“Portões de Pérola” é uma releitura do artigo “Gates of Pearl”, de T. Austin-Sparks, disponível para leitura no site www.austin-sparks.net. É importante salientar que não se trata de uma tradução do texto original, mas da nossa compreensão daquilo que o autor escreveu, podendo conter divergências em relação ao seu entendimento.
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“As doze portas são doze pérolas, e cada uma dessas portas, de uma só pérola… As nações andarão mediante a sua luz, e os reis da terra lhe trazem a sua glória” (Apocalipse 21:21; 24).
“Então, me mostrou o rio da água da vida, brilhante como cristal, que sai do trono de Deus e do Cordeiro. No meio da sua praça, de uma e outra margem do rio, está a árvore da vida, que produz doze frutos, dando o seu fruto de mês em mês, e as folhas da árvore são para a cura dos povos” (Apocalipse 22:1,2).
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Essas meditações são baseadas na consideração da cidade santa – a Nova Jerusalém que desce do céu da parte de Deus (Ap 21:2) – como um tipo da igreja glorificada. Assim, vamos considerar alguns princípios espirituais que podem ser vislumbrados especificamente nas suas portas, conforme descrito por João em Apocalipse. Não podemos esquecer que, nessa dispensação, o Espírito Santo estabelece e edifica a Igreja sobre esses princípios fundamentais.
As portas da cidade
“As nações andarão mediante a sua luz, e os reis da terra lhe trazem a sua glória. As suas portas nunca jamais se fecharão de dia, porque, nela, não haverá noite. E lhe trarão a glória e a honra das nações” (Ap 21:24-26).
Vale lembrar que as características simbólicas dessa cidade são princípios espirituais a serem estabelecidos na Igreja e eles serão vistos, em seu pleno significado, no futuro, na glória.
Na descrição de João (vs 9-27) temos portas, pérolas, nações e reis. Sabemos que as entradas e saídas de uma cidade são realizadas através de suas portas, que são a ligação entre as nações e a cidade.
Pelo restante do relato sabemos que a cidade é uma fonte de vida e saúde para as nações, então podemos considerar que essas portas possibilitam o acesso à um ministério visível de vida. Certamente, essa é uma figura do grande ministério que a igreja é chamada a cumprir.
O povo de Deus tem uma vocação eterna: ser um caminho ou um meio, um vaso, para derramar vida para as nações.
Esse povo é tornado num vaso formado e preparado para a bênção das nações, e essas nações, em retribuição, trazem à cidade suas riquezas. Foi por meio da igreja que eles puderam receber o bem da vida, da graça e da plenitude.
Quando os reis das nações trazem sua glória, seus tributos e suas riquezas à cidade é como um reconhecimento, é como se, com efeito, afirmassem: “Obtivemos isso por sua causa. Podemos reconhecer isso e pagamos um tributo de gratidão, colocamos nossa glória sobre a graça de Deus, que foi tão grandemente manifestada através de vocês”.
Assim, como disse o apóstolo, a igreja se torna, portanto, no “louvor da glória da Sua graça” (Ef 1:6). “A Ele a glória (das nações) na igreja e em Cristo Jesus em todas as gerações para todo o sempre” (Ef 3:21). Quanto será devido naquele dia ao ministério do Senhor por meio da Sua Igreja!
O lugar de governo
Como sabemos, no Antigo Testamento, as portas de qualquer cidade eram o lugar de governo. Era ali que decisões governamentais eram realizadas, as regras eram conhecidas. Ali tudo deveria ser alinhado aos propósitos daqueles que estavam estabelecidos como autoridade.
Por isso existe um fator governamental atrelado a essas portas de pérola.
O Fator Governante: comunhão com Cristo nos Seus sofrimentos
A sabedoria Divina escolheu um elemento tão especial – a pérola – para ser o símbolo da porta que dá acesso à bênção e a glória das nações.
Esse símbolo implica que o caminho para produzir esses frutos através de nossas vidas vai derivar de nossa comunhão com os sofrimentos do nosso Senhor.
A pérola é uma personificação da angústia, do sofrimento, do sangue e das lágrimas. Tudo isso está entretecido no processo de formação da tão valiosa pérola! Essa jóia é produzida como fruto da angústia daquele organismo, quando entrega sua própria vida para gerar essa maravilhosa formação.
O Senhor escolheu esse símbolo tão especial para o Seu governo, em Sua soberania, e a pérola também personifica a própria essência do ministério. Governo com Deus não é algo oficial, autocrático, despótico, como acontece nesse mundo.
Governo com Deus é visto quando, na minha mais profunda necessidade e aflição, me torno numa bênção para outros. Essa é a essência da manifestação do governo de Deus na minha vida.
‘Na profundeza da minha aflição não encontro ajuda em ninguém mais, mas Deus me concede ajuda através de você’. Quando você serve alguém assim, coopera com ele e Deus te estabelece numa posição de autoridade. Essa é uma expressão do governo com Deus.
Esse é o princípio do governo do Senhor Jesus. Ele não sustenta Seu lugar de autoridade por meio de uma posição despótica, oficial. Não! O Senhor sustenta Seu lugar como Senhor devido à Sua Cruz e Sua angústia, por ser plenamente capaz de suprir cada uma de nossas necessidades, quando elas não podem ser supridas em nenhum outro meio fora dEle.
Isso torna o SENHOR JESUS NO VERDADEIRO SENHOR, e por essa razão nos curvamos diante dEle.
No livro de Apocalipse vemos que tudo deriva desse Cordeiro que foi morto. Ele está no Trono, Ele está em posição de supremo poder, não porque Deus O colocou ali oficialmente, mas porque através desse Cordeiro toda a nossa necessidade é suprida.
