Notas sobre o Livro de Números
“No segundo ano após a saída dos filhos de Israel do Egito, no primeiro dia do segundo mês, falou o SENHOR a Moisés, no deserto do Sinai, na tenda da congregação” (Nm 1:1).
Os livros de Êxodo, Levítico e Números têm um interessante paralelo com a experiência cristã. Podem ser comparados ao “sentar”, “andar” e “permanecer” de Efésios (veja Ef 1:20; 4:1 ; 6:13). Em Êxodo, vemos Israel livre do Egito por meio de uma mão poderosa e estabelecido como povo de Deus por meio de uma obra irreversível. Em Levítico, são lançadas as bases da comunhão do povo com Deus por meio do sangue e sua caminhada de santidade por meio da cruz. Em Números, o povo é ordenado e preparado para a batalha, com uma visão do gozo de sua herança dada por Deus. Isso está claramente expresso no começo do livro, quando Arão é ordenado que conte “todos os capazes de sair à guerra” (Nm 1:3).
No último capítulo de Levítico, vemos uma indicação da avaliação que o Senhor faz, dentre os Seus Filhos, daqueles que tem maior valor para Ele (veja os votos voluntários, em Lv 27:1-8). Podemos perceber que a avaliação do valor dos votos é diferente do valor do resgate de cada alma descrito em Êxodo 30. Em Êxodo o preço ordenado para resgate de cada alma era igual, equivalendo a meio siclo de prata. Todos fomos comprados pelo Senhor, por um único preço, o sacrifício de Seu Filho. Isso é igual para todos.
Entretanto, vemos em Levítico 27 a avaliação do que podemos ser PARA ELE, como algo voluntário. São estabelecidos valores para cada voto de acordo com a faixa etária:
Deus não poupa ninguém, contudo por que são mais altos os valores dos votos das pessoas acima de 20 anos?
Aptidão para a Guerra
Se compararmos isso aos critérios de contagem do povo, estabelecidos em Números 1, vemos que as pessoas de 20 anos para cima eram definidas como “capazes de ir à guerra”. Isso significa que o valor de nossa entrega pessoal, da entrega do nosso coração, mente, vontade e vida para Deus é medido por Ele em termos de aptidão para guerra.
Jeová é um homem de guerra, e a energia para guerra é o que Ele mais valoriza. A grande tragédia do Antigo Testamento era a dos homens velhos, que em circunstâncias normais, começavam a enfraquecer em sua força física. No Novo Testamento lemos que, mesmo que o nosso homem exterior se corrompa, o homem interior se renova (2 Co 4:16). O vigor espiritual não precisa desvanecer com a idade. Em uma verdadeira vida cristã, não há enfraquecimento de força. Podemos tomar como exemplo Calebe, que aos 80 anos, se sentia com vigor de 40 (Js 14:6-14).
Cada um deve se perguntar: qual será o meu valor atual no santuário? O nosso valor no Seu santuário é medido de acordo com a escala de nossa força espiritual. Nunca saberemos o verdadeiro conhecimento de nós mesmos, até que sejamos pesados na balança do santuário. Seja o que for que pensamos de nós mesmos, e o que o homem possa pensar de nós, a grande questão é saber o que Deus pensa de nós.
Vemos, como ilustrado em Levítico 26, que Moisés era o representante dos direitos de Deus, segundo o padrão do santuário.
A habilidade de consagrar a si próprio, animal, casa ou campo era evidentemente uma questão de capacidade e valor. A nossa capacidade de adorar vai depender da nossa energia espiritual e o Espírito Santo é a nossa capacidade. É uma questão de habilidade, capacidade e valor. Aquele que estava abaixo do nível mínimo (Lv 27:8) era levado para o sacerdote para que ele avaliasse.
Se somos incapazes de satisfazer as exigências da justiça, temos que recorrer à graça. O pobre tinha que cair nos braços do sacerdote. Assim é sempre conosco. Moisés representava os direitos da justiça divina. O sacerdote é o expoente dos recursos da graça divina. O pobre era incapaz de permanecer diante de Moisés, então se rendia aos braços do sacerdote.
Se não podemos “cavar”, podemos “pedir”. Não é o que somos capazes de alcançar, mas do que Deus tem prazer em nos dar. A graça será a coroa da obra de Deus pelos séculos dos séculos! Quando se trata do homem, é infinitamente melhor cavar do que pedir; mas quando se trata de Deus é precisamente o contrário. É bom ser pobre, quando o conhecimento da nossa pobreza serve para desenrolar à nossa vista as riquezas inexauríveis da graça.
A graça nunca se nega a favorecer o desvalido e nunca declara ninguém pobre demais. Ela pode satisfazer as maiores necessidades do homem, e ser glorificada em as satisfazer. É a base da nossa salvação; a base da vida de piedade prática; e a base da nossa esperança, que nos anima em meio a provas e lutas neste mundo de pecado.
Que tenhamos um sentimento mais profundo de graça e um desejo mais ardente de glória.
Então, quando chegamos em Números, podemos entender que nosso “valor” está relacionado a nossa capacidade de receber da graça, e estar revestidos de Cristo. Nosso valor está relacionado à medida de Cristo em nós. Essa medida deve crescer à maturidade, sem que percamos o vigor e força (velhice), porque pelo Espírito Santo, podemos permanecer na disposição da juventude, mesmo maduros. A nossa maturidade vem de “conhecer” de forma prática e experimental o nosso Pai.
