Notas sobre o Livro de Números
“Disse o Senhor a Moisés e a Arão: Os filhos de Israel se acamparão junto ao seu estandarte, segundo as insígnias da casa de seus pais; ao redor, de frente para a tenda da congregação, se acamparão” (Nm 2:1).
No capítulo 1 temos a declaração da “genealogia” e no capítulo 2 o reconhecimento da “bandeira”.
Cada Israelita devia conhecer o seu posto e ocupá-lo – conhecer a sua bandeira e manter-se sob ela. Assim eles avançavam juntos, progrediam, trabalhavam e faziam a guerra. Cada um tinha a sua descendência e seu posto; e nenhuma delas dependia dos seus próprios pensamentos; tudo era disposto por Deus.
O que é a nossa “bandeira”? É Cristo. Este é o único estandarte de Deus deste bando guerreiro que se acampa no deserto deste mundo, para sustentar a luta contra as hostes do mal e batalhar as batalhas do Senhor. Cristo é o estandarte de todas as coisas! Se tivéssemos qualquer outro, seríamos incapacitados para esse conflito espiritual a que somos chamados.
Quanto mais estreitamente aderimos a Cristo, e somente a Cristo, tanto mais fortes seremos e seguros estaremos. Ter a Cristo como perfeita venda para os nossos olhos – mantermo-nos perto dEle, seguros a Seu lado – eis a nossa salvaguarda.
O Espetáculo no Deserto
Que maravilhoso espetáculo o acampamento de Israel apresentava naquele deserto ermo e árido! Que espetáculo para os anjos, para os homens e para os demônios! Os olhos de Deus estavam sempre postos sobre eles, a Sua presença estava ali. Era ali que Ele havia encontrado a Sua habitação. Apesar dos esplendores do Egito, Assíria e Babilônia, lugares que apresentavam inúmeros atrativos aos olhos da carne, refinamento, luxo, arte, ciência, o Senhor não era conhecido entre esses povos. O Senhor não habitava no meio deles.
Deus habitava no meio do Seu povo Israel. Desceu do céu não só para resgatá-lo da terra do Egito, mas para ser o seu companheiro de viagem através do deserto. Que pensamento maravilhoso! O Deus Altíssimo tendo Sua habitação nas areias do deserto, no próprio seio da congregação dos Seus resgatados! Na verdade, não havia nada semelhante em todo o mundo. Ali estava esse exército de seiscentos mil homens, além das mulheres e das crianças, num deserto estéril, onde não crescia uma só folha de erva e não havia uma gota de água – nenhum sinal de recursos para subsistência.
Como eles iriam ser alimentados? Deus estava ali! Como iam manter-se em ordem? Deus estava ali! Como iam abrir caminho através daquele deserto medonho onde não havia nenhum caminho? Deus estava ali!
Em suma, a presença de Deus assegurava todas as coisas. A incredulidade podia dizer, “o que? Três milhões de pessoas vão ser alimentadas e vão viver do ar? Quem é o responsável pelo abastecimento? Onde estão os depósitos militares? Onde está a bagagem? Quem é o responsável pelo vestuário?”
Só a fé poderia responder, e a sua resposta é simples, breve e conclusiva: DEUS ESTAVA ALI. E isso era o bastante. Tudo está compreendido nessa frase. Na aritmética da fé, Deus é o algarismo essencial, e tendo-O, pode adicionar-se tantas cifras quantas se quiser. Se os nossos recursos estão no Deus vivo, deixa de existir a questão das nossas necessidades, tornando-se uma questão da SUA SUFICIÊNCIA.
A fé resolve toda a questão. Deus estava no meio do Seu povo. Estava ali em toda a plenitude da Sua graça e misericórdia – estava ali com perfeito conhecimento das necessidades do Seu povo e das dificuldades do caminho – com Seu poder onipotente e recursos ilimitados para fazer frente a essas necessidades (veja Dt 2:7; Dt 8:4).
Em todas essas coisas, o acampamento de Israel era uma figura intensa e notável. Uma figura de que? Da Igreja passando pelo mundo. O testemunho da Escritura é tão claro sobre esse ponto, que não deixa lugar para o uso da imaginação.
“Estas coisas lhes sobrevieram como exemplos e foram escritas para advertência nossa, de nós outros sobre quem os fins dos séculos têm chegado” (1 Co 10:11).
Que lições! Pense nesse acampamento misterioso no deserto, composto por guerreiros, trabalhadores e adoradores! Que separação de todas as nações do mundo! Que falta absoluta de recursos! Que exposição ao inimigo! Que dependência absoluta de Deus! Não tinham nada; nada podiam fazer; nada podiam saber. Não tinham nada que comer, nem uma gota de água mais do que recebiam, dia a dia, diretamente da mão de Deus. Quando à noite se retiravam para descansar, não tinham nem um simples átomo de provisões para o dia seguinte. Não haviam armazéns, nem despensas, nem fontes visíveis de suprimento, nada com que pudessem contar.