Todos devem se curvar diante do Cordeiro, devido ao Seu grandioso ministério, que Ele proveu a nós por meio de Seu sofrimento.
Esse é o princípio Divino de ministério. O único caminho para o fluir da vida, da cura, da plenitude espiritual é o caminho do sofrimento e da agonia. É por meio da comunhão com os sofrimentos do Senhor que a igreja vai cumprir plena e verdadeiramente o seu ministério.
Então, aquilo que é verdade para a igreja como um todo, também é verdadeiro para cada parte dela. Nesse organismo, se “um membro sofre, todos os membros sofrem com ele” (1Co 12:26). De alguma forma estranha e misteriosa isso é uma verdade, cada membro também é batizado nos sofrimentos de Cristo.
O Caminho do Senhor
Surge então a questão crucial: Se nossas vidas estão destinadas a se tornarem portas para a plenitude de Deus, para o fluir da vida e da cura, então devemos estar em unidade com esse princípio da pérola. Experimentaremos sangue, lágrimas e sofrimentos.
Tudo isso se resume nas palavras do Senhor: “Porquanto, quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a vida por minha causa achá-la-á.” (Mt 16:25). “Devemos dar nossa vida pelos irmãos” (1Jo 3:16). Devemos estar prontos para entregar nossas almas.
“Vida” e “alma” são palavras intercambiáveis nesses textos, derivadas da mesma palavra original no grego, “psuche“. Vamos usar a palavra “almas” porque é muito comum as pessoas pensarem, quando falamos de entregar nossa vida, que isso equivale a se tornar num mártir, ser espancado até a morte ou ser queimado vivo.
Não, dar sua vida implica numa decisão diária, que permanece ao longo de nossa vida, quando deixamos de lado nossos interesses pessoais, ambições, sofrendo dos ardentes e terríveis desapontamentos desta vida. Isso significa abandonar qualquer coisa que poderia se levantar em nossas considerações relacionadas ao nosso relacionamento com o Senhor, sobre o que poderia ser se não estivéssemos seguindo o Cordeiro plenamente, aonde quer que Ele vai [Ap 14:4]. Seguir o Cordeiro é trilhar o caminho do sacrifício. Como escapar disso, se vamos seguindo o Cordeiro? Vamos experimentar rejeição, sacrifício, disciplina.
Aqueles que estarão naquela posição figurada descrita na Nova Jerusalém – que não é algo místico, mas bem real e claro diante de nós – são aqueles que experimentação de disciplina debaixo da mão de Deus de uma forma especial e muito pessoal.
Se você for chamado a caminhar mais próximo do Senhor, não pense que isso significa que tudo serão bênçãos e gratificações, de acordo com seus desejos. De jeito nenhum! O Senhor vai lidar com você mais severamente do que com qualquer outro.
O Senhor lida severamente com alguns de nós exatamente porque não somos pessoas comuns. Não somos pessoas comuns! A igreja não é comum. Existe muita coisa atrelada à Igreja, e o Senhor precisa ser muito exigente. Devemos ser conduzidos à sofrimentos que outras pessoas desconhecem, a fim de conhecer verdadeiramente esse ministério, e para que a nossa grande e eterna vocação possa ser finalmente cumprida: fluir do Senhor como o rio de águas vivas, e as nações trazendo a glória para Ele, através da igreja. Esse é o caminho da pérola.
Uma advertência final
Se você está tentando evitar perseguições e todo esse tipo de coisa, pode estar sacrificando seu próprio ministério e utilidade.
Você pode estar privando a si mesmo e privando o Senhor de muita glória, simplesmente por estar escondendo sua luz, uma vez que deixá-la brilhar iria te trazer reprovação, sofrimento, perseguição, ostracismo, etc. Mas, atenção! Não vale a pena retroceder.
Digo a você, caro amigo, que a mão do Senhor pode estar conduzindo você por meio de caminhos estranhos… Ele dá, e então parece tomar de volta aquilo que te deu. Ele, por um milagre te dá Isaque, e então diz: “me ofereça esse Isaque”. Caminhos estranhos, aparentes contradições, caminhos misteriosos…
Quanto sofrimento, perplexidade, mas quanta glória! Esse é o caminho de um ministério incomum e nada superficial!
Reis trarão sua glória à cidade, eles obtiveram desse ministério coisas valiosas, e finalmente dirão: “Foi através de você, por você estar preparado para seguir o caminho mais difícil, por estar preparado para conhecer o sofrimento do Senhor; FOI POR MEIO DOS SEUS SOFRIMENTOS NA GRAÇA DE DEUS que me tornei no que sou”. Reis trarão seu tributo, e nações receberão vida.
Vemos esse princípio com tanta clareza, tudo se resume nisso: o caminho do alargamento e da glória é o caminho do sofrimento.
Apesar desse caminho nos parecer inicialmente como um corte, um impedimento, uma forma de estreitamento e privação, às vezes representando até portas fechadas… Deus tem Sua maneira maravilhosa de trazer alargamento espiritual, ainda que seja exatamente por esse caminho.
Pode parecer que isso é algo pequeno se seu ponto de vista, se seu foco partir do homem. Tudo vai depender se nosso ponto de vista é a partir da terra ou sob a ótica do céu.
O conceito de grandeza do céu é muito diferentes do conceito da terra.
Tenha certeza que se você está experimentando da comunhão dos sofrimentos do Senhor, irá conhecer da comunhão desse grande ministério de vida, plenitude, saúde e glória. As duas coisas estão diretamente atreladas!