Contemplando…

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T. Austin-Sparks (1888-1971)

“Diante de mim via sempre o Senhor…” (Atos 2:25).

De acordo com a o texto acima, citado por Davi, é impressionante e instrutivo observar quão grande influência o ver ou contemplar tem na vida de uma pessoa.

Podemos verdadeiramente dizer que uma grande parte do que somos e, portanto, do efeito que temos neste mundo, é o resultado da nossa visão. Há muita verdade no ditado que diz que nós nos tornamos como aquilo em que nossos olhos estão especialmente focados.

A Bíblia leva muito em conta este fato, e o transporta para todos os seus paralelos na vida espiritual. Na verdade, na bíblia vemos que todos os estágios e fases da vida cristã têm a sua base na visão.

O início da vida cristã é o resultado de contemplar “o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo 1:29).

Havia vários objetos de sacrifício no grande sistema tipológico de Israel, mas o cordeiro era o centro de tudo. A história de Israel como nação começou com o cordeiro pascal, que era sempre lembrado pelo povo nas celebrações anuais da Páscoa. Olhavam para o cordeiro suportando o seu pecado e julgamento, apesar de em si mesmo ser “sem mancha ou defeito”, e sabiam que era o cordeiro que Deus apontou e proveu para que contemplassem.

O Novo Testamento traz o Cordeiro de Deus em vista e também o apelo para  que o contemplemos. Essa palavra significa mais do que “dar uma olhada”, “olhar de relance para Ele”. Significa “fixar seu olhar sobre ele”. É o olhar de necessidade, busca, desespero.

“Olhai para mim, e sereis salvos, vós, todos os limites da terra” (Is 45:22).

De acordo com a Bíblia, toda a nossa transformação progressiva está sobre essa mesma base. “Contemplando… somos transformados… na sua própria imagem” (2Co 3:18).

Não é um esforço para formar uma imagem mental de Jesus. Nos escritos apostólicos, Ele nos é apresentado a partir de vários pontos de vista vitais, por Aquele que O conhece melhor e mais completamente.

Em “Romanos”, por exemplo, Ele é amplamente apresentado como a justiça essencial de Deus, provida onde nenhum outro foi encontrado, sem o qual não há esperança para o homem ou para a criação.

Esta não é uma introdução aos livros do Novo Testamento, mas é um apontar para a pessoa de Jesus. Assim, à medida que somos encontrados olhando para Ele, e não para os autores dos escritos, seremos influenciados em direção à Sua semelhança.

O que é verdade, no princípio e no progresso da vida cristã, também o é em relação à sua consumação.

“Amados, agora, somos filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que haveremos de ser. Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque haveremos de vê-lo como ele é” (1Jo 3:2).

Outros textos da Palavra mostram que esse “contemplar” final terá um efeito na consumação, estabelecendo os toques finais na obra de “ser conformado à Sua imagem”. Assim, do início ao fim, a nossa salvação, transformação e glorificação são relacionadas de maneira vital com os nossos olhos, com a nossa visão espiritual. “Os puros de coração verão a Deus” (Mt 5:8).

Mas, quando me propus a escrever estas linhas, tinha outras coisas em mente também. Nossos olhos são muito confrontados com condições que são contrárias a Cristo, e isso constitui um campo de batalha para nós.

A Bíblia contém muitos exemplos dos resultados deploráveis do uso errado dos olhos. Pense em Eva, em Davi, nos dez espias em Cades-Barnéia, em Sansão (que viu uma mulher, e ela se tornou sua ruína espiritual, depois, eventualmente, perdeu seus olhos físicos), e assim por diante.

Não é verdade que muito do que nos lamentamos no cristianismo evangélico ocorre devido a esse uso errado dos olhos? Nossas livrarias religiosas estão equipadas com os frutos amargos de tempo e energia gastos na busca e exposição das fraquezas, falhas e tantas coisas contrárias àquilo que tem verdadeiro valor. Isso pode se tornar uma predisposição, uma obsessão, uma mania e uma verdadeira ameaça.

Nós olhamos para os homens, para as pessoas, olhamos para os ministérios, para a obra cristã, e em tudo destacamos os aspectos humanos e falhos. Esse se torna o nosso foco, e o resultado é que aquilo que é realmente valioso acaba sendo eclipsado por aquilo que se tornou tudo para nós.

Nada escapou desse uso enferrujado dos olhos, até aquilo que vem de Deus. Nós já vimos servos grandemente usados por Deus terem o seu ministério cortado, apenas por causa do foco sobre um desvio, em algum ponto comparativamente pequeno. Ninguém teria mais zelo pela verdade, toda a verdade e nada além da verdade, do que nós, mas também somos igualmente zelosos para que o padrão de julgamento não seja a tradição, ou sistemas rígidos dos homens, mas sim, a medida de Cristo.

Cristo é o critério, do início ao fim, e não os julgamentos dos homens. Posso ver o Senhor? Estou realmente olhando para Ele? Se assim for, esse deve ser o meu ponto focal. Se Jesus de fato existe, ainda existe esperança, e devo entregar tudo a Ele.

“Diante de mim via sempre o Senhor…”

Que isso possa ser verdade a nosso respeito!

Extraído do texto homônimo de T.Austin-Sparks (“Beholding”).

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