O artigo “De glória em glória” é uma tradução do capítulo 7 do livro “Face to Face“, de Jessie Penn-Lewis.
***
Jessie Penn-Lewis (1851-1927)
“Então, disse o SENHOR a Moisés: Sobe a mim, ao monte… Tendo Moisés subido, uma nuvem cobriu o monte. E a glória do SENHOR pousou sobre o monte Sinai” (Êxodo 24:12, 15-16).
Leia o post anterior.
O próprio Jeová trouxe Israel para fora do Egito, manifestando Sua presença “de dia, por uma coluna de nuvem e, de noite, por uma coluna de fogo” (Ne 9:12). Eles foram conduzidos de um estágio após outro pelo deserto, e agora, no terceiro mês depois de terem deixado o Egito, eles chegaram ao Sinai, acampando ali diante do monte.
Aqui Deus se propôs a dar a Sua lei para Seu povo redimido, e a chamar Seu servo fiel para uma comunhão mais próxima e íntima com Ele.
Nós nos lembramos que, quando Moisés encontrou com Deus no Monte Horebe, ele escondeu sua face com medo. Mas, desde então, ele tem sido preparado para conhece-Lo de forma mais completa, por meio de sua caminhada de obediência e pela sua completa dependência do Senhor. Ele seguiu de “força em força”; e nós vimos o homem temeroso e tímido ser transformado em um ousado, corajoso e fiel servo de Deus, que manteve comunhão diária com o Senhor. Assim, é essa fé e obediência ao conhecimento da vontade de Deus no presente, que nos prepara para a mais plena comunhão que tanto ansiamos por conhecer.
Depois do dia em que Deus apareceu a Moisés como uma chama no arbusto, não temos registro de nenhuma outra revelação de Si mesmo a ele pessoalmente, até que o Sinai é alcançado. Por meio de todo o conflito com o Faraó e as murmurações dos Israelitas na jornada ao Sinai, o relacionamento entre Deus e seu servo é expresso por “o Senhor falou a Moisés”.
Mas, quando o Monte Sinai é alcançado, lemos que “Subiu Moisés a Deus, e do monte o SENHOR o chamou” (Ex 19:3). Moisés provavelmente buscou o Senhor, manifestado no pilar de nuvem, pelo propósito de conhecer Sua vontade sobre o povo, que agora estava reunido no Sinai. A partir desse ponto, podemos ver o servo fiel sendo conduzido, passo a passo, para uma mais íntima comunhão com Deus, até ser admitido na glória e fogo devorador no topo da montanha, e então, saindo novamente para andar entre os homens com a luz do céu sobre sua face, e para ser conhecido como o homem mais manso da terra.
Quando o senhor o chamou inicialmente no Sinai, era para envia-lo de volta a Israel com uma mensagem breve, incorporando as condições primordiais sobre as quais Deus iria lidar com eles como Seu povo.
Moisés retorna ao Senhor com a resposta de Israel: “Tudo o que o SENHOR falou faremos” [Ex 19:8]. Com isso, ele é instruído para prepará-los para o terceiro dia, quando Jeová iria descer do Monte Sinai e falar com Moisés diante do povo para que o ouvissem.
Depois de solene preparação, no terceiro dia, Moisés levou adiante o povo para encontrar com Deus e, quando eles estavam no pé da montanha, o Senhor desceu em fogo e todo o monte tremia grandemente. Quando o som da trombeta foi ficando mais e mais alto, Moisés falou e Deus o respondeu por uma voz, chamando-o para o topo do monte.
No caminho para cima, Moisés foi enviado de volta para advertir solenemente Israel a não tentar subir e olhar, porque, se isso acontecesse, eles pereceriam. Mais uma vez ele sobe a montanha, até que alcançar as densas trevas no seu topo. Tão terrível era essa visão, a ponto de Moisés dizer: “Sinto-me aterrado e trêmulo!” (Hb 12:21).
Será que esse era o mesmo Deus que ouviu tão amorosamente e graciosamente aos temores de Moisés em Horebe? Como ele poderia ter falado com Deus tão livremente?
Misericordiosamente o Senhor se velou a nós, em nossos primeiros dias de caminhada, e nos conduziu à medida que éramos capazes de suportar, até que pudéssemos tolerar algum conhecimento de Sua santidade e aprender, com o divinos temor e admiração, que estamos diante de Alguém que é fogo consumidor.