“Filhinhos, eu vos escrevo, porque os vossos pecados são perdoados, por causa do seu nome. Pais, eu vos escrevo, porque conheceis aquele que existe desde o princípio. Jovens, eu vos escrevo, porque tendes vencido o Maligno. Filhinhos, eu vos escrevi, porque conheceis o Pai. Pais, eu vos escrevi, porque conheceis aquele que existe desde o princípio. Jovens, eu vos escrevi, porque sois fortes, e a palavra de Deus permanece em vós, e tendes vencido o Maligno” (1Jo 2:12-14).
Como João exemplificou, conhecer aquele que existe desde o princípio é algo mais do que conhecer a Deus como Pai. Precisamos conhece-Lo e reconhece-Lo como Senhor do Universo, conhecer Sua soberania, Sua vontade, Seus caminhos. Isso nos leva a conduzir outros (pais) à escola de Cristo. Precisamos conhecer Aquele que existia desde o princípio, precisamos VER CRISTO na Palavra, como Ele mesmo e os apóstolos faziam (Lc 24:27 / At 24:14 / At 26:22).
“Eu sou o Alfa e Ômega, diz o Senhor Deus, aquele que é, que era e que há de vir, o Todo-Poderoso” (Ap. 1:8).
No Deserto
“No segundo ano após a saída dos filhos de Israel do Egito, no primeiro dia do segundo mês, falou o SENHOR a Moisés, no deserto do Sinai, na tenda da congregação” (Nm 1:1).
No contexto do livro de Números nos encontramos imediatamente “no deserto”, onde só devem ser levados em conta os que podem sair “à guerra”. No livro de Gênesis os descendentes de Israel estavam ainda em seu pai Abraão (chamado de Deus em eleição). No livro de Êxodo, eles estavam junto aos fornos de tijolo do Egito (contemplamos o sangue do cordeiro derramado para redenção). Em Levítico estavam reunidos em redor do tabernáculo da congregação (culto e serviço do santuário). Em Números, os filhos de Israel são vistos no deserto. Vemos sobre homens de guerra, exércitos, bandeiras, acampamentos e toques de trombetas em som de alarme.
Declarando a Descendência
“E, tendo ajuntado toda a congregação no primeiro dia do mês segundo, declararam a descendência deles, segundo as suas famílias, segundo a casa de seus pais, contados nominalmente, de vinte anos para cima, cabeça por cabeça” (Nm 1:18).
Será que eu posso declarar a minha descendência? Há grandes motivos para temer que existam centenas, senão milhares de cristãos professos que não são capazes de fazer essa declaração (1 Jo 3:2 / Gl 3:26,29 / Rm 8:14,16).
Você pode declarar a tua descendência? Esse é um ponto perfeitamente estabelecido para você? Isso não é uma questão, de modo algum, de buscar a evidência no nosso próprio coração. Não se trata de um conhecimento baseado em formas, sentimentos e experiências. Nada disso! Isso é fruto da fé em Cristo Jesus. É ter a vida eterna no Filho de Deus. É testemunho imperecível do Espírito Santo. É crer em Deus segundo a Sua palavra.
A linhagem do cristão é celestial! Podemos ver facilmente, por este capítulo de Números, como era essencial que cada membro da congregação de Israel pudesse declarar a sua descendência. Dificilmente podemos imaginar um israelita que, chamado a declarar sua genealogia, se expressasse da maneira duvidosa adotada por muitos cristãos nesses dias.
Cada israelita era convidado a declarar a sua descendência antes de ocupar seu posto nas fileiras como homem de guerra. Pode uma pessoa reconhecer a própria “bandeira” e tomar partido, a não ser que possa “declarar a sua descendência”? É quando nos mantemos na luz pura da plena salvação de Deus – salvação num Cristo ressurreto – que podemos entrar na luta que nos é própria como cristãos.
Será que devemos supor que as nossas lutas legítimas, a nossa incredulidade, a recusa em nos submetermos à justiça de Deus, as nossas dúvidas e argumentações podem ser considerados “luta cristã”? De modo nenhum! Todas essas coisas devem ser consideradas como um conflito com Deus; ao passo que o conflito cristão se trava contra Satanás (Ef 6:12).
Devemos observar a diferença entre a luta de Romanos 7:7-24 (onde ainda existe uma convicção de escravidão), a batalha de Gálatas 5:17 (onde já se percebe que é pelo Espírito que a carne será vencida), com o texto de Efésios 6:10-17 (a luta nas regiões celestes). Só podemos lutar sabendo quem somos em Deus. Se saímos à guerra sem sabermos porque há guerra, e num estado de incerteza acerca de “nossa descendência”, faremos pouco progresso contra o inimigo.
Cabe lembrar que, nos quatro primeiros capítulos de Números existem três censos diferentes, mas o censo principal é a contagem dos filhos de Israel. De cada família, dentro de cada tribo, todos os homens de 20 anos para cima que iriam ocupar o serviço militar foram contados. Este é o censo principal. Portanto, a contagem dos filhos de Israel era a contagem de soldados. Os filhos de Israel iriam fazer uma jornada através do deserto, mas antes que eles saíssem, Deus contou todos os homens de 20 anos para cima. Eles iriam para o serviço militar e seriam o exército do Senhor. É preciso crescer um pouco para participar de batalhas. Aquele que tinha apenas um mês de idade não poderia lutar, ele precisaria alcançar os 20 anos. Isso significa amadurecimento, crescimento.
À medida que você amadurece, torna-se capaz de manejar armas e combater o combate de Deus. Cada um de nós deve seguir crescendo e ser forte o suficiente para preparar-se como homem e mulher que combate o combate de Deus.