Mas DEUS ESTAVA ALI, e isso, no parecer da fé, era o bastante. Estavam resguardados em Deus. Esta é a única grande realidade. A fé não reconhece nada real, nada sólido, nada verdadeiro, senão o Deus vivo, verdadeiro e eterno. A natureza podia volver os olhos cobiçosos para os celeiros do Egito e ver neles alguma coisa substancial. Mas a fé olha para o céu e encontra ali todos os seus recursos. Não havia uma só exigência, uma só contingência, uma só necessidade – seja de que natureza fosse – que a presença divina não fosse uma resposta inteiramente suficiente.
A Igreja no Deserto
E da mesma maneira que Deus tinha a sua congregação no deserto, hoje Ele tem a Sua igreja peregrinando neste mundo. Isso tudo confunde a razão humana.
Como é organizado o corpo de Cristo? É organizado pelo Espírito Santo, como está escrito: “pois todos nós fomos batizados em um Espírito, formando um corpo” (1 Co 12:13). Mas, como seus membros irão se juntar? “Deus dispôs os membros, colocando cada um deles no corpo, COMO LHE APROUVE” (1 CO 12:18). Como esse corpo é mantido? Pela Sua cabeça vivente, através do Espírito, pela Palavra, como está escrito: “porque nunca ninguém aborreceu a sua própria carne; antes a alimenta e sustenta, como também o Senhor à Igreja” (Ef 5:29).
“…Eu [Cristo]… edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mt 16:18). Isso não é o bastante? Cristo não é suficiente? O Espírito Santo não basta? Precisamos de alguma coisa mais? Precisamos das formas e organizações humanas? Precisamos da cobertura de homens? O fato da presença divina na Igreja não assegura tudo o que ela possa acaso necessitar? Não é suficiente para as exigências de cada hora? A fé diz “sim!”, com ênfase e decisão. A incredulidade – a razão humana – diz: “não, precisamos também de muitas outras coisas”.
Qual é a nossa resposta? Se o nome de Jesus não basta, não sabemos o que fazer! Se o Espírito Santo não pode suprir todas as necessidades da comunhão, do ministério e do culto, quando a Palavra nos diz que “Ele vos guiará a toda a verdade [realidade]” (Jo 16:13), então, não sabemos o que dizer.
Alguns podem dizer que as coisas não são como eram nos tempos apostólicos. A Igreja professa falhou, os dons do pentecostes cessaram, os dias gloriosos do primeiro amor da Igreja desapareceram, e por isso precisamos adotar os melhores meios que estão ao nosso alcance para a organização e manutenção das nossas igrejas. A tudo isso nós respondemos: Deus não tem falhado; Cristo, Cabeça da Igreja, não tem faltado. O Espírito Santo não tem faltado. Nem um jota e nem um til da Palavra de Deus tem faltado. Este é o verdadeiro fundamento da fé: Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje e para sempre. Ele disse: “eis que estou convosco todos os dias”. Até quando? “Até a consumação do século” (Mt 28:20).
“No qual também sois edificados para morada de Deus em Espírito” (Ef 2:22).
Isso é suficiente. Só nos falta agarrarmos, pela simples fé, esta grande realidade. O nome de Jesus é suficiente para todas as necessidades da Igreja de Deus, assim como o é para a salvação da alma. “Pois onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles” (Mt 18:20).
“…Na sua mente imprimirei as minhas leis, também sobre o seu coração as inscreverei; e eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo. E não ensinará jamais cada um ao seu próximo, nem cada um ao seu irmão, dizendo: Conhece ao Senhor; porque todos me conhecerão, desde o menor deles até ao maior” (Hb 8:10-11).
Que dizemos nós ao pecador? Confia em Cristo. Que dizemos ao crente? Confia em Cristo. Que dizemos a uma assembleia dos santos, pequena ou grande? Confia em Cristo. Há alguma coisa que Ele não possa fazer? “Existe alguma coisa difícil aos olhos do Senhor?” Já se esgotou o tesouro dos Seus dons e graças? Não pode proporcionar dons ou ministério? Não pode levantar evangelistas, pastores e mestres? Não pode fazer frente a todas as variadas necessidades de Sua igreja no deserto? Se Ele não pode, onde estamos nós? Que faremos? Para onde voltaremos? O que a congregação de outro tempo tinha que fazer? Olhar para o Senhor! Em todas as coisas? Sim, em todas as coisas; por alimento, por água, por vestuário, por orientação, por proteção, por tudo. Todos os seus recursos estão Nele. Devemos nós recorrer a alguém mais? Nunca! Cristo, o nosso Senhor, é amplamente suficiente, apesar de todo o fracasso e ruína, pecado e infidelidade. Ele enviou o Espírito Santo, o outro Consolador, para habitar “com” e “no” Seu povo – para formar com eles um só corpo e uni-los à Sua Cabeça vivente no céu. O Espírito é o poder de unidade, de comunhão, de ministério e de culto.
“O Espírito da verdade… vós o conheceis, porque ele habita convosco e estará em vós” (Jo 14:17).
“O Espírito da verdade, que dele [do Pai] procede, esse dará testemunho de mim [de Cristo]” (Jo 15:26).
“O Espírito da verdade, ele vos guiará a toda a verdade” (Jo 16:13).
Desprezaremos o Senhor, a fonte de águas vivas para cavarmos para nós próprios cisternas rotas que não podem reter água? (Jr 2:3) Não! Antes seja a linguagem dos nossos corações de louvores e gratidão, ao pensarmos no nome de Jesus.