Muitos de nós já estivemos em Horebe, onde nos encontramos com o Senhor, e Ele foi revelado a nós como a chama de fogo que habita dentro de nós, assim como Ele fez com aquele pequeno arbusto. Andamos com Ele, em obediência e fé, enquanto seguimos em frente com a mensagem de libertação das almas que se encontram em grilhões. Aprendemos a confiar nele em horas de perigo. Cantamos o cântico da vitória e, no teste que se seguiu, provamos o poder da “árvore” que torna as águas amargas da nossa própria vida em doces águas vivas que vem do céu.
Aprendemos o poder das mãos erguidas à Deus no conflito com Amaleque e temos servido a Deus com fidelidade, à medida que Ele tem nos conduzido de graça em graça. Mas, como desejamos experimentar aquela comunhão “face a face” com Ele no monte, e como estamos famintos por esse chamado “Venha comigo, e olhe do topo”!
Existe um tempo conosco, assim como foi com Moisés, quando Deus nos é revelado na Sua terrível majestade do Sinai. Não temos que vacilar como fez Israel naquela ocasião, mas que possamos conhece-Lo em Sua justiça, e ter alguma concepção da excessiva pecaminosidade do nosso pecado e da santidade do Deus que nos redimiu.
Os mandamentos de Jeová não foram conhecidos de Israel no Egito. Eles tiveram que ser conduzidos para fora de lá, sem nenhum conhecimento Daquele que os estava redimindo. Eles saíram do Egito com todos os seus hábitos egípcios arraigados, e com ideias indefinidas de certo e errado. Deus começou a revelar a eles algo de Si mesmo e da vida de justiça demandada para aqueles que levariam o Seu nome, após eles terem saído das cadeias da escravidão e separados da velha vida do Egito. Aquela era uma revelação tanto para Moisés como para o povo.
O povo tremeu e permaneceu distante, mas “Moisés, porém, se chegou à nuvem escura onde Deus estava” (Ex 20:21). Está escrito que nós não temos chegado ao Monte Sinai, para a “escuridão, e às trevas, e à tempestade”[Hb 12:18], mas ao Monte Sião, e a Jesus, o Mediador, e o sangue da aspersão (Hebreus 12:18-24). A cada estágio de nossa vida espiritual temos mais ousadia para entrar no Santo dos Santos pelo Seu sangue, e podemos nos aproximar em plena certeza da fé, tendo nossos corações purificados de má consciência; mas antes que aprendamos, em nossa experiência, a conhecer a Deus “face a face, podemos encontra-Lo se aproximando de nós em trevas espessas. Essa não é o mesmo tipo de trevas que acometeu os egípcios, mas um tipo de trevas da qual Ele fala e julga nossas vidas, como O Justo, até que cada detalhe dela tenha sido ajustado e colocado em acordo com Seu propósito.
Moisés retornou a Israel com as ordenanças de Deus e, depois deles terem entrado na aliança e o povo ter sido aspergido com o sangue, foi permitido a Arão, seus dois filhos e setenta representantes de Israel subir com Moisés até alguma parte do monte para ver o Deus de Israel. “E viram o Deus de Israel, sob cujos pés havia uma como pavimentação de pedra de safira, que se parecia com o céu na sua claridade… porém eles viram a Deus, e comeram, e beberam” (Ex 24:10,11). A “claridade” é um nítido contraste com as trevas das quais Deus havia dado Sua lei a Moisés no dia anterior. Será que esse contraste não sugere o efeito do sangue derramado, o qual Moisés aspergiu no povo e no livro da aliança ao pé do monte que os anciãos subiram? Isso ao menos é verdade no evangelho da graça. Deus deve julgar a vida de Seus filhos e, em Seus tratos, Ele pode conduzi-los à muitas trevas – mas, por meio do sangue de Jesus, aplicado pelo Espírito Santo, as trevas passam, e eles emergem em clara luz dos céus, sem nada entre eles e o céu.
Nos é dito que os anciãos de Israel viram Deus “de longe”. Essa visão de Deus não é a comunhão “face a face” que Moisés conheceu. “Andar na luz, como [Deus] está na luz”(1 João 1:7) é algo verdadeiramente abençoado, mas podemos ser trazidos ainda mais perto, até mesmo para dentro Dele, que é a própria luz – assim como desse grupo, tão privilegiado em ver Deus, Moisés foi chamado para mais adiante, para um conhecimento pessoal do Santíssimo. “Sobe a mim, ao monte, e fica lá”, disse Jeová (Êxodo 24:12).
Moisés prontamente obedece ao chamado. Ele entra sozinho na nuvem que está no cume do monte, não mais trevas espessas, mas glória, a “a glória do SENHOR pousou sobre o monte Sinai”[Ex 24:16]. Para os espectadores, era um “fogo devorador”, e Moisés esteve perto ou dentro desse fogo devorador por quarenta dias e quarenta noites.
