina, nada além disso. O Senhor não deixa os seus maiores servos soltos com uma idéia. Ele não liberta Seus instrumentos mais poderosamente usados para tomar um curso livre, mesmo que eles saibam o que Deus busca.
Autoridade Divina
Algumas das razões para isso são claras. O ministério de Elias era baseado na autoridade Divina. Havia poderes operando que eram mais do que humanos. O caso com Israel não foi simplesmente um declínio espiritual. Não era apenas o fato de que as pessoas perderam um pouco da vida espiritual e estavam em um nível mais baixo do que deveriam, de modo que precisavam ter um aprofundamento dessa vida espiritual. Essa não era situação.
Baal tinha um forte poder em Israel, e os poderes malignos, as forças das trevas, estavam de volta nesse estado de coisas, e a situação exigia mais do que apenas ajuda espiritual a Israel. Algo mais do que um ministério de exortação e de alimento espiritual, algo mais do que uma convenção para o aprofundamento da vida espiritual era necessário. Um ministério de autoridade Divina era necessário para lidar com uma situação espiritual naquela condição em que as pessoas se encontravam. Havia forças operando, mais poderosas do que meras faltas e falhas humanas. O poderoso poder de Satanás estava ali representado pelo estado de Israel. Elias, portanto, precisava cumprir um ministério de autoridade Divina, e a sua primeira declaração pública indica que esse foi o seu ministério:
“Tão certo como vive o SENHOR, Deus de Israel, perante cuja face estou, nem orvalho nem chuva haverá nestes anos, segundo a minha palavra” (1Rs 17:1).
Existe uma posição tomada, e existe uma autoridade em razão dela. Tiago diz que, por meio da oração de Elias, os céus foram cerrados. Isso foi além da situação meramente humana e terrena. Então, novamente, por meio de sua oração, os céus foram abertos. Isso é autoridade no céu.
Preparação Secreta
Esse ministério de autoridade nasceu por meio de uma preparação secreta antes de ser expresso publicamente. O apóstolo Tiago nos diz, definitivamente, que “Elias era homem semelhante a nós, sujeito aos mesmos sentimentos, e orou, com instância (não temos menção disso no registro histórico no livro dos Reis), para que não chovesse sobre a terra, e, por três anos e seis meses, não choveu…“.
Havia uma história secreta com Deus na vida de Elias. Ele surgiu em seu ministério público com um anúncio abrupto. Ele simplesmente se posicionou na plataforma do universo, por assim dizer, e fez sua declaração. Mas isso não é tudo. Havia uma história secreta com Deus por trás disso. Todo esse ministério da autoridade Divina tem seu começo escondido dos olhos do público, e tem suas raízes em uma história secreta com Deus.
Esse tipo de ministério, nascido dessa história secreta com Deus, precisa de um governo muito especial de Deus para preservar sua segurança e para protegê-lo de todas as forças que podem destruí-lo. É por isso que Elias, tendo tal ministério, precisava ser governado por Deus em cada passo. Não deveria haver generalização de movimento no caso dele, mas Deus deveria ditar cada passo, em movimentos específicos. Então, Deus preserva essa autoridade à medida que Ele a produz, por meio de uma vida oculta. Tal vida e tal ministério não devem ser expostos, senão serão destruídos.
Continua no próximo post.
Primeiramente publicado na revista “Uma Testemunha e Um Testemunho”, em Set-Out 1938, Vol.16-5. Veja o artigo original em inglês em https://www.austin-sparks.net/english/000494.html