Esta é a primeira de três partes do artigo “Os impossíveis dos homens são possíveis para Deus”, que é uma tradução do capítulo 5 – “Impossible with Man, Possible with God“, do livro “Absolute Surrender” (Entrega Absoluta), de Andrew Murray.
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Andrew Murray (1828-1917)
“Mas ele respondeu: Os impossíveis dos homens são possíveis para Deus” (Lc 18:27).
Cristo disse ao jovem rico: “Vende tudo o que tens… vem e segue-me” [vs 22]. O jovem se foi muito triste. Cristo então se voltou para os seus discípulos e disse: “Quão dificilmente entrarão no reino de Deus os que têm riquezas!” [vs 24]. Os discípulos, conforme podemos ler logo a seguir, ficaram assombrados e perguntaram: “Sendo assim, quem pode ser salvo?” [vs 26], ao que Cristo lhes deu a abençoada resposta:
“Os impossíveis dos homens são possíveis para Deus”.
O texto contém duas verdades: que na religião é impossível ao homem tanto proporcionar a própria salvação, como é impossível seguir ao Senhor com uma vida santa. E então, o Senhor afirma o fato de que “os impossíveis dos homens são possíveis para Deus”.
Essas duas verdades marcam as duas grandes lições que o homem deve aprender na vida cristã. Leva muito tempo para aprender a primeira lição de que, na vida cristã, o homem não pode fazer coisa alguma. Muitas vezes o homem aprende isso, mas ainda não aprende a segunda lição de que o que é impossível para o homem, é possível para Deus. Abençoado o homem que aprende as duas lições! O aprendizado delas marca os estágios na vida Cristã.
Impossíveis dos Homens
O primeiro estágio é quando o homem está tentando fazer o seu melhor e falha, tenta fazer ainda melhor e falha de novo, então tenta muito mais e continua falhando. Isso é muito comum no aprendizado da lição de que é impossível para o homem servir a Deus e a Cristo. Pedro permaneceu três anos na escola de Cristo e não havia aprendido esse “é impossível”, até que negou seu Senhor, saiu e chorou amargamente. Então ele a aprendeu.
Olhe, por apenas um momento, para o homem que está aprendendo essa lição. Primeiro ele luta contra ela; então ele se submete, mas de forma relutante e desesperada. Finalmente, ele a aceita de boa vontade e nela se alegra. No início da vida Cristã, o novo convertido não tem concepção dessa verdade. Ele se converteu, tem a alegria do Senhor no seu coração, começa a correr a carreira e lutar o bom combate, certo que consegue vencer, porque é zeloso e honesto, e Deus o ajudará. Entretanto, de alguma maneira, ele logo falha onde não esperava, e o pecado leva a melhor sobre ele. Quando fica desapontado, pensa: “Não vigiei o suficiente, não fiz resoluções fortes como deveria”. E mais uma vez, faz seus votos, mais uma vez ora, e mais uma vez, falha. Então, pensa: “Será que não sou um homem regenerado? Será que não tenho a vida de Deus em mim?” Mas, pensa novamente: “Sim, tenho Cristo para me ajudar, posso viver a vida de santidade”.
Em um momento mais à frente, atinge outro estado mental. Ele começa a ver tal vida como algo impossível, mas não aceita isso. Existem multidões de Cristãos que chegam a esse ponto: “Não posso”; e então passam a pensar que Deus nunca esperou deles fazer o que não conseguem fazer. Se você disser a eles que Deus espera deles uma vida santa e irrepreensível, isso lhes soa como um mistério. Uma grande quantidade de Cristãos está vivendo uma vida pobre de derrota e pecado, ao invés de descanso e vitória, porque começaram a pensar: “Não consigo. É impossível”. Ainda que eles não compreendam isso plenamente, dão lugar ao desespero. Eles fariam o melhor possível, mas não tem esperança de ir muito longe.
Entretanto, Deus conduz Seus filhos a um terceiro estágio, quando o homem chega àquela conclusão: “É impossível”, em sua plena verdade, e ao mesmo tempo diz: “Preciso fazer isso, e irei fazê-lo – é impossível para o homem, e ainda assim irei fazê-lo”; quando a vontade renovada começa a exercitar todo o seu poder, e o intenso desejo e oração começam a clamar a Deus: “Deus, qual é o sentido disso? – como devo ser liberto do poder do pecado?”.
Este é o estado do homem regenerado de Romanos 7. Lá, você encontrará o homem Cristão tentando o seu melhor para viver uma vida santa. A lei de Deus foi revelada a ele, alcançando o mais profundo dos desejos do seu coração, e então, o homem ousa dizer:
“Me deleito na lei de Deus no meu homem interior. O desejo do bem está presente em mim. Meu coração ama a lei de Deus, e minha vontade escolheu essa lei”.
Será que pode um homem desses falhar, com seu coração cheio de deleite na lei de Deus e com sua vontade determinada a fazer o que é certo? Sim! É isso que Romanos 7 nos ensina. Algo mais é necessário. Não preciso apenas me deleitar na lei de Deus no meu homem interior e desejar o que Deus deseja, mas preciso da Divina Onipotência trabalhando em mim. É isso que o apóstolo Paulo ensina em Filipenses 2:13:
“Porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade”.
Perceba o contraste. Em Romanos 7, o homem regenerado diz: “O desejar está em mim, mas não o realizar. Desejo, mas não consigo realizar”. Mas, em Filipenses 2, temos um homem que foi conduzido mais adiante, um homem que compreende que, quando Deus trabalha na vontade renovada, Ele dará o poder para cumprir o que Ele deseja. Vamos receber isso como a primeira grande lição na vida espiritual: “É impossível para mim, meu Deus; que haja um fim da carne e todos os seus poderes, e um fim do ego. Que minha própria glória seja impotente!”.
Glória a Deus pelo ensino divino que nos deixa impotentes!
Quando você pensou na entrega absoluta a Deus, ainda não foi conduzido ao fim de você mesmo, e não percebeu que poderia verdadeiramente viver como um homem absolutamente rendido a Deus a cada momento do seu dia – em sua mesa, sua casa, seu trabalho, mesmo em meio às provas e tentações? Oro para que você aprenda essa lição agora. Se você sente que não consegue, está no caminho certo, desde que se deixe conduzir. Aceite essa posição e a sustente diante de Deus: “O desejo e deleite do meu coração, ó Deus, é a entrega absoluta, mas não consigo realiza-la. Está além de minha capacidade”.
Se entregue e aprenda que, quando estiver completamente impotente, Deus irá operar em você não somente o querer, mas também o realizar.
Andrew Murray (1828-1917) foi pastor, escritor e missionário sul-africano, educado na Universidade de Aberdeen, Escócia, e na Universidade de Utrecht, Holanda. Andrew Murray foi um dos líderes do avivalismo missionário na África do Sul. Durante os últimos 28 anos de sua vida, foi considerado o pai do Movimento Keswick na África do Sul. Ele foi muito influenciado pelos escritos de William Law, Madame Guyon, Jessie Penn-Lewis e T. Austin-Sparks. Seu ministério enfatizava a necessidade da habitação em Cristo. Ele nos deixou um precioso legado literário de aproximadamente 240 livros sobre vida cristã e vida devocional. Algumas de suas obras foram traduzidas e são publicadas na língua portuguesa: Permanecei em Cristo, Com Cristo na Escola de Oração, A Vida Interior, Escola da Obediência, Humildade, a Beleza da Santidade e O Espírito de Cristo.