Seis dias ele esperou em silêncio para que Deus lhe falasse. Então, Deus revelou a ele o padrão do tabernáculo no qual Ele iria habitar no meio de Seu povo.
Quão maravilhosamente verdadeira é essa história na nossa experiência! Nas trevas com Deus aprendemos Seus julgamentos; e na Sua glória, “dentro do véu”, é onde nos é mostrado Seu padrão para nossas vidas. É depois das trevas, dos julgamentos e do sangue aspergido que podemos ir, pelo menos parte do caminho, para o alto do monte, e então ter a visão de Deus, onde Sua luz é derramada em nossas vidas. Então, comemos e bebemos como que em Sua presença, tendo comunhão uns com os outros, com o sangue de Jesus nos purificando de todo o pecado. Mas, sozinhos com Ele, somos chamados a entra na nuvem e a habitar no fogo devorador – sozinhos, e apenas sozinhos, entramos no lugar secreto do Altíssimo e O conhecemos “face a face”.
Seis dias de silêncio. Então, no sétimo dia, Deus falou com Seu servo. Isso nos lembra dos seis dias da criação, quando Deus disse, “haja…” e assim acontecia, e no sétimo dia Ele descansou das Suas obras.
Assim, a nuvem cobriu a montanha e Moisés por seis dias, e Deus esperou até que Seu servo fosse trazido em acordo com o “cicio manso e suave” no qual Deus revela a Si mesmo e a Sua vontade. Aqui, no silêncio, toda a memória do acampamento e sua vida atribulada se passou. Toda a atividade da criatura, na mente e pensamentos, estava em descanso. Todos os fardos relacionados com as necessidades de Israel e as demandas dos amigos estavam esquecidos.
No sétimo dia, número tipificando plenitude, Deus estava satisfeito. Seu canal de revelação ao Seu povo estava pronto. O padrão mostrado a Moisés no monte deveria ser dado da forma como foi recebido, por isso sua mente tinha sido clareada, acalmada e esvaziada de todas as outras coisas. Assim se provou: ele nada fez além de receber. Então ele voltou ao acampamento para entregar aos outros o modelo que “foi mostrado no monte” [Ex 25:40].
Da mesma forma, Deus precisa desses canais hoje. Almas que buscam conhece-Lo assim como Moisés, e que estejam desejosas de ser esvaziadas de todos os seus próprios pensamentos, desejando ser separadas com Ele, separadas até mesmo de responsabilidades delegadas por Ele, para que possam vislumbrar o modelo de edificação do Seu templo espiritual, e possam dizer com a certeza dada por Deus: “Assim diz o Senhor”.
Leia o próximo post aqui.
Jessie Penn-Lewis (1851-1927) nasceu no País de Gales, em uma família metodista calvinista. Sempre teve uma constituição física frágil, estando constantemente muito doente. Penn-Lewis foi muito impactada pelo ministério de Evan H. Hopkins, quando lhe foi apresentado o caminho da vitória por meio da Cruz de Cristo. Ela tinha um forte encargo com a mensagem da identificação do crente com o Senhor na Cruz, para manifestar o poder de Sua morte e ressurreição. Sua contribuição foi grande no sentido de reavivar entre os crentes a verdade da vida interior e da mensagem da Cruz. Assim como Madame Guyon, Fénelon e outros místicos cristãos, ela enfatiza fortemente em seus escritos a necessidade de uma vida interior de oração e contemplação do Senhor Jesus, e uma experiência subjetiva da Cruz.
Jessie Penn-Lewis era casada, mas não teve filhos. Apesar de enfrentar diversos períodos de severas enfermidades, ela ministrou sua mensagem em vários países como Índia, Canadá, Rússia e Egito, pregou na Convenção de Keswick, iniciou a publicação da revista The Overcomer (O Vencedor), e publicou livros e artigos sobre diversos assuntos.
Penn-Lewis foi contemporânea de G. Campbell Morgan, F. B. Meyer, A.B. Simpson e T. Austin-Sparks. Em 1934, Watchman Nee afirmou que “durante os últimos anos, quase todas as mensagens comentadas entre os crentes espirituais têm sido ensinamentos de Jessie Penn-Lewis”.
Para conhecer mais a respeito do encargo e mensagem de Jessie Penn-Lewis, é possível ler ainda hoje edições da Revista O Vencedor. Os livros “Guerra contra os Santos” e “A Cruz, o caminho para o reino” foram publicados no Brasil pela Editora dos Clássicos.